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Canto Primeiro
O Regresso do Duque
«(…)
VIII
Um sigillo amoroso,
puro, ingénuo,
Abriga o joven duque :
em terra estranha
O coração deixara. Á
pátria sua
Trazia da saudade o
acerbo espinho.
Do feliz vencedor da
bella Alhambra
Á corte já o liga um
terno laço;
Lá fora, que entre os
eccos das victorias,
D’aquella corte austera
entre os cilícios,
Ante o pérfido horror de
Torquemada,
Solemne juramento
proferira
D’amôr o mais leal,
eterno e puro:
Lá em lettras de fogo um sim ficara,
Ligações e promessas mil
incógnitas;
O mais firme penhor d’um
cavalleiro,
D’um prócere a palavra,
o juramento.
IX
De luzido cortejo
acompanhado
Á corte portugueza se
approxima
E como sobre o ar vêem
juntar-se
As nuvens conglobadas,
alterosas,
De rutilante brilho e
côr variada.
De pura franja orladas d’ouro
fino,
No descahir do sol ao
turvo pelago;
Como sobre a montanha de
granito,
No dorso de gigante, se
approximam
Ante o astro do dia
coruscantes
De gelo outras
montanhas, (jue se juntam
Com o immenso fragor de
mil bombardas,
Aos alcantis, aos mattos
sobrepondo
Uma enorme crusta, que
rebrilha,
E que ao longe reflecte
e nos deslumbra;
Assim ao reunir-se o
duque e o princípe
Da illustre fidalguia
rodeados,
Dos guerreiros heroes
das luctas d’África,
Ao povo deslumbrado, á
lusa gente.
Um tão grande explendor
e régio brilho
Das mais sublimes pompas
ostentaram,
De tão ricos thesouros,
como nunca
Eguaes se tinham visto em Lusitânia!
X
Mas serena a expansão do
immenso jubilo,
As regias saudações, o
grão monarcha
Perante a egrégia còrle
assim dizia:
Emfim ó nohre duque á
excelsa pátria
Restituido sois:
encontrar vinde
Com o meu o amor da lusa
prole,
A benção da nobreza, e d’este
povo
A muda sympathia, o doce
affecto,
Que a vossa desventura
despertara.
Queiraes vós esquecer
tanta amargura,
Do exilio o duro pão,
acerbas magoas.
Possaes aqui gosar na
lusa terra
O magico esplendor do
heroismo.
Da gloria, que circumda
a monarchia.
Que seja pois o teu
regresso ó duque
O elo, que findar venha
a discórdia,
Que ao rei unindo o povo
e os fidalgos,
A concórdia transmitta a
longos evos;
Oh! Vinde pois; talvez
que o sceptro fulgido
A casa de Bragança um
dia empunhe
E á c’ròa portugueza
novo brilho
Vossos filhos darão ... O
rei não ponde
Commovido findar; com
doce extremo
Com jubilo infinito
ergueu nos braços
O joven, que a seus pés
enternecido
Se curvara vertendo doces lagrimas».
In José Carlos Gouvêa, A Duquesa
de Bragança. Poema em Oito Cantos, Tipographia e Stereotypia Moderna, Lisboa,
1898.