quarta-feira, 23 de julho de 2014

Portugal um Destino Histórico. Jorge Macedo. «Não se podem iludir em pirotecnias de particularismos sem função e menos ainda supor que a sempre diversa problemática humana pode ser resolvida com violências ecológicas ou em contratos puramente materiais»

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Palavras Prévias
«As condições em que nos encontramos, reunião de historiadores espanhóis e portugueses, neste lugar e neste momento, tornam-se uma oportunidade relevante para procedermos a uma meditação, de algum modo, em comum, sobre o que sentimos dever salientar quanto ao destino histórico, dos dois estados peninsulares, Portugal e Espanha. E já não o fazemos só entre nós, mas num cenário mais amplo e decerto que mais seguro, para a garantia das conclusões. Fazemo-lo com a certeza imediata da nossa responsabilidade, na Europa e no Mundo. É certo que sempre acabou por ser assim. Mas tal certeza não se manifestava com a mesma velocidade de notícia, comunicação cultural e intercâmbio das medianas, nem nas actuais circunstâncias de pouca sensibilidade imediata aos sacrifícios necessários à criação nacional própria e à sua perenidade. A esse respeito, o tempo de espera é maior.
Com efeito, as preocupações com o desenvolvimento são, hoje, as mais particularmente, exigentes e significativas. Não se podem iludir em pirotecnias de particularismos sem função e menos ainda supor que a sempre diversa problemática humana pode ser resolvida com violências ecológicas ou em contratos puramente materiais, esquecendo os decisivos e múltiplos factores espirituais. Temos visto medidas para preservar o cabrito montês, mas nada vimos ainda que nos defenda da publicidade, da falta de civismo ou da lenta deterioração de valores que levam à subalternização do espírito publico! Se nos não precavermos e aceitarmos como as únicas possíveis generalidades poderosas, só tarde veremos que elas são estéreis em si mesmas, como tais. Pagá-lo-emos em inércia e desinteresse, na perda de criatividade, na desertificação da uniformidade que espreita as grandes hegemonias e na paragem do aproveitamento dos nossos dotes naturais.
Não pode, pois, ser esquecido o longo trajecto histórico dos povos da Península. Foi, por diferentes vezes, comum, mas, sempre, só paralelo. Com isso todos nós temos beneficiado, como comunidade, sejamos poderes, nações, estados ou sensibilidades. As independências não foram vantajosas só para Portugal. As identidades construídas desde remotas proveniências, ao chegarem à insofismável confirmação política, desempenharam um papel decisivo no equilíbrio peninsular que, sendo natural, a todos beneficiou, por diferentes, decisivas, ocasiões e modos. Até hoje.
Não há nações circunstanciais. Isso não quer dizer que uma nação não tenha sempre uma parte de tentativa determinada ou projectada. São realizações humanas, com o sentido de que uma comunidade ou um conjunto de comunidades, por múltiplas condições convergentes, podem encontrar maneiras de explorar formas de desenvolvimento e consulta. São esses meios de conciliação e reforço realizados por actos comuns que lhes permitiram manter o significado que representam as nações. Não é possível considerar este processo como um acaso pois ele se manifesta em actos duráveis e persistentes que ultrapassam as consciências individuais e se concretizam em realizações históricas que compreendem pessoas, lugares, decisões colectivas que conquistaram a continuidade com que se exprimem. O conceito de circunstância é incompatível com o de nação e ainda se torna menos verosímil se o aplicarmos a uma nação, como é a portuguesa, que tem quase nove séculos de existência política. Se nove séculos de independência política são circunstância, o que é então uma permanência? Os sucessos e os insucessos vividos em comum provam que uma nação adquiriu consciência crítica quanto às suas capacidades e conseguiu formular uma interpretação assente nos sucessivos triunfos da sua unidade realizada. E não será isso a sua história? E não poderá definir, ou contribuir para definir, um destino históricoIn Jorge Borges Macedo, Portugal um Destino Histórico, Academia Portuguesa da História, Lisboa, 1999, ISBN 972-624-127-8.

Cortesia de APHistória/JDACT