quarta-feira, 17 de outubro de 2018

O Porto contra os Corsários. Amândio M. Barros. «Os estuários, baías, enseadas e pequenas ilhas (sobretudo nas Rias Bajas) proporcionavam abrigos fáceis e boas possibilidades de fuga aos corsários que actuavam na costa galega»

Cortesia de wikipedia e jdact

«(…) No século XV, os corsários faziam uso destas e doutras práticas. Nos portos movimentados era importante ter quem espiasse o movimento, se inteirasse das chegadas e partidas dos navios, qual a carga que embarcavam e para onde se dirigiam, e que lhes fizesse chegar rapidamente esses elementos antes que houvesse tempo de os agentes portuários reagirem. Em 1443 a cidade do Porto conheceu uma situação deste género. Na sessão camarária de 8 de Julho, perante grram parte domeens boons E mercadores foi decidido que por quanto lhes era dito que allgumas naaos degaliza E doutras partes andauom darmada E tragiam aquj em esta cydade allgumas emcullquas della que lhe leuauom nouas das naaos que aquj caregauom E acordarom que screuesem ao Senhor Regente e ao Senhor duque a maneira que acerca desto terriam que mandasem llogo la senhos homeens a cada parte e mandarom seis. Referimos o envio de correios por terra. Ora, foi por intermédio de um destes correios que à cidade chegou a notícia do apresamento de algumas embarcações no ano de 1448. Na sessão de 20 de Novembro desse ano foy liuda burna carta que os estantes em bruJes em uiaraom aa dicta Çidade de como çerteficauam as naaos pinta E a naao de prado serem tomadas dos Ingresses e mortos çertos homeens e outros mujto feridos a qual carta foy tragida per huum troteiro que eles enuiarom por terra.
Do mesmo modo, no ano fiscal de 1450-1451 regista-se nos Livros do Cofre da cidade o seguinte pagamento: deu a Joao Martinz çapateiro por hir a Viana e a Bayona por rezam dos franceses, cento e cinquoenta reaes. Vejamos alguns casos de assaltos contra navios do Porto durante o século XV. Nos anos 20 dessa centúria, há notícias de problemas marítimos com biscainhos. Zona percorrida intensamente pelos navios em trânsito para o Norte da Europa, a costa da Biscaia era palco de inúmeros confrontos navais. Os navios portugueses eram frequentemente importunados pela sua pirataria. Numa carta de 11 de Junho de 1428, Rafael Fogaça, representante do rei em Bruges, comunicava a Afonso Eanes, estante em Génova o seguinte: Jtem, amjgo, façouos saber que os bizcaynhos nom nos querem ahinda lleixar en paz; que, ujndo hua naao do Porto, nosa, de Joham Afonso dArrifana, carregada de uinhos e auer de pesso, que partira de Lixboa pera en Frandes, foy tomada delles e lleuada a Rochella e aly uenderom os bizcaynhos toda a mercadaria. Por motivos óbvios relacionados com a impossibilidade de beneficiar delas, os assaltantes não se interessaram pelas letras de câmbio do rei português que um seu agente, Çerrabodes, levava consigo no navio.
Neste caso, trata-se da nau de um conhecido homem de negócios do Porto, ao serviço do rei, em trânsito de Lisboa para a Flandres. Note-se igualmente o envolvimento no comércio de vinhos para compensar compras nessa região e, por fim, da parte dos agressores, a utilização de um porto aberto (La Rochelle) onde transaccionavam livremente as suas presas. Os estuários, baías, enseadas e pequenas ilhas (sobretudo nas Rias Bajas) proporcionavam abrigos fáceis e boas possibilidades de fuga aos corsários que actuavam na costa galega. Entre eles tornou-se célebre e temido o salteador Gonçalo Correia, possivelmente galego, autor de numerosos ataques a embarcações durante a década de 30 desse mesmo século. O Porto conheceu-o e deu-lhe combate. No dia 17 de Dezembro de 1431 chegavam à cidade notícias alarmantes, dando conta de que as naaos e navios que veem de Frandes e de Ingraterra com o retorno do aver de peso jazem em Galiza em grande perigoo dos inimigos cossairos principalmente de Gonçalo Correa que esta acerca dellas com grande poderio de
naaos e de gentes». In Amândio M. Barros, O Porto contra os Corsários, bolseiro da Fundação para a Ciência e Tecnologia, Revista da Faculdade de Letras, História, Porto, III Serie, 2000».
                                                 
Cortesia da RevistadeLetras/JDACT