domingo, 3 de janeiro de 2016

Duas Estratégias. D. João II vs Colombo. José M. Garcia. «E anunciou ao próprio sereníssimo rei como navegara para além do já navegado 600 (sic) léguas, quer dizer,450 ao sul e 250 ao norte, até um promontório por ele chamado cabo de Boa Esperança, que supomos em Agesimba»

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Sobre a negação do apoio de João II ao projecto de Colombo
«(…) De acordo com o que Colombo escreveu no seu diário no dia 9 de Março de 1493 João II recebeu-o bem mas que entendia que en la capitulaçion que havia entre los reys e el que aquella conquista le pertencia. A lo qual respondió el almirante que no avia visto la capitulaçion ni sabia outra cosa, sino que los reys le avían mandado que no fuesse a la Mina ni en toda Guinea. Fernando Colombo e Bartolomeu Las Casas souberam que Colombo não foi apoiado por João II alegando que lhe apresentara exigências excessivas, quer no pedido do financiamento da coroa para a realização da sua viagem, quer na solicitação de grandes honrarias como recompensa do esperado sucesso do seu empreendimento. Temos de reconhecer que as promessas de doacção das terras descobertas dadas por João II estavam longe de poderem corresponder às exigências feitas por Colombo aos Reis Católicos em Santa Fé em 1492. Na conjuntura em que João II recusou apoio a Colombo autorizou a realização de uma viagem para ocidente a Fernão Domingues Arco, morador na ilha da Madeira, prometendo-lhe a 30 de Junho de 1484 a doacção de uma ilha que ora vai buscar, isto é, estaria na iminência de iniciar uma viagem de descobrimento. Colombo referiu-se a essa intenção de descobrimento no seu diário da primeira viagem no dia 9 de Agosto de 1492 ao escrever que se acuerda que estando en Portugal el ano de 1484 vino uno de la madera al rey a le pedir una caravela para ir a esta tierra que via, el qual jurava que cada año la via y siempre de una manera.
Foi contra o apoio dado pelo rei a Fernão Domingues Arco que Fernando Colombo e Las Casas se referiram ao indicarem que Colombo se teria mostrado muito irritado com tal atitude, pois alegaram que ele teria mandado fazer uma exploração secreta do Atlântico para encontrar terras a ocidente que o genovês se tinha proposto encontrar. Ora, nem a realização da tal viagem está atestada como tendo sido realizada nem o está a irritação de Colombo, como o revela a circunstância de antes de 20 de Março de 1488 ter pedido a João II um salvo-conduto para regressar a Portugal, o qual lhe foi concedido nesta data com palavras de muito apreço. Depois de Colombo ter apresentado o seu projecto descobridor aos Reis Católicos, que também o recusaram, ele talvez voltasse a ter esperança em 1488 de que João II reconsiderasse a sua posição anterior e ainda pudesse alcançar êxito em Portugal no empreendimento com que sonhava, depois de ter sabido de outros malogros portugueses. Com efeito o monarca português confrontara-se em 1486 com o insucesso da segunda viagem de Diogo Cão, que não descobrira a almejada passagem para o Oceano Índico, e em Março de 1487 com a não realização da planeada viagem de Dulmo para ocidente. Por outro lado, Colombo sabia que em 1488 ainda não havia notícia dos resultados da viagem de Bartolomeu Dias iniciada em Agosto de 1487, pelo que foi neste contexto pedir autorização a João II para regressar a Portugal, acto que o rei português autorizou. A possibilidade de Colombo ter voltado a Portugal na sequência desta autorização é de aceitar tendo em conta a verosimilhança de ser da sua autoria o seguinte texto:

«Apóstila de Colombo sobre Bartolomeu Dias no seu exemplar da Imago mundi
Nota quod hoc anno de 88, in mense decembri apulit in Ulixbona Bartholomeus Didacus, capitaneus trium carauelarum, quem miserat serenissimus rex Portugalie in Guinea ad temtandum terram. […]»

Tradução portuguesa
«Nota que neste ano de 88, no mês de dezembro, atracou em Lisboa Bartolomeu Dias, capitão de três caravelas, que o sereníssimo rei de Portugal tinha mandado à Guiné a tentear a terra. E anunciou ao próprio sereníssimo rei como navegara para além do já navegado 600 (sic) léguas, quer dizer,450 ao sul e 250 ao norte, até um promontório por ele chamado cabo de Boa Esperança, que supomos em Agesimba. E achou que neste lugar distava pelo astrolábio da linha equinocial 45 graus; o lugar mais remoto dista de Lisboa 3100 léguas. Desenhou esta viagem e descreveu-a légua a légua em uma carta de marear para a apresentar diante dos olhos do sereníssimo rei. Em tudo estive presente. Isto concorda com as palavras de Marino, que Ptolomeu emenda acerca da viagem aos Garamantes, o qual disse que percorreram para além da equinocial 27500 estádios, o que Ptolomeu impugna e emenda».

In José Manuel Garcia, D. João II vs Colombo, Duas Estratégias divergentes na busca das Índias, Quidnovi, 2012, Vila do Conde, ISBN 978-989-554-912-2.

Cortesia de Quidnovi/JDACT