quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

Estudos sobre a Ordem de Avis. Séculos XII-XV. Maria Cristina Cunha. «Uma outra fonte de rendimento da Casa de Oriz, é, como dissemos, a rébora ou entrada, que Viterbo classifica como o presente, luvas, saguate, donativo, ofreção ou mimo…»

jdact

A organização interna da Ordem de Avis: breve abordagem
A comenda de Oriz
«(…) Finalmente, acreditamos que quando Fernão Rodrigues Sequeira dá a Martim Esteves Godinho poderes para tomar posse dos padroados de várias Igrejas que o recém-eleito monarca, João I, havia doado à Ordem de Avis, está antes de mais, a salvaguardar os seus interesses e os da Mesa Mestral, não dando, neste caso ao comendador de Oriz possibilidade de anexar à sua comenda mais direitos além dos que já possuía a Norte do Douro. De qualquer modo, também aqui não temos documentação que permita confirmar esta hipótese.

A formação do património
Ao contrário do que sucede relativamente à comenda de Santarém, por nós estudada, não podemos falar de uma política adquisitiva de bens por parte de Oriz, embora, como acima referimos, tenhamos conhecimento de algumas doações. Temos, por isso, de nos socorrer da relativa abundância das cartas de emprazamentos para avaliar a extensão do património desta comenda. O reduzido número de diplomas que apontam para a ampliação da propriedade nortenha da Ordem de Avis, bem como os poucos elementos que eles nos fornecem, não nos permite saber qual a condição social dos muito poucos doadores. Foi, no entanto, possível reconstituir alguns dos motivos que levaram às diferentes doações: pro remedio anime mee et pro amore ordinis supradicti [Avis], per maneyra de hesmolna e em rimiimento de pecados são expressões que surgem na documentação estudada. Os bens doados vão desde uma herdade a conjuntos de propriedades, dos quais se destaca o que foi ofertado por Mor Martins, monja de Arouca, passando pelo padroado de algumas igrejas. Não nos parece que Avis tivesse especial interesse em adquirir património numa região concreta, já que as propriedades que vão surgindo ao longo dos quase dois séculos estudados, estão geograficamente muito dispersas, o que também nos poderá apontar para a espontaneidade dos benfeitores da Ordem. De qualquer modo, a grande maioria situa-se no Entre-Douro e Minho, fornecidas pelas Inquirições de 1258, já que nos indicam não só a localização de propriedades da Ordem de Avis, mas também especificam como foram obtidas.
A documentação trabalhada levou-nos a pensar que seria interessante cartografar os diferentes bens imóveis da comenda de Oriz de que temos notícia nos séculos XII a XV. Assim, juntando as informações contidas nos emprazamentos às dos restantes documentos, foi-nos possível elaborar uma lista de locais onde a Ordem tinha património, e em que é que este consistia.
Apesar de incompletos, as indicações poder-nos-ão dar uma visão global das propriedades que Avis possuía a Norte do Douro em princípios do século XV. Será de salientar o grande número de casais (unidade de produção rural que raramente aparece referida nas outras comendas) e a existência de uma vinha, bem como de um só moinho, ao contrário do que se passa em Santarém, onde as vinhas, misturadas ou não com olivais, surgem com abundância. Dada a sua extensão, pareceu-nos importante sintetizar o património referenciado, de modo a permitir uma percepção rápida da sua amplitude. Assim, e considerando diferentes as propriedades relativamente às quais não dispomos de informações que indiquem tratar-se da mesma, e considerando igualmente, por defeito.

O aproveitamento da propriedade
Feita uma primeira abordagem às propriedades da comenda de Oriz, impunha-se saber o que elas significam em termos de rendimento para a Ordem. Uma vez que a maioria dos documentos disponíveis são emprazamentos, foi com as indicações que estes nos proporcionam que tentámos esse estudo, complementado pelas inquirições fornecem um ou outro elemento de certo valor para o fim que nos propunhamos, advertindo desde já o inconveniente de não termos feito uma redução a uma só moeda de compra.
Uma breve análise permite observar diferenças em relação a outras comendas da Ordem de Avis. Assim, em primeiro lugar, a maioria das rendas são pagas em dinheiro, e algumas em géneros e numerário. Para fazer frente à inflação, há sempre o cuidado de especificar em que moeda o pagamento deve ser feito e de dizer qual o valor desta. É também de referir que nenhuma propriedade estava obrigada a foro variável conforme a sua produção, processo aliás muitas vezes utilizado pela Ordem Militar. A lutuosa recai frequentemente sobre os foreiros, o que se entende se tivermos em consideração que esta comenda se situava no Norte do País. Com efeito, no Sul, mais liberto de tradições e impostos rurais, este e outros encargos não recaiem sobre os rendeiros da Ordem, o que será talvez contrabalançado com um maior peso dos foros a pagar.
Em Oriz nos surgem também pela primeira vez, referências a dádivas e à rébora. Quanto às primeiras (significando o mesmo que jantares, colheitas ou serviço inicialmente fruto de generosa liberalidade dos vassalos ou colonos e que, com o tempo se tornaram tributos anuais, eram cobradas sempre que o Comendador ia visitar ou passava pelas propriedades.
Uma outra fonte de rendimento da Casa de Oriz, é, como dissemos, a rébora ou entrada, que Viterbo classifica como o presente, luvas, saguate, donativo, ofreção ou mimo que além do preço que se dava nas compras, vendas, escambos, e também nas doações a costumava dar o donatário ao doante». In Maria Cristina A. Cunha, Estudos sobre a Ordem de Avis, séculos XII-XV, Faculdade de Letras, Biblioteca Digital, Porto, 2009.

Cortesia da FdeLdoPorto/JDACT