quarta-feira, 24 de julho de 2019

Em Torno do Pensar Poetizante de Agostinho da Silva. Lúcia Helena A. Sá. «A partir dos anos da década de 1930, em decorrência da ditadura de António Salazar, intelectuais portugueses estabeleceram-se no Brasil, formando o que António Cândido (2003) designou por missão portuguesa»

Cortesia de wikipedia e jdact

«(…) Neste nosso trabalho, fazemos apenas o estudo da biografia Vida de Francisco de Assis (1944), pois Agostinho da Silva usou da postura do homem Giovanni Bernardone para aludir à emergência do espiritual no mundo a fim de que vigore o universo de coisas e pessoas confraternizadas entre si, ancoradas forte e exclusivamente no amor socialmente difundido. O biógrafo apresenta-nos um modelo de vida exemplar que renunciou os prazeres mundanos por ter desencoberto a Graça. Ensina-nos a compreender que de nada vale a nossa existência se não soubermos servir, cuidando, voluntariamente, do outro com boa vontade e com agrado. Isso significa que devemos agir em caridade, respeitando as altercações. Foi isso que Agostinho da Silva procurou viver e praticar e declarar literariamente ou em textos pedagógicos e filosóficos.

A diáspora intelectual
A partir dos anos da década de 1930, em decorrência da ditadura de António Salazar, intelectuais portugueses estabeleceram-se no Brasil, formando o que António Cândido (2003) designou por missão portuguesa. Esta se iniciou, por certo, em 1927, com a vinda de Sarmento Pimentel, conhecido como O Capitão, o chefe dos portugueses no exílio em nosso país. Era ele quem dava toda a assistência aos seus compatriotas que chegavam a São Paulo. Os emigro-exilados como, a título de exemplo, Eudoro Sousa, Adolfo Casais Monteiro, Jorge de Sena, Sidónio Muralha e Joaquim Barradas Carvalho, todos da área de Letras, contribuíram para o aperfeiçoamento académico brasileiro. A essa missão portuguesa junta-se a presença do professor Agostinho da Silva que esteve impossibilitado de continuar a realizar os seus projectos culturais e pedagógicos no ambiente político opressor de Portugal à época de Salazar, apesar de já ter deixado nesse território de língua portuguesa a marca de sua intelectualidade provocadora. Mas antes de fincar moradia definitiva no Brasil quando aqui aportou em 1944, auto-exila-se na Argentina no ano de 1945, leccionando a disciplina Pedagogia Moderna na Escola de Estudos Superiores de Buenos Aires e realiza trabalhos no domínio da Histologia. Em 1946, esteve a ensinar nos Colégios Livres na capital do Uruguai.
Essa diáspora de Agostinho da Silva deu-lhe o que Portugal lhe negava, a liberdade nitidamente intelectual que se caracterizava por certo abandono a Portugal no sentido de um Estado-Território, a favor de um Portugal que é a língua portuguesa, substrato unificador poderoso que, hoje, já se tornou código linguístico abrangente, reunindo oito nações em quatro continentes que, mesmo constituindo-se em espaços geograficamente descontínuos, são irmanadas por uma herança histórica, pelo idioma comum e por uma visão compartilhada na defesa da democracia, na promoção do desenvolvimento e na criação de um ambiente internacional mais equilibrado e pacífico. Exemplifica essa complementariedade histórica as realizações agostinianas nesse território de língua portuguesa, notadamente o Brasil, país no qual permaneceu por 25 anos. Instalou-se, a partir de 1947, numa casa alugada dentro de uma fazenda de imigrantes filandeses na Serra de Itatiaia, em Penedo (Estado do Rio de Janeiro). Aí formou uma comunidade alternativa, melhor dizer, de cariz monástico e ecuménico integrada, por exemplo, por Vicente Ferreira Silva e sua esposa, Dora. Essa casa foi frequentada por Cecília Meireles, Mário Andrade, Miguel Reale, Murilo Mendes (foi casado com Saudade Cortesão cuja irmã, Judite Cortesão, era esposa de Agostinho da Silva; as duas eram filhas do intelectual português Jaime Cortesão) e outros intelectuais.
No período em que morou em Itatiaia, investigava a História do século XVIII, ministrava aulas de Filosofia da Educação na Universidade Federal Fluminense e trabalhava no Instituto Oswaldo Cruz como entomólogo. Do Instituto ele levou para a casa um microscópio com a intenção de oportunizar aos jovens e adultos da fazenda o saber científico de modo a integrar o conhecimento popular e o da academia. Também montou uma exposição de arte com trabalhos de crianças para aproximar os colonos finlandeses da gente brasileira. Em 1952, ausenta-se do Rio de Janeiro e vai para o Estado da Paraíba para leccionar em universidade. Já por volta de 1959, quando se naturalizou brasileiro, era notabilizado no universo da cultura portuguesa e, durante a sua estada no Brasil, conseguiu realizar viagens pelo que ele considerava o mundo português. Além disso, deixou-se até mesmo envolver-se pela língua, cultura e encantos do Oriente; proferiu conferências especialmente no Japão, nação que muito lhe interessava dadas às relações com Portugal verificadas nos séculos XVI e XVII, importantes e esquecidas actualmente. Neste país, instigou a constituição de Centros de Estudos do Oriente em Nagasaki, ideia que se estendeu à China». In Lúcia Helena Alves Sá, Em Torno do Pensar Poetizante de Agostinho da Silva, Tese apresentada ao Curso de Doutorado em Literatura do Departamento de Teoria Literária e Literaturas da Universidade de Brasília, como obtenção do título de Doutor em Literatura, Teoria do Texto Literário, Brasília, 2013, Wikipedia.

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