segunda-feira, 12 de maio de 2014

As Bibliotecas de Castelo de Vide. A Educação Popular (1863-1899). Filomena Bruno. «Como paes nunca poderão formar solidamente o espírito de seus filhos, sigam sempre a árdua, mas honrosa vereda da verdade e como cidadãos nunca conhecerão os seus deveres e responsabilidades. São os governos e o povo que abrem as portas ao analfabetismo…»

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Sociedade, alfabetização e educação no século XIX. Economia e cultura
«No decorrer do século XIX, Portugal passa por sucessivas e importantes transformações que afectam as suas estruturas económicas e políticas, mas também as áreas sociais, em particular a educação. A liberdade de imprensa, o desenvolvimento tecnológico e as novas formas de sociabilidade permitiram um grande aumento do número de publicações, sobretudo publicações periódicas. Todos estes jornais e revistas eram um estímulo à produção literária. Grandes escritores estrearam-se com artigos, novelas e romances nos folhetins dos jornais diários.
Também se tornou moda a realização de conferências e a fundação de clubes culturais. Havia o culto pela arte de bem escrever e bem falar. Instaurava-se em Portugal o Movimento Romântico, onde se destacaram: Almeida Garett no teatro; Camilo Castelo Branco e Júlio Dinis no romance; Alexandre Herculano no romance histórico. Destacou-se ainda António Feliciano de Castilho, o inventor do Método Castilho de Leitura. A partir de 1860 dá-se uma reviravolta intelectual implantando-se o Realismo, corrente segundo a qual os artistas procuravam reproduzir o mundo tal como o viam, de uma maneira mais natural, sem o aspecto sentimental e poético do Romantismo. Destacaram-se: Eça de Queirós, Ramalho Ortigão e Antero de Quental na literatura; Columbano Bordalo Pinheiro, José Malhoa, Silva Porto na pintura; o mestre Soares dos Reis na escultura.
O século XIX poderia denominar-se o século de ouro da burguesia. A nobreza, até, então detentora de privilégios e hábitos de erudição, viu-se substituída pelos ricos burgueses que tentavam alcançar prestígio, comprando títulos. Outros afirmavam-se na nova sociedade, apenas pelas funções que desempenhavam: membros do Governo, diplomatas, advogados, solicitadores, farmacêuticos, médicos, funcionários públicos. No final do século XIX, a burguesia dominava a vida política e económica. Todos os aristocratas e burgueses exigiam que os seus filhos aprendessem línguas estrangeiras e mandavam-nos, muitas vezes, estudar para fora do país. A função da mulher continuava a ser de esposa e mãe. Cada vez mais, tinha a tarefa de ser a educadora na primeira infância dos filhos.
A partir de Inglaterra, um pouco por toda a Europa e mais tarde também em Portugal, começavam a surgir fábricas. Os artesãos das antigas oficinas davam lugar aos operários. Esta classe operária conhecia um período de ascensão demográfica e de concentração nas cidades. A cidade cresceu e modernizou-se. Lisboa e Porto foram as cidades que mais cresceram. Lisboa tinha novos meios de comunicação, muito mais perto do resto da Europa. Ao longo do século XIX, começou a falar-se da classe operária e das suas difíceis condições de vida. A partir de 1852, assistiu-se ao desenvolvimento das associações de socorros mútuos, que se preocupavam com as dificuldades económicas dos operários e prestavam ajuda aos familiares, em situações de doença, desemprego, invalidez ou morte. Este associativismo, além de defender os interesses dos trabalhadores, incluía uma componente cultural. O movimento operário procurava aumentar a sua influência, fazendo propaganda, através de conferências, jornais, revistas, panfletos e livros; no entanto, a classe burguesa, em, Portugal, nunca se sentiu realmente ameaçada.
O desenvolvimento industrial coincidiu também com o aparecimento das primeiras iniciativas na Educação de Adultos. Para os defensores das novas ideias, a instrução devia ser para todos os cidadãos. Isto era muito difícil de atingir num país de analfabetos (muito perto de 90% da população não sabia ler nem escrever). A mão-de-obra infantil era muito utilizada na indústria, o que prejudicava a escolarização. A taxa de analfabetismo em 1864 estimava-se em 88% e em 1910 era ainda de 75%. No jornal O Castellovidense pode ler-se: Como paes nunca poderão formar solidamente o espírito de seus filhos, sigam sempre a árdua, mas honrosa vereda da verdade e como cidadãos nunca conhecerão os seus deveres e responsabilidades. São os governos e o povo que abrem as portas ao analphabetismo em Portugal. Parece impossível que na pátria de Camões, Garrett, Herculano, Castillo e de tantos literattos, de nome insigne, haja 80 p. c. de analfabetos. (19 de Abril de 1909In Filomena M. F. Sousa Bruno, As Bibliotecas de Castelo de Vide e a Educação Popular (1863-1899), CM de Castelo de Vide, Edições Colibri, 2011, ISBN 978-989-689-139-8.

Cortesia Colibri/JDACT