sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

Ao Rés da Terra. Poesia. António Borges Coelho. «Olha pela vidraça toma café música e a chuva que cai na praça»

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Asfalto
«[…]
«A cidade está deitada nas colinas
venho a olhá-la desde a Outra Banda
lá dentro há casas sem varanda
angustia o drama de lutas intestinas

O medo tem olhos virados em cada esquina
o desespero a cara destas ruas amarelas
com vendedores harmónica bombas de gasolina
e uma pensão Austrália escrita nas paredes amarelas

Apetece arrancar o asfalto
para apalpar a terra
Nem que estejas a mascar de fome
fala como quem come

Se te destapam a fraqueza
que morde na barriga
se te ouvem o dente
que falsamente rilha
ensaiam uma festa
poem-te uma cilha»


Café no Campo Grande
«A árvore acompanhada
o automóvel com gente
na almofada

Um homem está só

Olha pela vidraça
toma café
música e a chuva
que cai na praça

Está como um café
dentro da chávena das coisas

Rapariga alta caminhava
e pelas pernas novas
ventos ou lagartos
remoinhavam em secretas covas
baixando levantando as saias
os cabelos tirados dum ramo de maias
enquanto nas esquinas dos balcões
escarvavam rinchavam
ocultos garanhões»
Poemas de António Borges Coelho, in “Ao rés da terra

In Editorial Caminho, 2001-2002, ISBN 972-211-454-9.

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