domingo, 2 de setembro de 2018

O Mistério das Catedrais. Interpretação Esotérica. Fulcanelli. «Lages de pedra, mausoléus de mármore, sepulcros, ruínas históricas, fragmentos do passado. Um silêncio lúgubre e pesado entre os espaços abobadados»

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«(…) Huginus de Barma, na Prática, da sua obra emprega os mesmos termos para exprimir a matéria da Grande Obra, sobre a qual a estrela aparece: tomai terra verdadeira, diz ele, bem impregnada dos raios do sol, da lua e dos outros astros. No século IV, o filósofo Calcidius que, como diz Mullachius, o último dos seus editores, professava que era necessário adorar os deuses da Grécia, os deuses de Roma e os deuses estrangeiros, conservou a menção da estrela dos Magos e a explicação que os sábios dela davam. Depois de ter falado de uma estrela chamada Ahc pelos Egípcios e que anuncia desgraças, acrescenta:

Há uma outra história mais santa e mais venerável que atesta que, pelo nascer de uma certa estrela foram anunciadas, não doenças e mortes, mas a vinda de um Deus venerável para a graça da conversação com o homem e para vantagem das coisas mortais. Os mais sábios dos Caldeus, tendo visto essa estrela quando viajavam de noite, e sendo homens perfeitamente exercitados na contemplação das coisas celestes, procuraram, segundo se conta, o nascimento recente de um Deus e, tendo encontrado a majestade desse Menino, renderam-lhe as homenagens que convinham a um tão grande Deus. O que conheceis muito melhor do que outros.

Diodoro de Tarso mostra-se ainda mais positivo quando afirma que essa estrela não era uma dessas que povoam o céu, mas uma certa virtude ou força urano-diurna, que tomou a forma de um astro para anunciar o nascimento do Senhor de toda a gente. O Evangelho segundo S. Lucas, II:

Ora, naquela mesma região havia uns pastores que vigiavam e se revezavam entre si nas vigílias da noite para guardarem os seus rebanhos. Eis que apareceu junto deles um Anjo do Senhor e uma luz divina os cercou e sentiram grande temor. O anjo, porém, disse-lhes: não receeis porque vos venho anunciar a Boa Nova que trará uma grande alegria a todo o povo. É que hoje vos nasceu na cidade de David um Salvador que é o Cristo-Senhor; e este é o sinal que vos fará reconhecê-lo: encontrareis um Menino envolto em panos e deitado numa manjedoura. No mesmo instante juntou-se ao Anjo uma multidão da milícia celeste que louvava a Deus e dizia: Glória a Deus no mais alto dos céus e paz na terra aos homens de boa vontade.

Evangelho segundo S. Mateus, II:

Tendo pois nascido Jesus em Belém de Judá, no tempo do rei Herodes, eis que do Oriente uns magos vieram a Jerusalém, dizendo: Onde está Aquele que nasceu, rei dos Judeus, pois vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo? … Então Herodes, tendo chamado secretamente os Magos, inquiriu deles, com todo o cuidado, acerca do tempo em que a estrela lhes tinha aparecido e enviando-os a Belém disse-lhes: ide e informai-vos bem que Menino é esse e depois que o houverdes achado vinde dizer-mo para que eu possa também ir adorá-lo. Eles, tendo ouvido as palavras do rei, partiram e logo a estrela que tinham visto no Oriente lhes apareceu, indo adiante deles, até que chegou e se deteve sobre o lugar onde estava o Menino. Quando eles viram a estrela foi grande a sua alegria e, entrando na casa, encontraram o Menino com Maria, sua Mãe e, prostrando-se, adoraram-no; depois, abrindo os seus tesouros, ofereceram-lhe presentes, ouro, incenso e mirra.

Nesse lugar baixo, húmido e frio, o observador tem uma sensação rara e que impõe o silêncio, a do poder unido às trevas. Estamos aqui no asilo dos mortos, como na basílica de Saint-Denis, necrópole dos ilustres, como nas Catacumbas romanas, cemitério dos cristãos. Lages de pedra, mausoléus de mármore, sepulcros, ruínas históricas, fragmentos do passado. Um silêncio lúgubre e pesado entre os espaços abobadados. Os mil ruídos do exterior, esses vãos ecos do mundo, não chegam até nós. Iremos desembocar nas cavernas dos ciclopes? Estamos no limiar de um inferno dantesco ou sob as galerias subterrâneas, tão acolhedoras, tão hospitaleiras, dos primeiros mártires? Tudo é mistério, angústia e temor neste antro escuro... À nossa volta, numerosas colunas, enormes, maciças, por vezes emparelhadas, erguidas sobre as suas bases largas e chanfradas. Capitéis curtos, pouco salientes, sóbrios, atarracados. Formas rudes e sumidas em que a elegância e a riqueza cedem lugar à solidez. Músculos fortes, contraídos sob o esforço, que partilham sem desfalecer o peso formidável do edifício inteiro. Vontade nocturna, muda, rígida, tensa numa resistência perpétua ao esmagamento. Força material que o construtor soube ordenar e repartir, dando a todos estes membros o aspecto arcaico de um rebanho de paquidermes fósseis, soldados uns aos outros, arredondando os dorsos ossudos, contraindo os ventres petrificados sob o peso de uma carga excessiva. Força real, mas oculta, que se exerce em segredo, se desenvolve na sombra, age sem tréguas nas profundezas dos subterrâneos da obra. Tal é a impressão dominante que sente o visitante ao percorrer as galerias das criptas góticas». In Fulcanelli, 1926, Le Mystère des Cathédrales, 1964, O Mistério das Catedrais, Interpretação Esotérica dos símbolos herméticos, Edições 70, colecção Esfinge, 1975.

Cortesia de E70/JDACT