O Período dos Filipes. O Governo dos Filipes
«(…) Mas outra ameaça, porventura mais grave, pairou então sobre a realeza
de Filipe II. Deixando a França, onde sentira enfraquecer o apoio de Catarina
de Médicis e foi objecto de vários atentados, o prior do Crato
acolheu-se nos meados de 1585 a
Inglaterra, esperando o auxílio da rainha D. Isabel para a reconquista do trono
português. A rainha apostou então na
causa do príncipe exilado, para o que armou uma frota para atacar Lisboa.
Do seu comando incumbiram-se o almirante Drake e o general Norris. Em Maio de 1589, fez-se a esquadra ao mar, vindo
nela António I (JDACT) e muitos dos seus
companheiros de exílio. Um ataque sem êxito ao litoral da Corunha deu tempo ao
cardeal Alberto, vice-rei de Portugal, para organizar a defesa da cidade.
Uma parte dos marinheiros desembarcaram em Peniche, com o fim de cercar por
terra a capital, enquanto o grosso da frota foi ancorar na baía de Cascais à
espera dos companheiros.
António I contava decerto com o levantamento da população, mas esta
receou as medidas repressoras do Governo (muitos
adeptos do prior do Crato foram então presos ou saíram de Lisboa),
assim como as consequências a que a vitória de Drake daria lugar. Também o
factor religioso contribuiu para a derrota, pois os habitantes não queriam
aceitar a vinda dos hereges,
mesmo que fosse para colocar o prior do Crato António no trono.
Entretanto, os rebates de peste que se fizeram sentir na esquadra levaram o almirante
a regressar a Inglaterra sem atender os protestos do rei exilado. E foi assim que o prior
do Crato perdeu a derradeira esperança de voltar a Portugal. De novo
fixado em Londres, onde levou uma existência de dourada miséria, veio a acabar os
dias em Paris, a 25 de Agosto de 1595,
na amargura de um exílio de que compartilharam algumas dezenas dos seus fiéis
seguidores.
Durante dez anos, foi Portugal governado pelo cardeal Alberto, com
o título de vice-rei. Com o seu regresso a Espanha, em 1593, decidiu o monarca entregar o poder a cinco governadores,
todos naturais do Reino:
- o arcebispo de Lisboa, Miguel de Castro;
- o mordomo-mor da casa real, João da Silva, 4º conde de Portalegre;
- o capitão-mor dos ginetes, Francisco Mascarenhas;
- o meirinho-mor, Duarte Castelo Branco;
- o escrivão da puridade e antigo secretário do rei Sebastião, Miguel de Moura.
Todos eles haviam seguido a facção de Castela em 1580, sendo portanto fiéis à política filipina. Na sua escolha
interveio o desejo de se cumprir a promessa feita nas Cortes de Tomar de
confiar a portugueses o governo do Reino. Assim se dirigiu a administração
pública até 1599. Mas como continuou
o agravamento dos impostos, em especial os destinados à defesa do litoral e à
protecção das frotas do ultramar, a reacção do País foi desfavorável aos novos
governantes. Sentia-se que a subordinação portuguesa à política imperial da
Espanha era nefasta. Sem que Madrid impusesse ainda uma excessiva
centralização, a verdade é que o Reino sofreu as consequências militares e
financeiras da ambição de Filipe II à hegemonia europeia. Pela nossa situação
geográfica, os ataques dos corsários ingleses e holandeses à Espanha filipina
visavam, antes de mais, a costa de Portugal. Por tudo, a morte de Filipe II, ocorrida
a 13 de Setembro de 1598, não foi
sentida entre nós, dado o não cumprimento de muitas das promessas que fizera em
1581. Para muitos, era o princípio
do desencanto por uma política que no ponto de vista interno se traduzia em
pesados encargos e sacrifícios para Portugal.
Tentativas de integração
Com a subida de Filipe III ao trono, ascendeu a primeiro-ministro o
marquês de Denia, Francisco de Sandoval, que incrementou o processo de
integração dos dois reinos para acabar de vez com a autonomia portuguesa. Os
cinco governadores ainda nomeados por Filipe II foram substituídos por um
vice-rei, Cristóvão de Moura, que recebeu o título de 1º marquês de
Castelo Rodrigo. O velho português, que vinte anos antes ganhara a vontade de
muitos eclesiásticos e nobres para o partido filipino, regressava a Lisboa
investido numa honra jamais sonhada. Ainda que a sua presença fosse de molde a avivar
as tristes lembranças de 1580,
entendia a coroa espanhola que bastava a experiência de Cristóvão de Moura
para reduzir Portugal à situação de uma província espanhola». In Joaquim
Veríssimo Serrão, O Tempo dos Filipes em Portugal e no Brasil (1580-1668),
Edições Colibri, Estudos Históricos, Lisboa, 1994, ISBN 972-8047-58-4.
Cortesia de Colibri/JDACT