Cortejo fúnebre do estudante do Instituto Industrial, João Martins
Branco, falecido na sequência dos acontecimentos ocorridos no dia 28 de Abril
de 1931 na Faculdade de Medicina do Porto. Na foto, o féretro descendo a Rua
dos Clérigos numa imponente manifestação de pesar da Invicta (30/04/1931).
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Enquadramento Político, Económico e Social da Ditadura Militar
«Em 17 de Dezembro de 1923,
Cunha Leal, em sessão pública realizada na Sociedade de Geografia de Lisboa,
defendia a restauração de um regime ditatorial
regenerador e apelava à intervenção da única entidade que, na sua
opinião, poderia salvar Portugal:
as Forças Armadas, símbolo máximo da
Pátria, ‘exemplo de disciplina’ e ‘garante da ordem’. Nesse ano em que
a crise profunda, com início em finais de 1919, inícios de 1920, atinge um dos
seus pontos altos com o fim do ‘pão político’, o capitão do Exército, mais
tarde fundador da União Liberal Republicana (ULR), adivinha o papel
preponderante que as Forças Armadas assumirão na ‘salvação nacional’ enquanto
instrumento consensual entre as várias sensibilidades políticas presentes no
momento e referência última da legitimidade do Estado.
E, de facto, quando em Braga os militares avançam com o movimento em 28
de Maio de 1926, sob a liderança do
gen. Gomes da Costa, fazem-no com o objectivo explícito de salvar a
Pátria da governação dos ‘bonzos’ do Partido
Republicano Português (PRP). Mais do que instaurar um programa político
definido, o levantamento preocupar-se-ia em arredar definitivamente da vida política
portuguesa a governação corrupta, demagógica e autoritária dos democráticos de António
Maria Silva, incapaz de solucionar, ou pelo menos minimizar, a crise financeira, económica e social
endemicamente instalada no país. Urgia, portanto, substitui-la por um ‘regime
de ordem’, de ‘excepção’, ‘que saneasse as finanças, relançasse a economia na
metrópole e nas colónias e criasse as condições de uma nova ordem político
republicana’.
As razões do agravamento da crise devem procurar-se no contexto de conflitualidade
e instabilidade produzido pela entrada de Portugal na I Guerra Mundial.
Os efeitos da economia de guerra ameaçam o país de fome. A carestia dos bens
essenciais, o racionamento dos géneros alimentares e a descida dos salários agrícolas e industriais provocam, nas
grandes cidades de Lisboa e Porto, assaltos a lojas e motins populares numa
onda de agitação social que lança um movimento reivindicativo sem precedentes
durante toda a República. Com a ‘República Nova’ de Sidónio Pais a
agricultura conhece algum incremento produtivo através de uma política de
favorecimento do sector, mas o movimento grevista só é contido pelas medidas brutais de repressão que lhe são
infligidas.
No fim da guerra, a derrota das várias iniciativas militares
pró-monárquicas reintroduz progressivamente as liberdades e os mecanismos
constitucionais suspensos desde o golpe sidonista e a República tenta
normalizar a sua situação, sobretudo através do Partido Socialista. Todavia, o desemprego mobiliza os protestos
do movimento social contra a especulação, o açambarcamento e a diminuição do
poder de compra por parte dos trabalhadores assalariados e dá-se entrada nos anos
de 1920 / 21 com um adensamento das
lutas e greves gerais. A balança de pagamentos acusa a diminuição do fluxo de
remessas de emigrantes do Brasil, o
escudo cai vertiginosamente e perde 20
vezes o seu valor em relação à libra. Consequentemente, a inflação
galopante não permite que a subida dos salários seja proporcional à subida dos
preços e ao aumento do custo de vida e a reacção social extrema-se.
As ‘revoltas da fome’ registadas nos anos de 1922 / 23 levam o Partido Democrático
(PD) a favorecer os preços agrícolas como forma de conquistar os sectores mais
moderados do campo e assegurar os abastecimentos na cidade e, em 19 de Agosto
de 1923, Joaquim Ribeiro,
ministro da Agricultura, abole o pão
político, o pão barato subsidiado das
cidades. O consequente aumento deste género alimentar determina violentas
manifestações de protesto entre as classes de rendimentos inferiores motivando
o que Fernando Medeiros designou como o último sobressalto da iniciativa sindicalista. Três meses
depois, Ginestal Machado coloca o tenente-coronel Ferreira do Amaral
à frente da Polícia e, em 24 de Dezembro desse mesmo ano, o governo de Álvaro
de Castro nomeia Sá Cardoso para a pasta da Guerra; juntos,
protagonizam o endurecimento da
repressão contra o movimento operário e sindicalista.
A juventude é a grande força da
vida do homem; onde há sangue novo, há vigor, há certeza de triunfo; onde há
cérebro moço, há ideias que fervilham, há ânsias de renovação, há ideias que
remoçam. In Virgílio Marinha de Campos, Liberdade, 27/4/1930
E o ano de 1924 começa com
as ‘jornadas de Fevereiro’ contra a vida cara e o fascismos. Entre os dias 17 e 22 deste mês, têm lugar
inúmeros comícios e manifestações organizadas por forças políticas e sindicais
de esquerda contra as tentativas de instauração de um regime ditatorial de
direita e exigindo a concretização de medidas tendentes à melhoria das
condições de vida dos trabalhadores». In Cristina Faria, As Lutas Estudantis
Contra a Ditadura Militar, 1926-1932, Edições Colibri, Lisboa, 2000, ISBN
972-772-201-6.
Cortesia de E. Colibri/JDACT