quinta-feira, 24 de julho de 2014

Alto Alentejo. Alerta. Portalegre. Catarina Soares. «Das duas uma: ou estão mais bem governadas ou as gentes são mais exigentes. Ou as duas. Não percebo como uma câmara e quem lhe pertence vê diariamente o que está a acontecer e permanece autista»

Postais de Portalegre e jdact

Crónica. Opinião
Com a devida vénia a Catarina Brites Soares

Alerta: Portalegre está a morrer!
«Não há gente. Não há vida. Portalegre está a morrer, aos poucos. E como boa morte lenta está a fazer sofrer quem a olha de tempos a tempos e se recorda do que foi e imagina o que podia ser. Não é preciso ser vidente para antecipar que falta pouco para de cidade passar a aldeia e ficar perdida no meio de outras cidades que estão a crescer e nas últimas décadas fizeram de Portalegre a parvalheira! Não há quem queira para cá vir e os que cá estão querem fugir. Prendem-nos os escassos empregos que ainda resistem à corrente de limpeza de serviços de que a cidade tem sido vítima. A crise e a política de despovoamento do interior de sucessivos governos assassinos não chegam para explicar esta morte lenta. Évora resiste e subsiste, Castelo Branco também Elvas igualmente e poderia continuar. Das duas uma: ou estão mais bem governadas ou as gentes são mais exigentes. Ou as duas. Não percebo como uma câmara e quem lhe pertence vê diariamente o que está a acontecer e permanece autista. E não se aproveitem os oportunistas da oposição porque esses também lá estiveram e são tão ou mais responsáveis por este estado de sítio. Mas também não percebo como as pessoas que aqui vivem se queixam diariamente e diariamente permanecem silenciosas à espera que alguma coisa aconteça. Portalegre já não merece o estatuto de capital de distrito. Não há dinamismo e o que a cidade tem, está feito há décadas e décadas. Portalegre está a anos-luz de tantas e tantas cidades aqui perto. Metam-se nos carrinhos e em vez da voltinha de fim-de-semana aos milhares de supermercados que a cidade oferece (porque lá nisso ninguém nos bate), dêem um saltinho a Évora para ver como se pode viver bem no Alentejo. De Évora não apetece sair, de Portalegre apetece fugir. Se de dia, lá vai passando um carro ou outro, à noite mete medo e faz lembrar o mundo que restou do Ensaio sobre a Cegueira, de Saramago. Dois ou três gatos-pingados, a tentar fugir da morte pelas ruas escuras duma cidade que parece estar sempre a dormir. E eu, que até sou de assumir culpas, confesso que neste caso preciso de arranjar culpados. Ë os culpados são vocês que aqui vivem e permanecem amorfos a esta morte lenta sem pelo menos reclamar de quem vos governa mais luta pelo que também é vosso». In Catarina Brites Soares, Semanário Alto Alentejo, nº 387, 23 de Julho de 2014, página 18, diversos.

Cortesia do SAAlentejo/JDACT