Macau e a Expansão Missionária no Extremo-Oriente
«A chegada dos portugueses à Índia permitiu os primeiros contactos com
outros povos, com quem pretendiam estabelecer relações comerciais. Do porto de Malaca
parte o primeiro navegador português que chega à China, em 1513, e que consegue estabelecer relações amigáveis que darão
origem, quatro anos mais tarde, ao envio de uma primeira embaixada ao rei da
China. Essa embaixada de Tomé Pires não alcançou os objectivos desejados,
o mesmo acontecendo à segunda, sob a direcção de Martim Afonso Melo, em 1521, e só a partir de 1541 se desenvolvem as viagens nos mares
da China que dariam origem à criação de feitorias e entrepostos.
Uma primeira feitoria instalou-se em Liangpo, na foz do rio Yongjiang,
província de Zhejian, estabelecimento esse que foi destruído em 1545, obrigando os portugueses a retirarem-se
para a costa da província de Cantão, onde comerciavam sobretudo na ilha de Shang
Chuan (Sanchoão) e em Lang bai
ao (Lampacao) até 1557, data a partir da qual os
portugueses passam a dispor de um entreposto e de um local seguro que servisse
de apoio ao comércio das especiarias da Índia, das sedas e porcelanas chinesas,
da prata do Japão e de tantas outras novidades que carregavam os barcos que
regressavam do Japão e via Macau, Malaca e Goa se dirigiam a Lisboa.
O fabuloso desenvolvimento comercial atingido por Macau ao longo desses
primeiros decénios devia-se a circunstâncias especiais que criaram excelentes
oportunidades. O imperador chinês tinha proibido o comércio com o Japão (onde
os portugueses haviam chegado acidentalmente em 1542 ou 43), motivo pelo
qual os japoneses se viam obrigados a pagar a seda a um preço excessivamente
elevado, o que permitiu aos portugueses servirem de intermediários neste
comércio, comprando a seda directamente aos chineses e vendendo-a aos japoneses
com lucros enormes. O principal produto da venda da seda que enchia os navios
no regresso do Japão era a prata em lingotes encontrando-se na origem das riquezas
acumuladas. O primitivo entreposto de Macau nessas primeiras quatro décadas não
passava de um conjunto de barracas feitas de madeira, colmo e bambu, à semelhança
dos outros entrepostos surgidos antes dessa época nas costas da China.
Deve datar de 1557 a
fundação do porto de Macau na China, (embora alguns autores se refiram ao
ano de 1555) mas devido à
precaridade das condições aí existentes só muito tardiamente a coroa
portuguesa, durante o domínio filipino, lhe reconheceu a existência. A Macau
dos primeiros tempos era auto-governada por comissões dos seus mais influentes
comerciantes, governo que transitou mais tarde para o grande capitão das
viagens do Japão. Só em 1586 é que se atribui ao burgo o estatuto de cidade,
com privilégios semelhantes aos de Évora, e foi preciso esperar até 1623, no período em que Portugal se
encontrava sob o domínio espanhol, para se conseguir a nomeação de um
governador permanente.
Nos finais do século XVI já se poderiam contar neste porto cerca de 900
portugueses com as suas famílias e os escravos provenientes da Índia, de Malaca
ou de África, isto com exclusão da população chinesa. A constituição eclesiástica
de Macau só veio a estabelecer-se quase duas décadas depois da data de
estabelecimento dos portugueses. A diocese de Goa, criada em 1534 por Paulo II através da bula Aequum
reputamus a pedido do rei João III de Portugal, compreendia os
territórios desde o Cabo da Boa Esperança em África até à China.
Posteriormente, esta diocese foi elevada à categoria de sede metropolitana, em 1557, o mesmo ano em que os portugueses
se estabelecem em Macau.
A nova sede episcopal de Goa era criada em 4 de Fevereiro, pela Constituição
Apostólica Etsi Sancta ed Immaculata, precisamente no mesmo dia em que o
papa Paulo IV, pela bula Pro excellenti, fundava as duas novas
sedes sufragantes de Goa, as dioceses de Cochim e de Malaca, esta última
contendo todo o Extremo-Oriente. O clero secular e as ordens religiosas que
sempre seguiram os itinerários dos navegadores e que já se tinham estabelecido
nas feitorias de Liangpo, Lang bai ao e Sanchoão ou no Japão, surgem desde logo
em Macau, onde se instalou um vigário do bispado de Malaca. Macau não era ainda
uma diocese quando o papa Pio V pelo breve Ex litteris carissimi, em 1566, enviou a esta cidade o bispo de
Niceia, Belchior Carneiro, um jesuíta português (chegado a Macau em 1568),
que se tornou mais tarde administrador apostólico da China e do Japão». In Gonçalo
Couceiro, A Igreja de S. Paulo de Macau, Livros Horizonte, Estudos de Arte,
Lisboa, 1997, ISBN 972-24-1015-6.
Cortesia de L. Horizonte/JDACT