quarta-feira, 31 de outubro de 2018

O Juiz do Egipto no 31 A Justiça do Vizir Christian Jacq. «Afastou o portal da janela de madeira e relanceou o olhar pelo exterior. Ninguém. Com um resmungo, pensou no magnífico dia que se anunciava»

jdact e cortesia de wikipedia

«Chegou a hora da derradeira e decisiva confrontação neste último volume da trilogia O Juiz do Egipto. Paser, investido no cargo de vizir, e sua esposa Néféret, nomeada médica-chefe do reino, enfrentam o ministro das Finanças, director da Dupla Casa branca, que já não hesita em apresentar-se como o porta-voz dos conspiradores que detêm o testamento dos deuses e se aprontam para derrubar Ramsés o Grande a fim de conquistar o poder supremo. O alto funcionário, que se fazia passar por amigo de Paser, tecera entretanto uma teia tão forte que a situação parece desesperada, desorganizando a economia e orientando-a pela simples lei do lucro, mostra-se decidido a destruir, com os cúmplices, os valores que presidiram ao nascimento da civilização egípcia. O vizir e a esposa, determinados a lutar até ao fim, tentam resistir à tenaz que pouco a pouco se aperta e identificar o assassino do seu mestre espiritual que teve a má sorte de cruzar com a rota dos conspiradores. Mas os aliados são raros... E onde se encontra o irmão de sangue, Suti, que conseguiu fugir da prisão núbia? Acabará o misterioso devorador de sombras por suprimir Paser? Quem é a verdadeira alma da conjura, que se mantém escondida nas trevas? Com a traição e o crime de um lado, e a lei do vizir do outro, quem sairá finalmente vencedor deste combate de que depende a sobrevivência do Egipto?

Rejubila, ó terra inteira!
Foi restaurada a justiça.
E vós, justos, vinde e contemplai,
A justiça triunfou sobre o mal,
Os perversos foram derrubados,
Os ávidos foram condenados.

In Papyrus Sallier (Museu Britânico 1018)

A traição trazia-lhe grandes benefícios. Bochechudo, vermelhusco, balofo, Larrot bebeu a sua terceira taça de vinho branco, congratulando-se pela sua escolha. Quando era escrivão do juiz Paser, tornado vizir de Ramsés, o Grande, trabalhava muito e ganhava pouco. Desde que entrara ao serviço de Bel-Tran, o pior inimigo do vizir, a sua existência prosperava. Em troca de cada informação sobre os hábitos de Paser, recebia uma retribuição. Com o apoio de Bel-Tran e o falso testemunho de um dos seus esbirros, Larrot esperava obter, a qualquer preço, o divórcio de sua mulher e a custódia de sua filha, futura bailarina. Molestado por uma enxaqueca, o ex-escrivão levantara-se antes da alvorada, quando a noite reinava ainda sobre Mênfis, a capital económica do Egipto, situada na junção do Delta e do vale do Nilo. Da ruela, habitualmente tranquila, chegou-lhe o som de murmúrios. Larrot pousou a taça. Desde que traía Paser, bebia cada vez mais, não por remorso, mas porque podia, enfim, comprar vinhos de boas colheitas e cerveja de primeira qualidade. Uma sede inextinguível queimava-lhe a garganta sem cessar.
Afastou o portal da janela de madeira e relanceou o olhar pelo exterior. Ninguém. Com um resmungo, pensou no magnífico dia que se anunciava. Graças a Bel-Tran, ia deixar aquele subúrbio para residir num bairro melhor, próximo do centro da cidade. A partir dessa tarde, instalar-se-ia numa casa de cinco divisões, com um pequeno jardim, no dia seguinte, seria titular de um posto de inspector do fisco, dependente do ministério dirigido por Bel-Tran. Apenas uma contrariedade se apresentava: apesar da qualidade das informações fornecidas a Bel-Tran, Paser não fora ainda eliminado, como se os deuses o protegessem. A sorte acabaria por mudar. Lá fora ouvia-se o som de risos. Perturbado, Larrot colou o ouvido à porta que dava para a ruela. Subitamente, percebeu: tratava-se novamente daquele bando de crianças que se divertia a sujar a fachada das casas com uma pedra ocre! Furioso, abriu a porta sem pensar. Na sua frente, a boca aberta de uma hiena. Uma fêmea enorme, com a baba escorrendo dos beiços e os olhos vermelhos. O animal soltou um grito, semelhante a uma gargalhada do outro mundo, e saltou-lhe à garganta». In Christian Jacq, O Juiz do Egipto, A Justiça do Vizir, Bertrand Editora, 1995, ISBN 978-872-250-890-2.

Cortesia de BertrandE/JDACT