quarta-feira, 20 de abril de 2016

A Primeira Rainha de Portugal. Dona Teresa. Marsilio Cassotti. «… depois no cerco de Tudela, estariam presentes dois sobrinhos de Constança, o duque Eudes I “Borrell”, ruivo em catalão, de Borgonha e o seu cunhado, o conde Raimundo de Borgonha, que no Verão de 1087…»


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A criação de uma futura Rainha (1085-1095)
«(…) Enquanto Afonso VI participava no cerco à cidade de Saragoça, durante a Primavera de 1086, os seus espiões no Estreito de Gibraltar avisaram-no do desembarque na Península de forças almorávidas, tropas berberes chamadas em auxílio pelos reinos de taifas ibéricos, pois a perda de Toledo tinha gerado uma reacção de orgulho numa parte da população muçulmana nativa.
Antes de empreender o regresso rumo ao centro, Afonso solicitou ajuda aos nobres forasteiros que participavam no cerco da fortaleza de Saragoça. Não se tratava de estimular o espírito guerreiro de cavaleiros idealistas, uma vez que o risco era grande até para eles, pois séculos antes os muçulmanos tinham chegado a instalar-se no sul da Gália, e o que hoje sofriam os cristãos da Península Ibérica um dia poderiam senti-lo na sua própria pátria. Não é provável, contudo, que nobres franceses tenham acompanhado Afonso no seu caminho de regresso. Isso livrou-os de marcar presença na sangrenta batalha nos campos de Zalaca, a norte de Badajoz, a 23 de Outubro de 1086, na qual as tropas cristãs foram derrotadas e na qual cairia um grande número de guerreiros pertencentes à nobreza galaico-portuguesa, entre eles o conde Rodrigo Muñiz Gallecie, filho do conde Muño Rodrigues, casado com a infanta Jimena Ordóñez e considerado pela genealogia tradicional pai de Jimena Muñiz.
Pelo contrário, nos confrontos entre cristãos e muçulmanos que teriam lugar pouco depois no cerco de Tudela, estariam presentes dois sobrinhos de Constança, o duque Eudes I Borrell, ruivo em catalão, de Borgonha e o seu cunhado, o conde Raimundo de Borgonha, que no Verão de 1087 viajaram até Leão para prestar homenagem à tia. De facto, a 5 de Agosto desse ano o primeiro confirmou ali um documento de doação feito pela rainha.
É provável que tenha sido nessa altura que se concluiu o compromisso entre Raimundo e a infanta Urraca, que rondaria os sete anos e era até esse momento a única filha conhecida do rei Afonso. A poucos meses de uma derrota na qual tinham caído muitos dos seus melhores soldados, o rei tinha necessidade de reforçar o seu próprio poder. Uma das formas de conseguir o apoio dos seus nobres era assegurar a sua sucessão, e uma vez que ainda não tinha um filho varão, só podia fazê-lo casando a sua filha primogénita.
Segundo a Historia Compostelana, o rei Afonso prometeu ao conde de Borgonha nomeá-lo seu herdeiro. Mas é preciso ter muito cuidado com esta crónica, pois foi escrita em função dos interesses dos arcebispos dessa sede, daí a sua parcialidade e às vezes distorção dos factos históricos. Paradoxalmente, é uma das fontes a que mais recorreremos, porque trata aspectos que a maioria das outras crónicas do período omitem.
A mulher de Raimundo, ou mais exactamente a sua prometida, era muito jovem para ter descendência. Além do mais, o conde de Borgonha era um nobre estrangeiro e, portanto, mais do que o seu parentesco com a rainha Constança (não tão próximo como se disse, pois era tia por afinidade da sua irmã) pesaria a sua estreita relação com o abade de Cluny e talvez o seu alto prestígio nobiliário». In Marsilio Cassotti, D. Teresa, A Primeira Rainha de Portugal, Prefácio de G. Oliveira Martins, Attilio Locatelli, A Esfera dos Livros, 2008, ISBN 978-989-626-119-1.

Cortesia da EdosLivros/JDACT