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«Tendo em conta o
ambiente geral da igreja ocidental, não admira que estes milites Christi tenham
recebido desde logo o apoio das principais dignidades eclesiásticas
peninsulares, nomeadamente dos arcebispos de Braga, Toledo e Santiago. Também o
cardeal Jacinto, legado da Santa Sé na Península Ibérica, não tardou a aprovar
a nova instituição religioso-militar, o mesmo acontecendo com o papa Alexandre
II que, em 1175, a confirmou e aprovou a sua regra, elaborada pelo cardeal
Alberto de Mora. Nesta altura a Ordem contaria já entre os membros não só
cavaleiros, mas também clérigos. A entrada destes na milícia ter-se-á dado
quando os primeiros, devido a necessidades de ordem espiritual, se uniram aos
cónegos regrantes de Santo Agostinho, sediados no mosteiro de Loio, tendo
adaptado a Regra destes ao seu modo de vida, ao mesmo tempo que usufruíam do
mesmo estatuto que os religiosos no seio da sua ordem.
Os santiaguistas
depressa marcaram presença nos outros reinos peninsulares: logo em Setembro de
1171 recebem do rei de Castela a sua primeira doação (o castelo de Aurelia) e
em 1172 entram no território português. Quando, em 1174, os muçulmanos
retomaram Cáceres, os cavaleiros refugiaram-se em Uclés, que lhes fora doada
por Afonso VIII de Castela. É aí que se vai estabelecer o seu priorado, a
partir do qual coordenaram a sua participação na Reconquista. Simultaneamente, centralizaram
no convento que aí estabeleceram uma política senhorial que se revestiu de
enorme êxito, materializada nos séculos XII e XIII na formação de um extenso
património territorial de tipo senhorial.
Em 1180 o prestígio
alcançado pela Ordem de Santiago era já de tal forma notório que o soberano de
um dos estados cruzados do Médio Oriente, o de Antioquia, convidou o mestre
espatário para estabelecer um convento nesse território, prometendo-lhe para o
efeito várias vilas e castelos. Tal estabelecimento, que visava colmatar a
saída dos hospitalários da região, provavelmente nunca se concretizou.
Implantação das Ordens em território português
Está documentada a
presença da Ordem do Templo em Portugal desde 1128, ou seja, menos de uma
década após a sua fundação em Jerusalém. Nessa data, D. Teresa doa aos
templários o castelo de Soure, doação que, por um lado, se deve entender no
contexto da vinda de Hugo de Payens à Europa, a fim de obter no continente os
apoios necessários à continuação da sua tarefa na Palestina, e da sua participação
no Concílio de Troyes, e, por outro, se enquadra na difícil situação militar em
que se encontravam as hostes cristãs situadas no vale do Mondego, a braços com
um novo avanço muçulmano.
Conforme já foi
devidamente assinalado, esta doação é tanto mais importante quanto o seu
objecto era um território parcialmente destruído e despovoado, com poucas
estruturas defensivas.
Até 1143-1144, altura em
que defendem Soure de mais uma incursão muçulmana, nada se sabe sobre a
presença dos templários em território nacional. Pouco depois (1145) a Ordem do
Templo recebe alguns castelos na região transmontana (Longroiva, Penas Roias e
Mogadouro), que viria a entregar à coroa no final do século XII, em troca de
Idanha-a-Velha e da herdade da Açafa. Em 1147 os templários participam, ao lado
de Afonso Henriques, na conquista de Lisboa, tendo o monarca, como recompensa, doado
aos cavaleiros os direitos eclesiásticos de Santarém (o que, aliás, originou
uma longa e acesa disputa com o bispo de Lisboa, Gilberto de Hastings). Em 1169
Afonso Henriques faz uma doação da maior importância à Ordem do Templo, tanto
para a monarquia como para os cavaleiros: entrega-lhes a terça parte de todo o
território que viesse a conquistar, desde que as rendas que os templários nele
obtivessem revertessem a favor da luta contra os muçulmanos, ao serviço da
própria monarquia.
Tendo em atenção os documentos que acabámos de enunciar, caberá então
perguntar qual terá sido o papel da Ordem do Templo no processo que levou
Afonso Henriques ao trono, ou melhor, no processo de formação de um reino
independente. À partida somos levada a pensar que até meados do século XII a
participação dos templários, enquanto instituição, na construção política das
monarquias ocidentais (e concretamente na Península Ibérica) foi bastante
reduzida, até porque a sua actuação se concentrava nos estados fora do Território.
Mas além do diploma de 1169, e que contém de uma forma explícita o serviço ao
rei a que os templários se obrigavam, outros há que atestam uma relação próxima
entre a jovem monarquia e a Ordem. Não terá sido por acaso que em 1148 numa das
suas viagens a Roma, em missão diplomática ao serviço de Afonso Henriques, João
Peculiar, arcebispo de Braga, se fez acompanhar de um cavaleiro templário e de
um monge de Santa Cruz. Seria interessante saber até que ponto o prestígio dos
Cavaleiros do Templo junto da Santa Sé foi importante para o reconhecimento,
pelo Papa, do reino português». In
Maria Cristina A. Cunha, Estudos sobre a Ordem de Avis, séculos XII-XV,
Faculdade de Letras, Biblioteca Digital, Porto, 2009.
continua
Cortesia da Faculdade de Letras do Porto/JDACT