«A
sexualidade, o erotismo e o amor estão relacionados entre si. Interpenetram-se
e não é possível traçar quaisquer fronteiras definidas entre eles. Os três
conceitos em si não podem definir-se claramente, sobretudo porque são
diferentemente aplicados segundo o contexto. Duma maneira geral, entende-se por
sexualidade tudo o que se insere no âmbito do físico e instintivo; por erotismo
as formas requintadas, espiritualizadas e influenciadas pela civilização
humana; e por amor as relações pessoais. Durante muito tempo considerou-se a
reprodução o objectivo único da sexualidade, que era assim considerada, ao
mesmo tempo, como a relação entre os dois sexos. No entanto, basta o
aparecimento da homossexualidade, que existe igualmente em povos primitivos (e
até nalgumas espécies de animais), para demonstrar que essas ideias são
insuficientes. Das relações heterossexuais fazem parte muitos actos que não
servem para e reprodução ou que nem sequer têm nada a ver com os órgãos
sexuais. O mais extraordinário exemplo disto é o beijo. A sexualidade humana também
não começa só na puberdade, em cujo fim se encontra a capacidade de reprodução.
O instinto sexual encontra-se em actividade desde os primeiros dias de vida, e
as suas formas de expressão desenvolvem-se no decurso da infância, muito antes
de as glândulas sexuais começarem a funcionar. Depois da puberdade a reprodução
continua ainda a ser evitada por motivos sociais, embora nesta altura a
sexualidade esteja em pleno florescimento e tenha, portanto, também de
encontrar qualquer forma de expressão.
Dum
outro ponto de vista, considerava-se como objectivo da sexualidade a sua força
no estabelecimento de ligações humanes e na sua manutenção. Portanto, nesta
acepção, a sexualidade é quase equiparada ao amor. Mas há muitos encontros
sexuais que não valorizam o parceiro como indivíduo: basta pensarmos nos actos
sexuais sem parceiro (auto-erotismo). Pelo contrário, é frequente certas
relações de amor ou amizade não poderem efectivar-se sem serem imediatamente
identificadas como sexuais. A forma preferida de ligação duradoura, que servirá
igualmente para a reprodução, é o casamento. Mas os casamentos celebram-se
muitas vezes segundo exigências de parentesco ou grupos étnicos, sem se ter
muito em conta o amor. O próprio casamento significa, para além de sexualidade ou amor, igualmente uma comunhão de trabalho e de economia e, se for
bem sucedido, transforma-se em amizade. A instituição social do casamento e as
suas possibilidades são um exemplo de como as motivações sexuais se podem
confundir com outras motivações bem diversas.
Só
uma pequena parte dos actos sexuais é realizada tendo em vista a reprodução, ou
em nome do amor. A humanidade procura o prazer na sexualidade. Ocasionalmente, o
prazer é considerado como isca, por meio da qual a natureza leva o homem à reprodução.
Mas a vida exige tanto e traz tantas preocupações que poderemos perguntar se a
humanidade ainda teria coragem suficiente para sobreviver sem este prazer. A
sexualidade humana distingue-se da maior parte dos animais em primeiro lugar porque
o comportamento dos humanos já não é certamente ditado pelos instintos, mas,
pelo contrário, tem de ser regulado pela razão. Esta modificação começa já
nos macacos. Depois produzem-se modificações fundamentais no decurso do progresso
permanente da humanidade. A forma da bacia transforma-se; a gravidez e o parto
tornam-se mais difíceis; surge uma nova aquisição, o hímen; torna-se possível a
união sexual frente a frente. O bebé humano, em consequência do parto mais difícil,
nasce num estado mais prematuro do que o dos filhotes dos outros mamíferos,
tendo de permanecer durante mais tempo sob a protecção dos pais. Nestas
transformações físicas estão já preparadas consequências psicológicas que conduzem
a uma civilização, a um erotismo. Com a passagem à posição vertical, os órgãos
sexuais tornam-se visíveis: aqui começa o sentimento de vergonha. O homem
ergue-se da terra; o seu olfacto perde importância e, visto que é uma
reminiscência do passado animal, muitas sensações olfactivas tornam-se
francamente tabu. Em contrapartida, cultivam-se
os sentidos relativos à distância, a vista e o ouvido». In Ludwig Knoll e Gerhard Jaeckel,
1976, Léxico do Erótico, Sexualidade, Erotismo e Amor, Livraria Bertrand, Círculo de Leitores, Oficinas
Gráficas da Livraria Bertrand, 1981.
Cortesia
de LBertrand/JDACT