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«O
Mito é o nada que é tudo». In Fernando Pessoa
Antelóquio
«(…) Haverá um horizonte unitário
de vivência e de vida colectivas, de apreensão e de representação do mundo que,
na projecção e introjecção dessas glórias e misérias, permita falar de um mito: o mito de Portugal?
Consistirá este mito na tradução estável de uma verdade, que possui sentido em
si e por si? Não se supõe para a figura de Portugal a ideia de uma unidade,
estrutural ou até mesmo de força genésica, a propósito da qual se fala de mito?
Se não quisermos dar a esta noção de mito, por minoração de realidades, o significado
vago do que é puramente imaginativo, cumpriria, em primeiro lugar, compreender
o que poderá estar em jogo de coexistências no que aqui se designa por mito de
Portugal, respondendo às duas primeiras questões que formulei, e, em segundo
lugar, apreender a arquitectura de espírito que assinala no mito o próprio
sentido do ser e do estar de Portugueses, com réplica para a última
interrogação.
No que ao primeiro problema diz
respeito, o mito de Portugal, compreendido na sua substância de encarnação de
ideais colectivos, tem conteúdo histórico e existencial, por nele se
exprimirem, por forma contínua e variada, os sentimentos, as paixões e as
aspirações de um povo, a par das suas narráveis acção, visão, compreensão e
capacidade de transformação do mundo. Como fenómeno cultural, o mito conserva,
ou melhor, coincide com os ideais da nacionalidade, do ser português na origem
para a sua vocação tardia: nasce com a consciência do povo português,
corporiza-lhe o sentimento terrantês, ou matricial, e a emoção colectiva da
pertença pátria, insinua a união da gesta com a esperança e a promessa, mas
também a contradição da vida gloriosa com os páramos árduos da decadência.
O mito de Portugal, tal como aqui
o interpreto, constitui um sistema de representações vitais, uma organização de
valores mentais, afectivos, gnosiológicos, éticos e espirituais que se foi
formando sob o efeito das injunções da história e ao longo das circunstâncias
dos Portugueses na história, que se confunde com a ideia da nacionalidade e sua
permanência no tempo. Daí a resposta ao segundo problema. O núcleo vivo do mito
de Portugal está na permanente abertura de si à hermenêutica das gerações, e à
sua epifania deve regressar continuamente o português, a braços com a sua
própria imagem e nas crises de identidade nacional.
História concisa do mito de Portugal
«Os
mitos históricos são uma forma de consciência fantasmagórica com que um povo
define a sua posição e a sua vontade na história do mundo». In António
José Saraiva
Para definir o mito de Portugal
basta tão-só a História de Portugal, pelo que ele é extensivo no espaço e
intensivo no tempo. Extensivo, por não coincidir com a geografia do cantão
peninsular, seja embora este a terra da formação do mito e da sua gestação,
antes tendo por fronteiras os limites físicos do próprio mundo. Intensivo,
porque ao longo das aportações históricas que foi recebendo do imaginário
português, o tempo cronológico, que marca o ciclo das culturas e das
civilizações, foi sendo progressivamente substituído pelo tempo do espírito,
pelo qual se concebem os possíveis e o futuro.
O mito de Portugal é um mito de
origem e destino colectivos. É, sobretudo, o mito de Portugal como império,
cujo estrato cultural enraíza na noite dos tempos, se formou nos transes mais
complexos da história nacional e evoluiu por alargamento sucessivo da sua
primeira matriz, para cujo sincretismo de conteúdos tanto contribuíram a
política de Portugal no concerto das nações e a efabulação das ideologias
políticas, principais responsáveis pelo privilégio sacral do próprio mito
enquanto fautor da consciência nacional e fonte legitimadora do lugar autêntico
dos Portugueses no mundo.
Se, com António José Saraiva,
concordo em que os mitos históricos contêm paradigmas da posição e vontade de
um povo na história do mundo, com ele discordo em que sejam formas de
consciência fantasmagórica, um modo hipercrítico de dizer que reduz a simples flatus vocis as
significações do mito e destrói a ontologia de sentido da sua construção
colectiva. A constelação de valores que há nos mitos históricos, que coincide
com a verdade que exprimem ou querem exprimir, adapta-se e combina-se no recontro
directo com as circunstâncias da própria história, porque nos mitos fala aquela
parte que sempre neles se conserva, a identidade cultural de uma comunidade. Se
morrem e incompreensivelmente ressuscitam, é por mor daquela identidade, que
não é intemporal, nem sequer transversal ao tempo, mas agente no tempo, memória
que conserva o passado e cinge o futuro. A eles regressam as gerações, ainda
quando, e sobretudo, a nudez do tempo e a crueldade da história desmintam os
seus anseios, os seus sonhos e as suas glórias». In Manuel Cândido Pimentel, O
Mito de Portugal nas suas Raízes Culturais, Wikipedia.
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