sexta-feira, 27 de julho de 2012

Leituras. A História Mítica da Cultura Portuguesa. Dalila Pereira Costa. «Deste modo, em A Força do Mundo e, depois, em 1976, 1977 e 1978, datas das publicações dos seus textos sobre a saudade, em Introdução à Saudade, antologia editada pelo autor em colaboração com Pinharanda Gomes»


Porto
(1918-2012)
Cortesia de wikipedia e jdact

«Autêntico mito vivo da filosofia portuguesa, autora de uma das mais impressionantes obras emergidas a partir da década de 70, desenvolvendo uma reflexão poético-filosófica de carácter intensamente lírico e espiritualizante, numa linha de continuidade com as obras dos seus mestres portuenses Teixeira de Pascoais e Leonardo Coimbra, criadora de um auréola de suspensivo enigma em torno da sua escrita num barroquismo de linguagem que, habitualmente, envolve e prende a consciência do leitor numa bruma conceptual misteriosa, elevando-o a alturas celestiais, Dalila Pereira é, hoje, à entrada do século XXI, após a morte de Agostinho da Silva, Natália Correia e António Quadros, e a deriva radical de António Telmo para o esoterismo puro, a grande representante da tradição espiritualista e providencialista do pensamento português. Estamos certos de que a sua obra marcará abundantes investigações filosóficas ao longo do século XXI como Sampaio Bruno tem marcado fortemente uma específica linha da cultura portuguesa ao longo do século XX.
Possuindo traços teóricos comuns com a filosofia do último António Quadros (das décadas de 80 e 90), a obra de Dalila Pereira distingue-se da filosofia deste autor, não no fundo matricial de levantamento dos “arcânos” do pensamento português (filiação mediterrânica e atlântica da herança religiosa e espiritual de povos megalíticos, ‘franciscanismo’ espiritual da teoria ‘joaquimita’ da Terceira Idade do Mundo, teses ‘templaristas’ da escolha divina de Portugal como país eleito, teses proféticas de padre António Vieira, Bandarra e Pessoa sobre o V Império, tese ‘pascoalina’ da saudade como máxima expressão do sentimento, da história e do pensamento portugueses), mas na sua vivência e expressão estilística, isto é, na expressão mística e espiritual subjacente ao conteúdo dos seus livros, muito diferente dos parágrafos paciente e explicativamente racionais de Portugal. Razão e Mistério. Diferentemente, os livros de Dalila Pereira são intuitivamente sentidos e apreendidos através de uma comunidade espiritual espontaneamente criada entre a autora e o leitor, que, comungando do seu conteúdo, sente-se partilhar de uma vasta teia de conceitos expressos poeticamente, ora em parágrafos densos e reflexivos, ora leves e ascéticos. Assim, uns livros mais historicista, outros mais espiritualizante, a verdade é que não existe evolução no pensamento de Dalila, que permanecerá fiel às intuições expressas num dos seus primeiros livros, A Força do Mundo, de 1972, com a autora perfazendo já 53 anos:

Para além de todos os sistemas filosóficos que se opõem, o saber místico é, através das idades, um vasto e constante desenvolvimento duma só verdade: a verdade que poderá ser atingida apenas ‘através duma experiência imediata, como a que a mística concede’. Chegada tarde à autoria filosófica, depois de uma prolongada paragem após a conclusão do curso de Histórico-Filosóficas em Coimbra, e de uma permanência na Bélgica e no Brasil, o seu primeiro texto é justamente publicado no estrangeiro, na revista Esprit, em 1970. Porventura devido à sua ausência no estrangeiro, a autora escapou tanto às inúmeras polémicas nacionalistas e políticas que envolveram o grupo da “Filosofia Portuguesa” ao longo da década de 1960, como à padronização do cânone poético erigido em torno da obra de Fernando Pessoa, permitindo-se, depois de Agostinho da Silva, este segundo uma orientação mais mítica, desvelar uma outra faceta de Pessoa, a esotérica. Deste modo, em A Força do Mundo e, depois, em 1976, 1977 e 1978, datas das publicações dos seus textos sobre a saudade, em Introdução à Saudade, antologia editada pelo autor em colaboração com Pinharanda Gomes, A Nova Atlântida e A Nau e o Graal, respectivamente, a autora desvela-nos a história mítica portuguesa num estilo poético-profético fronteiro ao estilo das conferências de Teixeira de Pascoais sobre a “raça lusíada” e a “saudade” publicadas na “Renascença Portuguesa”, sessenta anos antes, intertextual e historicamente, o leitor sente-se projectado para a segunda década do século XX, como se Pascoais tivesse ressuscitado e usasse para efeitos de publicação o pseudónimo de “Dalila Pereira da Costa”. 


Referimo-nos às conferências de Pascoais como O Espírito Lusitano ou o Saudosismo (1912), A Era Lusíada (1913) e o Génio Português – Na sua Expressão Filosófica, Poética e Religiosa (1913). Não apenas o estilo poético-profético é o mesmo, como o envolvimento ideológico profundamente patriótico é exactamente o mesmo, como, igualmente, a selecção temática e o desenrolamento histórico são os mesmos, com o acrescentamento, por parte de Dalila Pereira, da herança mitológica pré-ariana da cultura portuguesa, que Pascoais não refere. Não admira, assim, que a autora tanto se considere herdeira do espírito da Renascença Portuguesa quanto aceite a existência de um fillum mental unindo os dois grandes autores do Porto da primeira metade do século XX, Teixeira de Pascoais e Leonardo Coimbra, à sua própria obra enquanto sintoma de renascimento espiritual de Portugal neste século, ainda que, modestamente, não ser digna dessa herança». In Dalila Pereira da Costa, A História Mítica da Cultura Portuguesa, Wikipedia.

continua
Cortesia de Wikipedia/JDACT