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Julho
«(…)
Dolby sentiu o coração acelerar. Premiu os botões com os seus dedos araneiformes,
ajustando-os com a leveza de um pianista. Prosseguiu com uma série de comandos golpeados
no teclado. Contacto. Os enormes ecrâs planos a toda à volta despertaram
repentinamente. Um súbito ruído cantado parecia flutuar no ar, vindo de todo o lado
e de lado nenhum ao mesmo tempo.O que é isso?, perguntou Mercer, alarmada. Um
bilião de partículas a passar pelos detectores, disse Dolby. Desencadeia uma vibração
elevada. Céus, parece o monólito no 2001. Volkonsky guinchou como um macaco.
Toda a gente o ignorou. Uma imagem apareceu no painel central, o Visualizador. Dolfy
fixou-se nela, arrebatado. Assemelhava-se a uma enorme flor, trémulos jactos de
cor difundindo-se a partir de um único ponto, retorcendo-se e serpenteando, como
que a tentar libertar-se do ecrã. Permaneceu pasmado diante da sua beleza. Contacto
bem sucedido, disse Rae Chen. Os feixes estão focados e colimados. Meu Deus, é um
alinhamento perfeito! Vivas e algumas palmas secas e breves. Senhoras e senhores,
pronunciou Hazelius, bem-vindos às margens do Novo Mundo. Gesticulou para o Visualizador.
Estão a olhar para uma densidade de energia nunca vista no universo desde o Big
Bang. Voltou-se para Dolby. Ken, por favor aumenta a potência em incrementos de
décimas até noventa e nove. O som etéreo aumentou ligeiramente enquanto Dolby manipulava
o teclado. Noventa e seis, disse. Luminosidade dezassete vírgula quatro TeV, disse
Chen. Noventa e sete... Noventa e oito. A equipa mergulhou num tenso silêncio, sendo
o único som audível o murmúrio que ocupava a sala de comando subterrânea, como se
a montanha em redor deles estivesse a cantar. Feixes ainda focados, disse Chen.
Luminosidade vinte e dois vírgula cinco TeV. Noventa e nove. O rumor de Isabella
havia-se tornado ainda mais alto, mais límpido. Só um momento, pronunciou Volkonsky,
curvando-se sobre a estação de trabalho do supercomputador. Isabella estar...,
lenta. Dolby voltou-se bruscamente. Nada de errado, com o hardware. Deve ser mais
uma avaria no software. Software não ter
problema, esclareceu Volkonsky.
Talvez
devêssemos pará-la aqui, disse Mercer. Existe algum indício da criação de um
micro buraco negro? Não, retorquiu Chen. Nem sinal de radiação Hawking. Noventa
e nove vírgula cinco, indicou Dolby. Estou a registar um jet carregado a
vinte e dois vírgula sete TeV, disse Chen. De que tipo?, inquiriu Hazelius. Uma
ressonância desconhecida. Vê. Dois lobos vermelhos e reluzentes haviam-se desenvolvido
em cada um dos lados da flor, no ecrã central, como as orelhas de um palhaço
crescendo descontroladamente. Difusão forte, disse Hazelius. Gluões, talvez.
Poderá ser indício de um gravitão de Kaluza-Klein. Impossível, proferiu Chen. Não
com esta luminosidade. Noventa e nove vírgula seis. Gregory, acho que devíamos
estabilizar a potência aqui, disse Mercer. Estão a acontecer muitas coisas ao mesmo
tempo. É natural que estejamos a ver ressonâncias desconhecidas, disse Hazelius,
num tom de voz não mais alto do que o dos demais, mas de certo modo distinto de
todos eles. Estamos em território desconhecido. Noventa e nove vírgula sete, entoou
Dolby. Tinha confiança absoluta na sua máquina. Podia levá-la aos 100 por cento
e ainda mais acima, se necessário. Deixava-o em frenesim saber que naquele instante
estavam a chupar quase um quarto da eletricidade da Barragem Hoover. Esse era o
motivo pelo qual tinham de fazer os seus ensaios a meio da noite, quando o uso de
energia era menor. Noventa e nove vírgula oito. Temos aqui uma espécie de interacção
desconhecida mesmo grande, disse Mercer. Qual ser problema, cabra?, gritou Volkonsky
para o computador. Acreditem no que vos digo, estamos a entrar num espaço de Kaluza-Klein,
disse Chen. É incrível. Começou a aparecer estática no grande ecrã plano com a flor.
Isabella estar portar-se estranho, anunciou Volkonsky. Como assim?, disse Hazelius
a partir da sua posição no centro da Sala de Controlo. Brincalhão. Dolby revirou
os olhos. Volkonsky era irritante até mais não. Todos os sistemas passam pelo meu
painel de controlo. Volkonsky digitou furiosamente no teclado; emm seguida, praguejou
em russo e golpeou o monitor com a palma da mão. Gregory, não achas que devíamos
desligar?, perguntou Mercer. Dá-lhe mais um minuto, respondeu Hazelius. Noventa
e nove vírgula nove, indicou Dolbv. Durante os cinco minutos anteriores, a sala
passara de sonolenta a híper-desperta, exaltadamente tensa. Apenas Dolby se sentia
relaxado. Concordar com a Kate, disse Volkonsky. Eu não gostar forma como Isabella
porta-se. Começarmos sequência de desligar». In Douglas Preston, Blasfémia,
2007, Edições Saída de Emergência, 2010, ISBN 978-989-637-201-9.
Cortesia de
SEmergência/JDACT