segunda-feira, 2 de julho de 2012

O Amor de Camilo Pessanha. António Osório. «… há um elemento novo na que presumo ser essa segunda carta - Camilo refere ao amigo que Ana ‘não podia aceitar a minha proposta [...] e que eu não pudesse ter por ela uma amizade como pelo Alberto Osório ou pelos meus irmãos’»



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Canção da Partida
[…]
quem vai embarcar, que vai degredado,
as penas do amor não queria levar…
Marujos, erguei o cofre pesado,
lançai-o ao mar

E hei-de mercar um fecho de prata.
O meu coração é o cofre selado.
A sete chaves: tem dentro uma carta…
- A última, de antes do teu noivado.
[…]
Camilo Pessanha

A declaração de amor e a resposta
«Perante a ’restituição’ da missiva de Ana, como explicar a carta, infelizmente sem data, de Pessanha para Alberto Osório de Castro, publicada por Maria José de Lancastre, e na qual se lê:
  • Devolvo-lhe a carta da Sra. D. Ana [...]. Eu tinha, desde a minha estada em Mangualde, além da minha amizade por toda a sua família, uma grande afeição pela Sra. D. Ana, que ainda conservo [...]. A Sra. D. Ana respondeu-me que não podia aceitar a minha proposta e [lacuna] que eu não pudesse ter por ela, uma amizade como pelo Alberto Osório ou pelos meus irmãos.
Suponho que além da carta de Ana de Castro Osório aqui publicada, houve outra para Camilo, na qual é reiterada a posição que conhecemos. Seria aquela, entretanto perdida, em que responde a segunda do poera e na qual ele lhe ‘restitui’, a missiva negativa. Atormentada com o desgosto que lhe causara, Ana não deixaria de responder a essa carta, além do mais por dever de cortesia, e na qual repetiu a dolorosa impossibilidade, em que de facto se encontrava, de aceitar ser sua mulher (‘que me alegraria se pudesse responder-lhe de outra maneira’). Em suma, Camilo ‘restitui’, a primeira carta à própria signatária; e ‘devolve’ a Alberto a segunda. Parece ser o mais provável. Além disso, há um elemento novo na que presumo ser essa segunda carta - Camilo refere ao amigo que Ana ‘não podia aceitar a minha proposta [...] e que eu não pudesse ter por ela uma amizade como pelo Alberto Osório ou pelos meus irmãos’. A última menção, por mim sublinhada, não consta no escrito aqui publicado, o que parece tornar crível a existência de outro, posterior, em resposta ao segundo de Camilo.

Uma coisa é certa: a correspondência não era conhecida na família de Ana. Não sei quando João de Castro Osório e José Osório de Oliveira, seus filhos, souberam dela. Os primos mais chegados, António, Henrique, Jerónimo e meu pai, Miguel, de nada suspeitavam; nem eu próprio, que fui um dos dois testamenteiros de João de Castro Osório. Era destino destas cartas, de todas, e não apenas a de Ana, ficarem, durante mais de um século, fechadas ‘a sete chaves’, como na “Canção da Partida”». In António Osório, O Amor de Camilo Pessanha, edições ELO, obra apoiada pela Fundação Oriente, colecção de Poesia e Ensaio, Linha de Água, 2005, ISBN 972-8753-43-8.

Cortesia da F. Oriente/Linha de Água/JDACT