quarta-feira, 2 de julho de 2014

Portugaliae Monumenta Misericordiarum Fazer a História das Misericórdias José Pedro Paiva. «As chancelarias régias, conservadas no Instituto dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo (IAN/TT), são o fundo documental de informações relativas às disposições da Coroa sobre misericórdias»

Cortesia de wikipedia

Fazer a História das Misericórdias. As Misericórdias da fundação à União Dinástica
«(…) Nos anos noventa do século XX procedeu-se a uma releitura da historiografia precedente sobre as misericórdias, bem como à reinterpretação de algumas fontes de fácil acesso. Surgiu também uma vaga de monografias sobre misericórdias que todos os interessados pelo tema conhecem. No entanto, está ainda em curso uma análise sistemática da documentação primária existente nos arquivos centrais e locais, passível de vir a revelar muitas surpresas. Continuam a escassear, no que toca aos primeiros, análises globais da documentação existente nas Chancelarias Régias, no Corpo Cronológico e nos fundos do Arquivo Histórico Ultramarino. Para o período em análise, não existe ainda uma visão de conjunto das fontes disponíveis, que sobreviveram nos arquivos locais, especialmente para a primeira metade do século XVI. Esta documentação constitui um corpo documental relativamente fácil de delimitar, uma vez que o seu volume é muito menor do que a disponível para os séculos seguintes. Este trabalho pretende fornecer um quadro do que actualmente se sabe sobre as misericórdias, desde o ano da fundação da Misericórdia de Lisboa, em 1498, até à União Dinástica (1580), cobrindo os reinados de Manuel I, João III, Sebastião I e cardeal-Rei Henrique. Articula-se também esta informação com alguns dados recentemente levantados aquando de uma recolha sistemática da documentação das chancelarias régias.
As chancelarias régias, actualmente conservadas no Instituto dos Arquivos Nacionais/Torre do Tombo (IAN/TT), são o fundo documental onde se encontra reunido o maior número de informações relativas às disposições da Coroa sobre misericórdias. No entanto, não congregam o total da informação originariamente produzida, uma vez que muitos documentos são hoje conhecidos apenas através de cópias existentes nos arquivos locais. Esta documentação concede uma visão global que uma monografia ou estudo regional dificilmente permitem. No entanto, as referências extraídas das chancelarias representam apenas uma pequena parte da documentação emitida pela Coroa. Lagos, Évora ou Viana revelaram possuir muito mais documentos de proveniência régia do que os que se lhes referem actualmente nos volumes conservados na Torre do Tombo, que, como se sabe, sofreram perdas ao longo do tempo. Mesmo assim, podemos adiantar os seguintes números: existe documentação para 31 misericórdias no reinado de Manuel I, enquanto que o de João III inclui 15 novas misericórdias, para além das que vinham do reinado anterior. Mas é entre 1557 e 1580, nas chancelarias do rei Sebastião e cardeal-Rei Henrique, que se dá a explosão das misericórdias em pequenas localidades: nada mais do que 55, que nunca tinham aparecido antes, surgem pela primeira vez referidas. Não se julgue, no entanto, que se podem utilizar as chancelarias para estabelecer datas de fundação das misericórdias, uma vez que apenas confirmam a sua existência no terreno. É manifesto que algumas só aparecem referidas nas chancelarias muito tarde, como nos casos de Lagos, Braga, Vila da Praia ou Angra.
A maior parte dos documentos emanados das chancelarias tinha origem no seguimento de solicitações locais, geralmente em forma de petição, a que a Coroa dava resposta. Essa documentação inicial perdeu-se (a não ser nos casos em que os textos das petições foram transcritos), pelo que as Chancelarias Régias só nos concedem a versão da Coroa num diálogo que teve originalmente dois sentidos. Este tipo de fonte não permite estudos de carácter relacional: neste aspecto os estudos locais de âmbito estritamente monográfico revelam vantagens inegáveis. Convocam um conjunto diversificado de fontes documentais que podem esclarecer os interesses em campo a nível local e os jogos de força entre eles. Relativamente ao tempo do rei Manuel I, uma percentagem significativa dos documentos exarados no seu reinado são conhecidos por via indirecta através da chancelaria do seu sucessor. Na maior parte dos casos eram diplomas trazidos à Corte pelas misericórdias para solicitar as devidas confirmações, dos quais só foram registados os que obtiveram resposta afirmativa». In Isabel dos Guimarães Sá, José Pedro Paiva, Portugaliae Monumenta Misericordiarum, Fazer a História das Misericórdias, Centro de Estudos de História Religiosa, Universidade Católica Portuguesa, Lisboa, União das Misericórdias Portuguesas, 2002, ISBN 972-98904-0-4.

Cortesia UMPortuguesas/JDACT