segunda-feira, 20 de agosto de 2018

D. Pedro V e o seu Reinado. Júlio de Vilhena. «O expediente corria, entretanto, regularmente. O Rei aprovava os estatutos do Montepio das Secretarias de Estado e parecia-lhe que este seria o melhor modo de regular as pensões»

Cortesia de purl

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Este arbítrio talvez não seja o mais conforme com os princípios; talvez seja porem o mais prudente; e há casos em que a prudência dispensa certos princípios de uma natureza não inteiramente obrigatória. Lembram também estas corporações a vantagem de permittir a transferência dos coupons em inscripções de assentamento como meio de tranquilisar alguns mais escrupulosos. A questão principal, porém, neste momento é a de saber se se devem ou não devem pagar os coupons falsos, e bom será resolvê-la quanto antes. Perdoe esta massada dada a quem ainda está doente; e eu aqui quasi estou ensinando o Padre Nosso ao vigário.

Este caso, depois de algumas soluções pouco aceitáveis que a Junta lhe deu, como a de obrigar os portadores a apresentarem os títulos com os próprios coupons, na ocasião do pagamento deles, veio a ficar resolvido pelo decreto de 30 de Janeiro de 1856, que mandou trocar por outros títulos as inscrições ao portador e encerrado finalmente pela lei que mandou pagar aos credores do estado prejudicados. Não valeria a pena de falar nesta ocorrência, se não fosse a carta escrita pelo Rei a Rodrigo Fonseca. Alem da perfeita observação que este documento revela, há a notar a claresa com que ele expõe o assunto e o interesse que lhe despertava qualquer incidente de administração. O que trazia absorvido o espírito público e o que dava cuidados ao Rei era, naquele momento, a questão das subsistências e também a da cólera mórbus que, entre outros factos a que deu origem, ocasionou o encerramento da Universidade e o ficar o Rei pouco bem visto pelos estudantes, em consequência da oposição que fez à concessão do perdão de acto.
Em 21 de Dezembro foi reaberta a Universidade, mandando-se começar os trabalhos no dia 7 de Janeiro. Deste modo o ano lectivo de 1855-1856 ficou encurtado em relação ao ano normal, não obstante as aulas de direito, teologia e medicina funcionarem até 20 de Junho e as de filosofia e matemática até 10 de Julho. Lembraram-se os estudantes de pedir perdão d’acto; o Rei, porem, não se mostrava inclinado a conceder-lho. E, para que o seu governo não pudesse alegar ignorância, escrevia a Rodrigo:

Não sei qual será a opinião do Governo a semelhante respeito; a minha, quási que escusaria de dizê-lo, é contrária ao que considero um grande mal não só para a instrução como também para os interesses da fazenda. Se em tempos ordinários é tão grande a produção de bacharéis, e tão escassos os meios de dar vasão a esse produto; que será se facilitarmos ainda mais essa produção! Alem disso tendo-me eu constantemente ocupado da instrução pública e lamentando os males que provêem da facilidade com que entre nós se alcança a instrução superior, seria, creio eu, uma singular contradição eu não opor-me a pedidos absurdos, que nem sei se efectivamente existem. No entretanto julguei dever referir isto que acabo de dizer, porque entendo que é sempre melhor prevenir do que remediar.

O expediente corria, entretanto, regularmente. O Rei aprovava os estatutos do Montepio das Secretarias de Estado e parecia-lhe que este seria o melhor modo de regular as pensões. Também lhe submeteram à assinatura um decreto sobre o ensino veterinário, mas esse ficou dependente de mais acurado exame:

Quanto ao decreto reformando o ensino veterinário ainda me reservo examiná-lo mais miudamente, e para isso pedi ao duque que viesse cá. Concordo com muitas das disposições, quanto a outras careço de conhecer os motivos que lhes deram razão de existência. A demora que daí possa provir não há-de ser grande, e certamente não se estenderá como em certos papéis urgentes, por exemplo, de Julho de 1853 a 1855. No projecto não se pode negar que existem alguma poesia, e algumas ilusões.

E em outra carta (21 de Dezembro) indica o que supõe mais conveniente fazer.

Quanto ás coudelarias militares ou antes potrís eu lembraria que, estabelecendo-se em princípio, se estabeleçam na realidade como ensaios em ponto limitado e só naquellas localidades que para isso apresentarem melhores condições. Igual reflexão farei relativamente ao estabelecimento do ensino veterinário em todas as escolas regionais. Eu julgaria a propósito começarmos pelo ensaio no Instituto de Lisboa ou num dos dois do reino. O sistema de ensaios, sobretudo nestas cousas que variam segundo as necessidades dos paises, parece-me sempre o melhor. Recebe-se assim a confirmação ou desengano das ideas, sem correr o perigo de gastar grossas somas com a sua generalisação.

No tocante à questão das subsistências, o Rei desejava que se fizessem inquéritos e outros trabalhos que se publicassem para que o país conhecesse as diligências empregadas para a resolver». In Júlio de Vilhena, D. Pedro V e o seu Reinado, DP 664 V55 610415, 4 de 07 de 1955, Academia das Ciências de Lisboa, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1921.

Cortesia da AC de Lisboa/JDACT