sábado, 15 de março de 2014

Infante Afonso Sanches. Senhor de Portalegre. «O objectivo estratégico do rei Dinis era, precisamente a fortaleza de Castelo de Vide, cujas estruturas recém-erguidas o monarca queria ver demolidas. De imediato o infante deu início à organização da defesa da praça-forte, preparando-a para o cerco que se avizinhava»

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A Herança d’O Bolonhês
«(…) Efectuar esse tipo de melhoramentos sem o consentimento do rei constituía, pois, um claro desafio e uma afronta à sua autoridade. Bastante mais difícil de perceber é se Afonso estava, ou não, a par dessa proibição, embora não tenhamos dúvidas de que mesmo que tivesse conhecimento dessas restrições, não seria isso que o iria impedir de concretizar essas mesmas obras e, assim, como sugere José Augusto Pizarro, de testar e desafiar, a autoridade do irmão. De acordo com Fernando Félix Lopes, é possível que o rei, com o objectivo de resolver o diferendo de forma pacífica, se tenha encontrado com o irmão por alturas de finais de 1280, quando estanciou nas localidades vizinhas de Estremoz, de Elvas, do Alandroal e da Juromenha. Porém, se isso realmente aconteceu, de nada serviu e ambos devem ter-se afastado ainda mais após esse encontro. Terá sido, pois, sem grande surpresa que o infante recebeu a notícia, talvez nos inícios de Março de 1281, de que o rei se preparava para ao comando da hoste régia, avançar em direcção aos seus domínios. O objectivo estratégico do rei Dinis era, precisamente a fortaleza de Castelo de Vide, cujas estruturas recém-erguidas o monarca queria ver demolidas. De imediato o infante deu início à organização da defesa da praça-forte, preparando-a para o cerco que se avizinhava, começando, naturalmente, por convocar alguns dos seus vassalos e respectivas mesnadas, para além de muitos outros combatentes mobilizados na região do seu senhorio. Entre os que então se integraram na defesa da praça-forte é, possível que se encontrassem o alferes Gomes Pais, Vasco Peres Farinha, Rui Pais Bugalho, Pedro Esteves Tavares, Martim Podentes, Estevão Gonçalves Safanhão, Rui Gil e Martim Rodrigues Babilão, Estêvão Peres Vinagre e Gomes Lourenço Cerveira, algumas das figuras presentes no acordo de pazes firmado na sequência do final do cerco.
Ainda que as fontes nada adiantem a esse respeito, parece-nos possível que, graças a esses contributos, Afonso tivesse conseguido reunir largas centenas de combatentes, entre cavaleiros, peões e, certamente, alguns besteiros. O infante ter-se-á também assegurado da existência no interior da fortaleza de armamento e de munições suficientes (nomeadamente virotões de besta), mas também de mantimentos, já que o acesso à água potável estava, à partida, garantido pela existência de um poço no interior do castelo, condições sem as quais não seria possível suportar um cerco prolongado. Com um número substancial de combatentes, com armas, munições, víveres e água em quantidades suficientes, com a protecção de estruturas fixas de defesa recentemente erguidas e, como tal, em excelente estado de conservação e bem preparadas para enfrentar o assédio por parte das forças do rei, Afonso tinha bons motivos para confiar num desfecho favorável. Claro que o infante não esperava conseguir obter uma vitória militar expressiva sobre a hoste régia, mas decerto que lá bem no seu íntimo, não deixou nunca de acalentar a esperança de conseguir forçar Dinis a um cerco prolongado e penoso, ao ponto de se ver obrigado a desistir das suas intenções. Um outro motivo para que o infante se sentisse confiante num desfecho favorável era o facto de saber que o rei se debatia com sérias dificuldades no tocante à mobilização da hoste régia. De facto, o cerco tem lugar numa altura profundamente marcada pelas exigências da nobreza por remunerações mais avultadas e pela recusa em cumprir os seus deveres militares de natureza feudo-vassálica. E de facto, a avaliar pelas fontes disponíveis, o exército então reunido sobressaía mais pelas ausências que pelas presenças, designadamente ao nível dos ricos-homens detentores de tenências, o que não invalida que o rei tivesse conseguido a colaboração de algumas outras mesnadas nobres. Na realidade, de entre as forças que integravam a hoste régia, a única presença documentalmente comprovada neste cerco é a das milícias concelhias de Lisboa, a que se terão também juntado, supomos, as de Santarém, localidade onde o monarca se encontrava antes de partir em direcção ao Alentejo e onde parece ter agrupado os seus efectivos. Mesmo assim e só com base nestes dois apoios, o rei terá conseguido reunir, no mínimo, entre 1500 e 2000 homens, o que talvez tivesse permitido mobilizar um total de perto de três milhares de combatentes. Trata-se de um número ainda assim modesto, mas que pode também ser o resultado, por um lado, de algum excesso de confiança por parte de Dinis, que pensou que rápida e facilmente conseguiria submeter o irmão, e, por outro, de alguma contenção no momento da mobilização, de modo a afastar os inevitáveis problemas, mormente os que advinham das dificuldades de abastecimento, com que se debatiam os exércitos de grandes dimensões». In Miguel Gomes Martins, Guerreiros Medievais Portugueses, A Esfera dos Livros, Lisboa, 2013, ISBN 978-989-626-486-4.

Cortesia Esfera dos Livros/JDACT