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Ao Longe
«(…) Ao
longe os montes têm neve ao sol,
Mas é
suave já o frio calmo
Que alisa
e agudece
Os dardos
do sol alto.
Hoje,
Neera, não nos escondamos,
Nada nos
falta, porque nada somos.
Não
esperamos nada
E temos
frio ao sol.
Mas tal
como é, gozemos o momento,
Solenes na
alegria levemente,
E
aguardando a morte
Como quem
a conhece».
Só Ter Flores
«Só ter
flores pela vista fora
Nas áleas
largas dos jardins exactos
Basta para
podermos
Achar a
vida leve.
De todo o
esforço seguremos quedas
As mãos,
brincando, para que nos não tome
Do pulso,
e nos arraste.
E vivamos
assim,
Buscando o
mínimo de dor ou gozo,
Bebendo a
goles os instantes frescos,
Translúcidos
como água
Em taças
detalhadas,
Da vida
pálida levando apenas
As rosas
breves, os sorrisos vagos,
E as
rápidas carícias
Dos
instantes volúveis.
Pouco tão
pouco pesará nos braços
Com que,
exilados das supernas luzes,
Escolhermos
do que fomos
O melhor
para lembrar
Quando,
acabados pelas Parcas, formos,
Vultos
solenes de repente antigos,
E cada vez
mais sombras,
Ao
encontro fatal
Do barco
escuro no soturno rio,
E os nove
abraços do horror estígio,
E o regaço
insaciável
Da pátria
de Plutão».
In
Fernando Pessoa, Obra Completa de Ricardo Reis, Tinta da China, 2016,
ISBN 978-989-671-345-4.
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