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O
perímetro amuralhado
«(…)
Montês Matoso refere-se assim à famosa torre: junto da porta da Alcaçova da
parte do Poente, no lugar mais alto estava a celebrada Torre do Bufo… Zeferino
Brandão, no capítulo X da obra citada, baseando-se num documento que encontrou
na repartição da Fazenda do distrito de Santarém, afirma que defronte das casas
do conde de Tarouca, na Alcáçova, havia uma cerca com árvores e, no alto dela,
uma torre que se chamava do Bufo. Opina que esta ficava para a parte sul da
cerca, sobre o muro da Alcáçova, e que tinha de comprido sobre a calçada que
vai para o Alfange 105 varas e meia. Além de nos dar a indicação, tal como
Montês Matoso, de que foi demolida em 1660, aventa a hipótese de ter sido esta
a torre que Sancho I doara à ordem de Santiago, em 1193, como se disse. Ocorre
aqui salientar que não são muitas as informações que conheço acerca da Torre do
Bufo. As mais antigas encontram-se no tombo da Alcáçova de 1479, onde parece
confundir-se com a Torre da Covilhã ou então pode admitir-se que fica situada
no mesmo beco (beco primeiro que uay pera a torre da couylhãa ou torre do bufo
que todo he hüu).
Em
contrapartida, para os tempos mais recuados achei, pelo menos, três referências
a uma torre situada na Alcáçova, chamada Torre da Barata. Na sua proximidade,
encontrava-se uma casa (domus juxta turri de Barata) que foi legada à
igreja de Santa Maria pelo seu proprietário Afonso Martins, segundo nos refere
um obituário do século XIII. Em 1330, procedeu-se à arremataçâo por dívidas de
alguns bens sitos na Alcáçova, contando-se entre eles: hum forno e hum lagar
dazeite que an no dicto logo a par da torre da barata os quaes forom de Pero
Anes de Pajuha (...) e tres portaes de casas que son na Rua da Alcaçova. Em
conclusão: nos tempos mais recuados fala-se da Torre da Ladra e da Torre da
Barata que não devem ser confundidas. A Torre do Bufo é um nome referido muito
mais tarde. Será a designação posterior de uma das duas torres anteriores? É
uma hipótese plausível.
As
ordens militares e as instituiçoes religiosas
É um
facto incontestável que um dos grandes suportes da reconquista cristã foi o
espírito cruzadístico, cristalizado nas ordens religioso-militares de
freires-soldados: actuando ao lado do rei nas operações militares, os freires
viram magnanimamente recompensados os seus esforços pelas doações que os
monarcas lhes fizeram. Tais doações eram-lhes prometidas, por vezes, mesmo
antes das conquistas se concretizarem, servindo de estímulo para a luta. Deve
ter acontecido assim com a ordem do Templo que, em Abril de 1147, recebeu de
Afonso Henriques todas as rendas eclesiásticas da vila de Santarém, conquistada
havia um mês, em cumprimento da promessa régia feita antes e para recompensar a
ajuda prestada. Em consequência desta doação, os cavaleiros Templários
edificaram na Alcáçova a igreja de Santa Maria, por mandado de mestre Hugo e
sob a vigilância de Pedro Arnaldo, segundo a inscrição existente ainda na fachada
do edifício que estava terminado em 1154.
Depois
da conquista de Lisboa, a posse do eclesiástico de Santarém foi contestada pelo
bispo Gilberto. Por isso. Afonso I, em 1159, fez doação do castelo de Cera e
seus termos àquela ordem, em troca do referido eclesiástico que passava para a
jurisdição episcopal de Lisboa, excepto a igreja de Santiago de Santarém que
continuou a pertencer aos Templários. Mantiveram ainda as suas casas na
Alcáçova. junto da Porta do Sol. Além da posse desta igreja, situada a meio caminho
entre a Alcáçova e a Ribeira, os freires do Templo detinham muitas terras na
periferia de Santarém. Em 1180 contavam-se, por exemplo, entre os proprietários
das vinhas de Alvisquer. Outra ordem que se implantou no século XII. em
Santarém e seu termo, foi a de Évora, também chamada de Calatrava ou de Avis.
Em 1173, Afonso Henriques fez uma carta de doação e confirmação a Gonçalo
Viegas, mestre daquela ordem, de certos bens em Évora e dumas casas que possuía
em Santarém, em Seserigo: de domibus meis quos habeo in Sanctarene in
Seserigo. É possível que, ainda no século XII, esta ordem tenha adquirido
(talvez por doação) a quinta do Gualdim. a sete quilómetros de Santarém. que já
possuía em 1219. De facto, um outro documento do cartório de Avis
testemunha-nos a compra de uma herdade na Fonte da Pedra. contígua à quinta do
Gualdim, no ano de 1186. Pertencia a Nuno Guterres e são seus compradores
Gualdim (daí, o nome que se manteve) e sua mulher Ausenda Domingues». In
Maria Ângela V. Rocha Beirante, Santarém Medieval, Universidade Nova de Lisboa,
Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (35813), 1ª edição em Português,
Dezembro de 1980.
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