domingo, 8 de maio de 2016

O Falar de Marvão. Teresa Simão. «Por influência do que aí se faz e em parceria, a partir de 2006, Marvão passou também a festejar a sua fundação, no primeiro fim-de-semana de Outubro»


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Caracterização
«A variação de uma 1íngua está intimamente associada ao percurso histórico-social dos seus falantes e das comunidades em que estes se inserem. Assim, considerámos pertinente a apresentação de alguns aspectos referentes à história, à demografia e à etnografia do concelho em estudo. No que diz respeito à origem do topónimo Marvão, muito se tem reflectido e teorizado, tendo surgido, até à data, diversas explicações, que a seguir se apresentam.
Segundo o padre Diogo Pereira Sotto Maior, em 1619,no Tratado da Cidade de Portalegre, Marvão terá sido fundado pelos moradores de Medóbriga e não por mouros. A este propósito, refere o autor duas lendas, encontrando-se numa delas uma explicação para a denominação Marvão: quando Medóbriga foi conquistada e destruída por Cássio Longino, a sua população viu-se forçada a fugir e a refugiar-se nos rochedos onde actualmente se situa a sede do concelho. Ao subirem tão íngreme encosta, os habitantes em fuga iam desfalecendo e caindo, dizendo uns para os outros: maluão, maluão; e daqui mudado o l em r se chamou Maruão....
Segundo um documento manuscrito do século XVIII, intitulado Anteguidades e Alguas Notabilidades da Villa de Castelo de Vide e seu Termo, conta-se que um capitão, chamado Capitam Bidé, ao cercar a cidade de Arménia, que na altura se chamava Medrobigua, os seus habitantes pediram-lhe três dias para tomar uma decisão e, à traição, de noite, dirigiram-se ao monte em que hoje se situa Marvão. Quando o capitão soube da fuga para tal sítio, simplesmente respondeu: ... deixaios ir, que mal vão; querem dizer os traditores, que daqui se corrompeo a palavra; donde agora se vem a chamar a Villa de Marvão, que esta naquelle mesmo sitio, e se dis ser da propria gente, que fugio edificada. Ainda que apresente esta versão, o autor deste manuscrito não concorda com ela. No seu ponto de vista, ... não sedevia desta palavra tomar o nome a villa de Marvão; e paresse que o devia tomar por currupção do nome da Cidade desamparada, que se chamava Mirobriga; ou Medobriga...
Possidónio Laranjo Coelho veio, em 1982, apresentar uma explicação muito semelhante às referidas anteriormente, marcada também por um valor pejorativo. Segundo este autor, no seio do povo surgiu a justificação de que o nome Marvão deriva de Mal Vão, expressão proferida pelos habitantes do município quando se referiam aos prisioneiros de guerra e militares que para lá iam desterrados, já que o monarca Fernando I declarou a vila couto de homisiados, para assim garantir mais facilmente a defesa da fronteira e o povoamento durante o longo período de guerra com Castela.
Augusto Pinho Leal e, mais tarde, também Possidónio Laranjo Coelhos (baseado nele) apresentam uma teoria diferente, defendendo que o topónimo tem a sua origem no nome de um cavaleiro do Islão, senhor de Coimbra, Ibn Maruan que, em 776, se refugiara no morro onde actualmente se situa a sede do concelho. Adel Sidarus defende também que o topónimo Marvão terá origem mourisca e explica-a fundamentadamente. No século X, o historiador cordovês Isa Ibn Ahmad ar-Rázi, ao relatar as façanhas de Ibn Maruán e a sua dinastia, já se reporta a este local como ...o Monte de Amaia, conhecido hoje por Amaia de Ibn Maruán.... Nesse mesmo texto, surgem também outras designações, tais como; fortaleza de Amaia, A sua [de Ibn Mauan] fortaleza de Amaia, Fortaleza de Amaia-o-Monte, deixando o documento perceber que, de todas, a denominação que acabou por prevalecer foi a de Amaia de Ibn Maruán, designação que evidencia o nome do seu fundador em detrimento da sua importância enquanto ponto estratégico-militar. Ainda de acordo com Adel Sidarus, o fundador de Marvão, Ibn Maruán, terá sido um nobre de Mérida que se destacou no último quartel do século IX ... como rebelde e caudilho muladi (autóctone islamizado). e, juntamente com a sua família, liderou a contestação contra os emires de Córdoba. Depois de se ter refugiado na fortaleza de Ammaia e de ter fugido para o norte de Portugal, regressou a Badajoz e, a partir daí, tentou reconquistar o seu poderio político-militar. Assim, foi considerado o fundador de Badajoz (em 875 d. C.) e também de Marvão (em 877 d. C.). Desde 1998 que em Badajoz se comemora a sua fundação, Almossassa, por Ibn Maruán. Por influência do que aí se faz e em parceria, a partir de 2006, Marvão passou também a festejar a sua fundação, no primeiro fim-de-semana de Outubro». In Teresa Simão, O Falar de Marvão, Edições Colibri, Lisboa, 2011, ISBN 978-989-689-107-7.

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