sábado, 29 de setembro de 2018

As Lutas Estudantis Contra a Ditadura Militar. 1926-1932. Cristina Faria. «A Ditadura era, pois, o garante da ordem e do equilíbrio. Reposta a disciplina nas ruas, acautelado o equilíbrio orçamental e desarticulada a oposição republicana democrática»

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Enquadramento Político, Económico e Social da Ditadura Militar
«(…) No campo oposicionista, porém, a dinâmica conspirativa mantém-se. Depois de solucionadas as divergências entre os comités militares e os linguistas e exilados no exterior acerca dos caminhos a seguir para derrubar a Ditadura, a revolução sai à rua no dia 20 de Julho por iniciativa do Batalhão de Caçadores 7, com o objectivo de pôr fim à degradante situação financeira e às soluções austeras preconizadas por Salazar e capitalizar, a seu favor, a agitação vivida nos três centros universitários do país e a situação de numerosos militares e civis. Paralelamente, o recente fiasco do pedido de empréstimo à SDN, o apoio inequívoco da Igreja, da Inglaterra e da Espanha à manutenção da Ditadura, a eleição de Carmona e a afinação dos métodos repressivos e policiais terão levado muitos a optar pela revolução. Uma revolução que, contudo, sai vencida à partida: ensaiada desde Maio, o processo de preparação que a antecedeu é desarticulado em inícios de Junho quando os seus principais organizadores (comandante Jaime Morais e capitães Chaves e César Almeida) são presos. Com ramificações a nível nacional, dura 12 horas na capital, salda-se em numerosos danos materiais e na prisão e deportação (Angola e Timor) de centenas de militares e civis (a grande componente do movimento) e potencia apoios à situação por constituir mais um forte impedimento à recuperação económica e financeira. Salazar, esse, continua a sua ditadura financeira e, em Setembro, reduz as despesas nos Ministérios da Guerra, do Comércio e das Comunicações e da Instrução Pública.
A Ditadura era, pois, o garante da ordem e do equilíbrio. Reposta a disciplina nas ruas, acautelado o equilíbrio orçamental e desarticulada a oposição republicana democrática, Salazar introduz um factor de confiança para os agentes económicos numa economia em que as políticas orçamentais (tendem) a dar prevalência à estabilidade sobre o crescimento económico e em que os saldos orçamentais passam a ser positivos a partir de 1928 - 1929: logo no início do ano, procede à liquidação de importantes prestações da dívida de guerra e da dívida flutuante, conquistando o reconhecimento internacional; reforma a Caixa Geral de Depósitos e o Banco de Portugal, lançando o crédito público às actividades económicas; anuncia medidas de reactivação das obras públicas (expansão da rede ferroviária e telefónica, aproveitamento hidroeléctrico dos rios Douro e Zêzere, programa de obras de hidráulica agrícola, infra-estruturas portuárias e viárias, etc.); em Junho faz aprovar o Orçamento para 1929 - 1930 com um saldo positivo de 8500 contos e anuncia ao país a extinção da dívida flutuante externa quedando-se saldadas as contas com o estrangeiro. Paralelamente, instaura a reforma tributária e desenvolve um rigoroso saneamento nas administrações coloniais, sobretudo em Angola. A Ditadura possui finalmente um projecto uno e coerente, com prioridades definidas e rumos certos, cujo conteúdo político se traduz na concertação de uma plataforma económico-social e política comum (síntese histórica das direitas portuguesas numa única direita) viabilizadora da crescente hegemonização da Ditadura Militar pela corrente salazarista.
Mas, na sequência da portaria de Junho de Mário Figueiredo, amigo de Salazar em Viseu e Coimbra e então tutelar da pasta da Justiça e dos Cultos (10/11/28 – 8/7/29), a questão religiosa precipita a demissão de ambos os católicos em sinal de protesto contra a revogação da portaria dos sinos pelo Conselho de Ministros do Governo de Vicente Freitas. Depois de reunir com Salazar, Carmona aceita o seu pedido de demissão formalizado em nome de todo o gabinete, e chama Ivens Ferraz para formar novo governo (8/7/1929 - 21/1/1930).
O êxito da prática financeira reconfirma Salazar na pasta das Finanças que prossegue, agora, uma estratégia de redução da oposição entre os sectores mais visados pelas dificuldades do momento. Por um lado, autoriza medidas de protecção à agricultura, sobretudo no Centro e Sul do país, e, em finais de Agosto, faz aprovar as bases para a organização da Campanha do Trigo». In Cristina Faria, As Lutas Estudantis Contra a Ditadura Militar, 1926-1932, Edições Colibri, Lisboa, 2000, ISBN 972-772-201-6.

Cortesia de E. Colibri/JDACT