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e cortesia de wikipedia
«Ele é juiz numa província do Sul, ela é
médica em Mênfis, a grande cidade do Norte. Paser jamais deveria ter encontrado
a bela Néféret. Mas Paser é chamado a
Mênfis, cidade próxima da grande pirâmide de Gize. Em conformidade com as
profecias de um velho sábio, o crime espalhou-se, uma monstruosa conspiração
está em curso para destronar Ramsés, o Grande. Nada a poderá deter. Nada, a não
ser um grão de areia: o olhar atento de um juiz subalterno que se recusa a
assinar um documento administrativo que não entende. Com a
ajuda do seu amigo de infância Suti, que foge da escola de escribas para viver
rodeado de mulheres e trilhar o caminho dos heróis, o juiz Paser parte em busca
da verdade. No caminho encontra a bela Néféret, vítima do ódio do
médico-chefe do reino. Um amor impossível, uma tentativa de golpe de Estado,
crimes, o triunfo da mentira: não será este um fardo pesado demais para os ombros
de um juiz subalterno?
Aconteceu o que os antepassados vaticinaram. O
crime propagou-se, a violência invadiu os corações, a infelicidade assola o
país, o sangue corre, o ladrão enriquece, o sorriso apagou-se, os segredos
foram divulgados, as árvores arrancadas, a pirâmide violada, o mundo desceu tão
baixo que um pequeno número de loucos se apoderou do trono, e os juízes são
perseguidos. Mas lembrem-se do respeito à Regra, da justa sucessão dos dias,
dos dias felizes em que os homens construíam pirâmides e cultivavam pomares
para os deuses, dessa bendita época em que uma simples esteira bastava para as
necessidades de todos e todos eram felizes.
Uma noite sem lua envolvia a grande pirâmide num manto de trevas. Uma
raposa das areias introduziu-se furtivamente no cemitério dos Nobres que, no
além, continuavam a venerar o faraó. O monumento onde apenas
Ramsés, O Grande,
entrava uma vez por ano a fim de prestar
homenagem a Quéops, o seu glorioso antepassado, era vigiado por guardas, corria
o boato de que a múmia do pai da pirâmide mais alta estava encerrada num
sarcófago de ouro coberto de riquezas incalculáveis. Mas quem ousaria
aproximar-se de tesouro tão bem guardado? Ninguém, à excepção do soberano,
podia transpôr a porta de pedra e encontrar o caminho certo no labirinto do
gigantesco monumento. O corpo de elite encarregado de o proteger disparava o
arco sem aviso, várias flechas trespassariam o imprudente ou o curioso. O
reinado de Ramsés era feliz, próspero e em paz, o Egipto resplandecia aos olhos
do mundo. O faraó era o mensageiro da luz, os cortesãos serviam-no com
respeito, o povo louvava o seu nome.
Os cinco conjurados saíram juntos de uma cabana de
operários onde se haviam escondido durante o dia, repetiram o plano vezes sem
conta para terem a certeza de não deixarem escapar nenhum pormenor. Se o
concretizassem, tornar-se-iam mais cedo ou mais tarde donos do país e
imprimir-lhe-iam o seu cunho. Vestidos
com uma túnica de linho grosseiro, atravessaram o planalto de Gize, mas não sem
lançarem olhares febris à grande pirâmide. Atacar os guardas
seria uma loucura, antes deles, já outros haviam tentado apoderar-se do tesouro
sem o conseguirem. Um mês antes, a grande esfinge fora libertada da
camada de areia acumulada por várias tempestades. O gigante, de olhos permanentemente
erguidos para o céu, era alvo de menos cuidada protecção. O seu nome de estátua
viva e o terror que inspirava eram suficientes para afastar os profanos. A
esfinge, faraó de corpo de leão esculpido na rocha calcária em tempos que não
cabem na memória, fazia nascer o Sol e conhecia os segredos do Universo. A sua
guarda de honra era formada por cinco veteranos. Dois deles, encostados à parte
de fora do muro, dormiam a sono solto. Não veriam nem ouviriam nada. O mais ágil dos conjurados escalou o muro, resoluto e silencioso,
estrangulou o soldado que dormia perto do flanco direito da fera de pedra, aniquilando de seguida o companheiro, que se
encontrava perto do quarto dianteiro esquerdo do animal.
Os outros conjurados juntaram-se a ele. Eliminar o terceiro
veterano não seria tão fácil. O chefe dos guardas estava postado frente à
esteia de Tutmósis IV, erguida entre as patas dianteiras da esfinge, para
lembrar aos homens que esse faraó lhe devia o seu reinado. Armado com uma lança
e um punhal, o soldado defender-se-ia. Um
dos conjurados despiu a túnica. Nua, avançou para o guarda. Surpreso,
ele fitou a aparição. Não seria aquela mulher um dos demónios da noite que
vagueavam pelas pirâmides para roubar as almas? Ela aproximou-se sorrindo.
Desnorteado, o veterano levantou-se agitando a lança, o braço tremia-lhe. Ela
parou. Para trás, fantasma, arreda-te daqui! Não te vou fazer mal. Deixa-me acariciar-te. O
olhar do chefe da guarda estava preso ao corpo nu, àquela mancha branca na
escuridão. Hipnotizado, deu um passo em frente. Quando a corda se enrolou à
volta do seu pescoço, o veterano largou a lança, caiu de joelhos, tentando em
vão gritar, e desfaleceu. O caminho está livre.
Vou preparar as candeias. Os cinco conjurados, em frente à esteia, consultaram pela
última vez o plano e encorajaram-se mutuamente a continuar, apesar do medo que
os atormentava. Deslocaram a esteia e contemplaram o vaso selado que assinalava
a localização da boca do inferno, da porta das entranhas da terra. Afinal, não era lenda! Vejamos se existe mesmo uma passagem. Por
baixo do vaso estava uma laje com uma argola. Eram precisos quatro para a
levantar. Um corredor estreito, muito baixo e quase a pique, mergulhava nas
profundezas. Depressa, as candeias! Deitaram
o óleo de pedra, muito gorduroso e fácil de inflamar em taças de dolerite. O
faraó interditara o seu uso e a sua venda pois o fumo negro que resultava da
combustão fazia perigar a saúde dos artesãos encarregados da decoração de
templos e sepulturas, e sujava os tetos e as paredes. Os sábios afirmavam que este petróleo, como
lhe chamavam os bárbaros, era uma substância nociva e perigosa, uma exsudação
maligna das pedras, carregada de miasmas. Mas os conjurados não se preocuparam
com isso»». In Christian Jacq, O Juiz do Egipto, A Pirâmide
Assassinada, 1993, Bertrand Editora, 1996, ISBN
978-972-250-835-3.
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