«No século XVIII, Barbosa Machado organizou listas
gerais dos penitentes e relaxados nos autos-da-fé, celebrados pelas diferentes
Inquisições (malditas) do reino enquanto o
dominicano frei Pedro Monteiro publicava a sua Notícia Geral das Santas Inquisições Deste Reino e Suas Conquistas,
Ministros e Oficiais de Que cada Uma Se Compõem. No outro quadrante, o
das vítimas, destacam-se as Memórias
da Literatura Sagrada dos Judeus, de António Ribeiro dos Santos, os Cristãos-Novos e Cristãos-Velhos em
Portugal, do médico e filósofo Ribeiro Sanches, e o sucesso de Notícias Recônditas. Alguns autores
têm procurado desacreditar a sua veracidade, mas o esforço tem sido vão para lá
de correcções pontuais.
Só no século XIX deparamos com o primeiro trabalho
historiográfico de fôlego:
- a clássica História da Origem e do Estabelecimento da Inquisição em Portugal, de Alexandre Herculano.
Há que assinalar ainda a Memória sobre os Judeus em Portugal (1823), de Ferreira Gordo a recolha documental efectuada por António
Joaquim Moreira, recolha de que a sua História
dos Principais Actos e Procedimentos da Inquisição em Portugal nos dava
uma pálida imagem. Mas, no que ao avanço da investigação se refere, o trabalho maior
até agora desenvolvido deve-se aos historiadores da primeira metade do nosso
século, entre eles Joaquim Mendes dos Remédios Os Judeus Portugueses em
Amesterdão, ainda do século anterior, e Os Judeus em Portugal;
João Lúcio de Azevedo História dos Cristãos-Novos Portugueses,
e sobretudo António Baião antigo director do Arquivo Nacional, autor de
numerosos opúsculos e de obras fundamentais como A Inquisição em Portugal e
no Brasil, a Inquisição de Goa e Episódios Dramáticos da Inquisição
Portuguesa. Há que referenciar igualmente, embora não especificamente sobre
a Inquisição Portuguesa, a History of the Inquisition in Spain (1906-1908), de
Henry Charles Lea, a History of the Marranos (1932), de Cecil Roth, e a obra Los
Judíos en la España Moderna y Contemporânea (1960), de Julio.Caro Baroja.
Os anos 60 e 70 deste século ficaram marcados pela
síntese Inquisição e Cristãos-Novos, de António José Saraiva, e os rigorosos trabalhos
de pesquisa de I. S. Révah e muitos outros.
Nos dias de hoje assistimos em Portugal e no Brasil
a um interesse crescente pelo estudo do riquíssimo espólio do Inquisição
(maldita) portuguesa. Do esforço europeu voltado para o estudo das diferentes
inquisições à luz de moderna metodologia, salientamos os trabalhos do grupo de
investigadores que se reuniu em Setembro de 1978 em Cuenca, no I Symposíum Internacional sobre la Inquisición
Española, intervenções publicadas por Joaquin Perez Villonueva em La
Inquisición Española. Nueva Vision. Nuevos Horizontes, Madrid, 1980.
O estudo específico da Inquisição (maldita) de Évora está por fazer. Que saibamos,
até Túlio Espanca lhe dedicou um breve artigo em A Cidade de Évora Que caminho
seguir? Prosseguir no método de pesca à
linha, usando as palavras de António José Saraiva, ou seria possível
encontrar informações repetitivas, objectivamente mensuráveis, e fontes
documentais passíveis de uma abordagem totalizante? A existência, na sala dos
índices do Arquivo Nacional da Torre do Tombo, de verbetes, referentes a
todos os processos da Inquisição (maldita)
de Évora, com informações repetidas sobre cado preso, lançaram o autor destas
linhas na ideia de que era possível uma perspectiva totalizante de abordagem e
pelos caminhos objectivos abertos pelos métodos quantitativos.
O trabalho aqui está. Erguido o edifício quantitativo, completamos a
sua interpretação com informações recolhidas na leitura de cerca de um milhar
de processos das três Inquisições (malditas)
do reino em que se incluem todos os processos dos condenados à fogueira em Évora;
cerca de 15 000 páginas manuscritas (todas as páginas) dos 15 cadernos do
Promotor da Inquisição de Évora; livros de denúncias e de contas; livros,
regimentos, cartas, repertórios, relatórios do Conselho Geral; milhares de folhas
manuscritas e impressas do espólio António Joaquim Moreira, existente na Biblioteca
Nacional de Lisboa; documentos do Arquivo da Biblioteca Pública de Évora;
documentos da Biblioteca da Academia das Ciências de Lisboa». In
António Borges Coelho, Inquisição de Évora, dos Primórdios a 1668, volume 1,
Editorial Caminho, colecção Universitária, Instituto Português do Livro e da
Leitura, 1987.
continua
Cortesia Caminho/JDACT