Acção. Ver claro é não agir
«O governo do mundo começa em nós mesmos. Não são os sinceros
que governam o mundo, mas também não são os insinceros. São os que fabricam em
si uma sinceridade real por meios artificiais e automáticos; essa sinceridade
constitui a sua força, e é ela que irradia para a sinceridade menos falsa dos
outros. Saber iludir-se bem é a primeira qualidade do estadista. Só aos poetas
e aos filósofos compete a visão prática do mundo, porque só a esses é dado não
ter ilusões. Ver claro é não agir».
A inacção consola de tudo
«A inacção consola de tudo. Não agir dá-nos tudo. Imaginar é
tudo, desde que não tenda para agir. Ninguém pode ser rei do mundo senão em
sonho. E cada um de nós, se deveras se conhece, quer ser rei do mundo. Não ser,
pensando, é o trono. Não querer, desejando, é a coroa. Temos o que abdicamos,
porque o conservamos sonhado, intacto, eternamente à luz do sol que não há, ou
da lua que não pode haver».
In Fernando Pessoa, ‘Livro
do Desassossego’
O escrúpulo é a morte da acção
«O escrúpulo é a morte da acção. Pensar na sensibilidade
alheia é estar certo de não agir. Não há acção, por pequena que seja, e quanto
mais importante, mais isso é certo, que não fira outra alma, que não magoe
alguém, que não contenha elementos de que, se tivermos coração, nos não
tenhamos que arrepender. Muitas vezes tenho pensado que a filosofia real do
eremita estará antes no esquivar-se a ser hostil, pelo simples facto de viver,
do que em qualquer pensamento directamente relacionado com o isolar-se. In
Fernando Pessoa, ‘A Educação do
Estóico’
Cortesia de Casas das Letras/JDACT