sexta-feira, 6 de maio de 2016

Na Esfera do Mundo. António Borges Coelho. «Francisco Albuquerque e Nicolau Coelho partiram para Lisboa a 31 de Janeiro de 1504. Nunca mais se soube deles. Afonso Albuquerque chegou a Lisboa em 23 de Agosto do mesmo ano».

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Guerra marítima, comercial e ideológica
«(…) Vasco da Gama assentou duradouramente o preço da pimenta e carregou em Cochim 30 000 quintais. No regresso, no espólio de duas naus que assaltaram, encontraram um ídolo de trinta arráteis de peso. Tinha um rubi no peito, as vestes eram de ouro e pedrarias e nos olhos brilhavam duas esmeraldas.

Cochim, o cais da pimenta
A quinta armada, a de 1503, teve a direcção dos primos Francisco e Afonso Albuquerque. António de Saldanha, o primeiro europeu a subir à Mesa do Cabo da Boa Esperança, seguiu-os mais tarde. No grupo de Afonso, era capitão o geógrafo, navegador e militar Duarte Pacheco Pereira que integrara a armada de Cabral. Nicolau Coelho comandava uma das naus de Francisco Albuquerque. Na frota do Saldanha, um dos capitães e mestre, por ser mui usado no mar, era um Diogo Setúbal. Encontraram o reino de Cochim tomado por Calecut e os seus aliados. O rei recusara-se, apesar dos protestos do seu povo, a entregar os portugueses da feitoria. A artilharia das naus portuguesas e dos batéis desalojou os militares de Calecute e trouxe o rei de volta à cidade. Não havia quem trouxesse pimenta nem os mercadores se atreviam a ir buscá-la. Foram lá os capitães. Afonso Albuquerque carregou-a em Coulão onde a rainha tinha uma guarda de mulheres frecheiras. Enquanto uma nau carregava, as outras duas obrigavam os navios que passavam a dar obediência a Afonso Albuquerque que se intitulava capitão-mor do rei de Portugal. Só roubavam as naus dos mouros do Mar Vermelho.
Francisco Albuquerque e Nicolau Coelho partiram para Lisboa a 31 de Janeiro de 1504. Nunca mais se soube deles. Afonso Albuquerque chegou a Lisboa em 23 de Agosto do mesmo ano. Além da pimenta, trazia quatrocentos arráteis de aljôfar, quarenta pérolas, dois cavalos, um árabe e outro persa, e o veneziano micer Bendjuto Dalban, casado com uma javanesa. Duarte Pacheco Pereira ficou na Índia com a sua nau e duas caravelas. Ao todo, uns 100 combatentes: o alcaide-mor e feitor de Cochim Diogo Fernandes Correia; Pero Rafael e Diogo Pires, capitães das duas caravelas; o jovem fidalgo Simão Andrade: escrivães; um Inhigo de Portugalete, um calafate biscainho, um carpinteiro, um Jorge Grego, o Diogo canário, o João de Vila do Conde, o João e o Afonso do Porto, o Bartolomeu, o Álvaro de Óbidos, o Diogo de Coruche, o Paulo genovês, frei Gastão, um barbeiro, um mercador castelhano, um cerieiro, um bombardeiro, um criado da Infante, um criado do bispo da Guarda. o Jorge do Porto, o Maçarelos, o João de Leça, o João de Santarém, o genovês Baptista, os bombardeiros Isbráo de Holanda e Pero Alemão, o João de Caminha, o Diogo de Bragança, o Luís de Maçãs, o Cardoso, o Leitão, o castelhano Francisco, o Fernando do Mestre, os bombardeiros Ausbrote, Miquel e Afonso. Era gente comum de diferentes pontos do país, particularmente do litoral, e castelhanos, genoveses, um biscainho, um grego, um canário e bombardeiros alemães.
Duarte Pacheco Pereira veio com a sua nau e com a caravela de Pero Rafael para a ponta de Cananor. A caravela mandava arribar as naus: donde eram, para onde iam, o que levavam. Se achavam pimenta, tomavam-na. O rei de Cochim estava triste. Achava pequena a armada de Duarte Pacheco, tanto mais que o rei de Calecut trazia, ao seu serviço, dois milaneses que fundiam artilharia de bronze. Calecut e os seus aliados desencadearam cinco assaltos à ilha e à cidade de Cochim. Fracassaram uma e outra vez. No quinto assalto participou o próprio rei de Calecut. Ia num andor, coberto por um sombreiro. Já se retirava quando Pero Rafael disparou uma bombarda grossa. O tiro matou treze homens do Samorim, incluído o que lhe dava o bétel. O projéctil passou a rasar tão perto que o rei, maculado de sangue, baqueou do andor». In António Borges Coelho, Na Esfera do Mundo, Editorial Caminho, 2013, ISBN 978-972-212-642-7.

Cortesia Caminho/JDACT