domingo, 17 de abril de 2016

A Favorita do rei Dinis. Vataça. Francisco do Ó Pacheco. «Terás que te contentar com os filhos dos meus irmãos e meus sobrinhos. Deus também não quis que tivesse filhos de Dinis. Mas minha adorada mãe…»

jdact

«(…) De facto, Vataça casaria aos dezassete anos com Martim Anes Soverosa em 1285, um fidalgo que já passara o meio século de vida. Coisas da política e de um poder régio mais ou menos absoluto. Tudo começara com a morte do rei de Castela, Afonso X, no ano de 1284. Queria Afonso de Castela que o seu sucessor fosse o seu primeiro filho, Fernando de la Cerda, mas face ao falecimento deste e não querendo que o seu segundo filho, Sancho, ocupasse o trono, determinou que seu neto, Afonso de la Cerda, lhe sucederia. Puro engano. Seu segundo filho, Sancho, com uma forte coligação de nobres, deserdou o sobrinho e fez-se coroar rei em Toledo nesse mesmo ano. Os tempos que se lhe seguiram foram terríveis para todos aqueles que se lhe haviam oposto. Mandou matar milhares de castelhanos de todas as classes sociais, criando em Castela e Leão um clima de terror nunca antes visto. Muitos nobres pediram auxílio a el-rei Dinis I e este, com receio de represálias pela parte de Sancho IV, encetou contactos com Aragão no sentido de se ajudarem mutuamente em caso de agressão. Mas o monarca Dinis quis ir mais longe e iniciou contactos com vários nobres da Galiza mesmo sabendo da ligação destes a Castela. A verdade é que a Galiza sempre gozara de um estatuto de grande autonomia em relação a Leão e Castela e essa autonomia poderia ser útil a Portugal. Logo, nada melhor para tais objectivos que ter um nobre português, dos mais credenciados junto da nobreza galega, para consolidar uma política de boa vizinhança e ajuda mútua. E tal nobre só podia ser Martim Anes Soverosa cuja família estivera fortemente ligada à Galiza e aos primeiros reis de Portugal desde Afonso Henriques. Martim Anes gozava de enorme prestígio junto dos nobres galegos e poderia conseguir perfeitamente os propósitos do rei de Portugal. Mandou por consequência Dinis I a Vataça Lascaris, que o desposasse e garantisse que os fins pelos quais o casamento se iria realizar seriam alcançados.
Pala além desta iniciativa diplomática junto da Galiza, Dinis I ainda conseguia resolver um outro problema. Afastava dona Vataça Lascaris da Corte, onde os zunzuns da sua relação com a princesa bizantina soavam cada vez mais alto, apesar da Rainha dona Isabel ser insensível ao ciúme. E encontros com Vataça em Soverosa, que ficava a sete ou oito léguas a leste do Porto ou a dez léguas ao su1 de Braga, seriam frequentes. mas muito mais seguros. Bastaria levar a Corte ou parte dela ao norte para saber como estavam as relações com a nobreza galega e visitar o palácio dos Soverosa e reencontrar a sua concubina favorita. Mas pouco adiantou para Portugal aquele casamento, pois Sancho IV de Castela acabana por invadir Portugal e a guerra entre os dois reinos só terminaria com a sua morte, em 1295, por acaso o mesmo ano do falecimento de Martim Anes Soverosa. Depois o Tratado de Alcanizes resolveria todos os diferendos entre os dois reinos.
Mas não me deste nenhum neto até agora, filha! Disse Eudóxia com tristeza. Pois não, mãe. Terás que te contentar com os filhos dos meus irmãos e meus sobrinhos. Deus também não quis que tivesse filhos de Dinis. Mas minha adorada mãe e desculparás esta minha pergunta, tens de me dizer o que se passou entre ti e o meu pai para que tivéssemos de sair de Ventimiglia. Fomos expulsos como deste a entender ontem à tarde? Nem eu sei ao certo o que se passou. Tudo aconteceu já depois da morte de teu pai. Foi então que me comunicaram que tínhamos sido deserdados e que deveríamos abandonar Ventimiglia. Falaram-me que por detrás dessa terrível decisão política estaria a mão de Miguel Paleólogo, de Constantinopla, e que a principal razão teriam sido as minhas tentativas de angariar apoios para que os Lascaris regressassem ao império bizantino, como era seu direito. Comecei então os contactos com Jaime I de Aragão, ainda nosso familiar, para que pudéssemos ser acolhidos em Zaragoça, tal como veio a acontecer». In Francisco do Ó Pacheco, Vataça, A Favorita de Dom Dinis, Prime Books, 2013, ISBN 978-989-655-183-4.

Cortesia de PBooks/JDACT