quarta-feira, 4 de junho de 2014

Em Auschwitz. O Silêncio de Deus. João Medina. «A estada de alguns foi muito breve. Outros permaneceram meses e até anos. Alguns acabaram mesmo por se radicar na nossa terra, beneficiando das condições de acolhimento e de hospitalidade que o estatuto neutral do país durante a guerra favoreceu»

Cortesia de wikipedia

Para que Nunca Mais
«O Holocausto, expressão habitualmente utilizada para referir o que os judeus designam por Shoah, continua a ser a ferida mais teimosamente aberta na memória do conturbado século XX. A crueldade indescritível do aparelho de extermínio nazi provocou a morte a mais de seis milhões de pessoas em campos de concentração espalhados por vários países da Europa Central, designadamente a Alemanha, a Polónia e a Checoslováquia. Esses campos de horror foram a trágica etapa final de milhões de vidas ceifadas por uma máquina de destruição que não poupou judeus, opositores políticos, ciganos, homossexuais e testemunhas de Jeová. Das vítimas conhecidas, seis milhões eram judeus. O seu único crime foi pertencerem a uma etnia e a uma religião, praticada ou não, transformando-se, só por esse motivo, no alvo daquilo que Hitler e os seus sequazes designaram por Solução Final.
O horror dos militares Aliados e das tropas soviéticas ao entrarem pela primeira vez nesses campos de extermínio, numa altura em que o regime nazi se encontrava já na fase de colapso final, continua a ser partilhado por todos quantos, nos nossos dias, tomam contacto com essa realidade que as palavras são sempre parcas para definir e classificar. Como disse um filósofo do século XX, o horror dos campos de concentração é imprescritível, ou seja, não pode nem deve ser apagado da memória contemporânea, tão volátil, tão apressada e tão esquiva que tenta condenar ao esquecimento tudo aquilo que a incomoda e põe em causa, sobretudo se estiver associado aos valores humanistas que consubstanciam o nosso pacto com a liberdade e com a condição humana.
O Espaço dos Exílios, criado pela CM de Cascais, em Fevereiro de 1999, pretende dar um contributo no sentido de que a memória dessa época não prescreva nem se apague. Por esta zona do país passaram dezenas de milhares de pessoas, na sua maioria judeus, que, fugindo do terror nazi, buscavam em Portugal condições para partirem para lugares onde uma nova vida pudesse iniciar-se. A estada de alguns foi muito breve. Outros permaneceram meses e até anos. Alguns acabaram mesmo por se radicar na nossa terra, beneficiando das condições de acolhimento e de hospitalidade que o estatuto neutral do país durante a guerra favoreceu.
Vários pontos do concelho, e, em particular, Cascais e Estoril, foram o ponto de abrigo para gente de várias origens e distintas culturas que fugia da humilhação e do extermínio, perplexa e acossada perante a sanha assassina que os elegera como vítimas preferenciais. Passaram décadas desde o Holocausto. No entanto, imagens como zaquelas conservam intacta a sua actualidade. Essa actualidade resulta da circunstância de, na Europa e noutros pontos do mundo, continuarmos a assistir, diariamente, ao atropelo reiterado e sistemático dos direitos humanos. Quer isto dizer que o ser humano continua a ser capaz da maior grandeza e maior vileza, consoante as condições históricas em que se encontra e as situações com que é confrontado. Historicamente, está provado que não tem povos incapazes de actos bárbaros dependendo o seu potencial de agressividade e beligerância das circunstâncias com que são confrontados». In José Jorge Letria, Para que nunca mais, João Medina, O Silêncio de Deus em Auschwitz, seguido de O Museu do Holocausto, Edição da CM de Cascais, 2001, ISBD 972-637-089-2.

Cortesia da CMCascais/JDACT