segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Tópicos sobre a Prática Política dos Estudantes Republicanos (1890-1931). Limites e Condicionantes do Movimento Estudantil. Ana Caiado Boavida. «… ordem proferida por Guerra Junqueiro no comício promovido pelo Grupo Republicano de Estudos Sociais em 27 de Julho de 1897. Grupo que marca o início de uma nova fase na organização das forças juvenis do republicanismo»


Cortesia de wikipedia

Por terra, a túnica em pedaços,
agonizando a Pátria está.
Ó Mocidade, oiço os teus passos!...
Beija-a na fronte, ergue-a nos braços,
não morrerá!
(Guerra Junqueiro, in Finis Patríae, 1891)

«Num relance pelas movimentações estudantis que se desenham nas derradeiras três décadas de Oitocentos torna-se difícil dissociar as condicionantes políticas dos interesses especificamente académicos. À constituição, em 1871, da primeira e efémera Federação Académica de Lisboa não deve ter sido estranho o ideal federativo ‘proudhoniano’, expresso anteriormente numa proposta de Pacto Federal das Escolas do Reino de Portugal e Suas Dependências, proveniente de uma comissão a que pertenceu Jaime Batalha Reis.
Em 1880, aquando do tricentenário de Camões, alunos do Instituto Industrial e Comercial de Lisboa fundam a Associação Camoniana José Vitorino Damásio, local onde os intuitos beneficentes se mesclam com a apologética republicana. Quanto aos princípios que nortearam, a partir também de 1880, a organização da Associação Académica de Lisboa, cujos Estatutos datam de 1882, filiam-se numa intenção, relativamente lograda, de desenvolver a consciência corporativa entre estudantes de diversas escolas e graus de ensino, bem como de reivindicar os seus direitos. Um pouco mais tarde, em 1887, congregam-se os alunos da Academia de Coimbra numa Associação de existência duradoura, fenómeno justificável pelo particularismo caracterizador do pequeno universo escolar desta cidade.
Não percamos, contudo, o fio da meada. Falávamos da simbiose juventude/republicanismo, enquanto catalisadora de um processo de expansionismo ideológico. Entre os estratos mais dinâmicos e lúcidos da jovem burguesia frequentadora do meio académico é nítida a percepção, sobremaneira após o despoletar da crise de 1890, de que a questão ingente da necessidade de uma total remodelação do sistema educativo passa por um novo equacionamento dos dados políticos e institucionais, quiçá pela revolução armada. A derrota do 31 de Janeiro e o consequente agravamento de certas tensões latentes entre os principais obreiros do projecto republicano contribuíram, decisivamente, para ampliar a crença numa academia em que se julga ver consubstanciada a verdadeira alma e vitalidade nacionais.
Invocam-se actos de romântica bravura praticados desde logo em plena Restauração, continuados nas lutas peninsulares de 1808, confirmados nos combates em prol do liberalismo nos conturbados anos da guerra civil. Mas, para a sensibilidade epocal, em 1891, e mais do que nunca:
  • É doloríssima a crise que atravessamos. Depois da perda da honra e dos territórios, jaz o País adormecido, deixando tripudiar impunemente os parasitas. O povo, a eterna vítima dos impostos, dos monopólios e dos sindicatos, já não sabe para quem apelar. Na monarquia tudo corrupto, cínico, incapaz de um sacrifício que salve a Nação. No campo republicano, as facções a distanciarem os homens que deviam ter a compreensão do momento histórico e salvar o País, que tudo espera deles.
Que resta então? Resta acreditar na academia como outrora se acreditou em Nun'Álvares.
  • Ressuscitemos Nun'Álvares. Ergamos o seu vulto, quer nas escolas quer nos templos, foi a palavra de ordem proferida por Guerra Junqueiro no comício promovido pelo Grupo Republicano de Estudos Sociais em 27 de Julho de 1897. Grupo este que marca o início de uma nova fase na organização das forças juvenis do republicanismo.
Fundado em 1895 por um grupo de estudantes, o Grupo Republicano de Estudos Sociais desempenhou um papel relevante na propaganda anticlerical e antimonárquica, actuando quer através de conferências e comícios, quer no seio das instituições de ensino. Contou com a colaboração de figuras prestigiadas, como João Chagas, Teófilo Braga, Manuel de Arriaga. Anos mais tarde, mais precisamente em 1900, dá lugar à Liga Académica Republicana, a qual funcionou durante dois anos, reunindo-se os seus sócios nas instalações do periódico A Vanguarda, cuja direcção competia a Sebastião Magalhães Lima, incansável adepto da juventude, considerada, numa perspectiva organicista, como mítica força revitalizadora do tecido social. Magalhães Lima, aliás, foi um dos mais constantes colaboradores do jornal A Liberdade, porta-voz da Liga; este jornal orgulhava-se de uma plêiada de participantes verdadeiramente notável e que, por si só, expressa, com vigor, a importância atribuída à mocidade das escolas na estratégia política e no imaginário republicano; assim, e para além do já citado Magalhães Lima, faziam parte da lista de colaboradores d`A Liberdade: Agostinho Fortes, Brito Camacho, França Borges, Heliodoro Salgado, João Chagas, Sampaio Bruno, Manuel Coelho, Mayer Garção, Alexandre Braga, Guerra Junqueiro, Celestino de Almeida, Jacinto Nunes, entre outros». In Ana M. Caiado Boavida, Tópicos sobre a Prática Política dos Estudantes Republicanos (1890-1931), Limites e Condicionantes do Movimento Estudantil, Análise Social, vol. XIX, 1983.

Cortesia de Análise Social/JDACT