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A
Mulher que Amou Jesus
«(…)
Parece um bom rapaz, disse Natã ao jantar, com uma certa simpatia na voz. Passou um pouco de pasta de figo no pão e
esperou. Também achei, concordou Zebida. Uma família que se opôs à admissão de
Diná, pode opor-se a qualquer coisa, disse Silvanus, referindo-se à mulher de
Eli. Ainda mais rigorosa que Eli na sua observância da Lei religiosa, Diná
trouxera uma grande alegria para a família, mas também uma certa mágoa. Assim
como na Páscoa, ela tornara qualquer refeição um exercício de despojamento e de
pureza ritual. Devido a isso, eles raramente faziam as refeições com Eli e Diná.
Os três voltaram os seus olhos para Maria, cuja opinião seria a mais importante.
Afinal, seria ela que teria de viver com ele.
Eu... As palavras saíam com dificuldade.
Seus pensamentos pareciam confusos, presos. O que pensava ela de Joel, o rapaz
que já trabalhara vários anos para o comércio da família e estava agora
disposto a fazer parte dela? Era um belo rapaz, de uma família respeitável da
cidade vizinha de Naim, tinha 32 anos, atraente e dava-se bem com todas as
pessoas. Maria não falara mais do que umas 20 palavras com ele. Se estava interessado,
por que não havia conversado a sós com ela? Ela ia muitas vezes ao armazém. Todos
os olhos postos nela. Eu..., acho..., que não me importo. Não era isso que
queria dizer! O que se passava com ela? Sentia a cabeça flutuar e as suas
palavras não reflectiam os seus sentimentos. E isso não era de hoje. Já o
percebera havia vários meses. Era por causa, devia ser isso, do problema que
tinha para dormir. No Inverno passado, o sono pesado que sempre tivera
abandonou-a, dando lugar a sonhos terríveis, e bem nítidos, ou então a insónias
intermináveis. E o seu quarto tornara-se muito frio, quando o resto da casa era
confortável.
Seu pai procurara ver se haviam
fendas na parede, por onde passasse o vento, mas não encontrara nada. Ela
acabara por colocar mais cobertas por cima. A insónia deve estar prejudicando-me,
pensou Maria. Parece que não consigo pensar. Ou reagir. Mas o assunto é o casamento!
Uma coisa que quero e não quero; uma coisa que pode arruinar minha vida, se
fizer uma escolha errada. Há anos que venho tendo medo deste dia. Para a família,
já vem sendo adiado demais, mas não, para mim. Natã inclinou-se para a frente. Uma
resposta muito hesitante para uma pergunta muito importante, disse. Não me importo pode servir para
resolver se vamos ou não dar um passeio, mas decididamente não é uma resposta
adequada para uma proposta de casamento. Eu... O que é que ele propôs, de facto?,
perguntou Maria. Talvez pudesse decidir se soubesse dos detalhes. Disse que se
uniria a nós nos negócios de família e que se mudaria para Magdala. Não teria
de ir morar com a família dele.
Isso era bom. Maria não queria ir
morar com uma sogra e tomar conta de uma família que não conhecia, embora isso
fosse uma prática comum. Disse que traria um razoável mohar, o seu dote de casamento, e
que a cerimónia seria no ano que vem. Estará com 17, e ele com 23 anos. Uma boa
idade para ambos. O que acham os rabinos? Até os mais liberais acham que 24 é
uma idade limite para um homem se casar. Talvez ele esteja preocupado com as
expectativas, disse Maria. Talvez o pai dele o esteja obrigando a casar-se. Essa
era uma maneira de ser tipicamente sua. Abanou a cabeça para esquecer o que
dissera. E daí?, disse sua mãe. O que importa é que é um bom homem, de uma boa
família e que os dois se entendem bem. E tem ambições. Eu nem sei se gosto
dele. Nem tenho certeza se o reconheceria, se o visse no mercado.
Silvanus reflectiu, como se fosse
um escriba que estivesse avaliando a situação. Eu penso que quando escolhemos o
nosso jumento fomos mais criteriosos do que estamos sendo agora, deixou
escapar. O seu pai franziu a testa. Isso é uma tolice. É claro que tivemos de
fazer mais perguntas sobre o jumento, pois ele não sabia falar! Mas com um homem
é diferente. É diferente?, perguntou Maria. E o que é que ele disse?» In
Margaret
George, A Paixão de Maria Madalena, 2002, Saída de Emergência, Edições Fio de
Navalha, 2005, ISBN 972-883-911-1.
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