terça-feira, 6 de agosto de 2019

As Escolas de Ruy Jervis Athouguia no Bairro de Alvalade. Mónica Queiroz e Vitória Pinheiro. «… vai desde o palacete de luxo à moradia medíocre passando pelo prédio de rendimento mais incaracterístico o que, segundo a mesma autora conduziu a uma grande variedade volumétrica e de cérceas…»

Cortesia de wikipedia e jdact

Arquitectura Portuguesa do século XX
«O espólio do arquitecto Ruy Athouguia ingressou no Arquivo Municipal de Lisboa em Junho de 2000, após a derrocada do seu ateliê, um antigo palácio setecentista, situado na Rua de São Pedro de Alcântara, em Lisboa. Este, não resistindo ao duro Inverno de 1999-2000, ruiu colocando em risco a integridade da documentação e, consequentemente, a sua preservação. Em resultado da situação, o arquitecto entregou, a titulo de depósito, o seu espólio à guarda do Arquivo Municipal, não só para ser alvo de restauro, como para ser estudado, inventariado, acondicionado e, futuramente, dado à consulta, num contributo para o estudo do Urbanismo e da Arquitectura Portuguesa do Século XX.
Inicialmente, efectuou-se um primeiro levantamento da documentação existente e uma contagem da totalidade dos documentos, que foram sujeitos a uma limpeza e acondicionamento prévio. Actualmente, procede-se à análise e inventariação de toda a documentação, com vista, por um lado, à elaboração de um Plano de Classificação e, por outro, à catalogação, informatização e acondicionamento. Ruy Jervis Athouguia, visconde de Athouguia, nascido em Macau em 1917, licenciou-se, em 1948, em Arquitectura pela Escola Superior de Belas Artes do Porto. Os seus primeiros trabalhos, encomendas particulares, são pedidos de amigos e familiares que vêm nele um arquitecto que se distancia das tendências nacionalistas da época e que privilegia a modernidade, o requinte, a ordem e que, por isso, opta por soluções de economia e aproveitamento inteligente do espaço.
Estes primeiros trabalhos constituem uma aprendizagem necessária e importante para a tarefa que mais tarde se lhe impõe na cidade de Lisboa. Trabalha como profissional liberal e na Câmara Municipal de Cascais durante 4 anos, tendo realizado trabalhos importantes como o Bairro dos Pobres da responsabilidade da Santa Casa de Misericórdia de Cascais. Durante o seu percurso profissional realiza diversos trabalhos de arquitectura habitacional, moradias, prédios de rendimento e bairros económicos, dos quais se destaca a Célula 8 do Bairro de Alvalade, em 1949-55, designada como Bairro de São João de Deus e, mais tarde conhecido como Bairro das Estacas, com Formosinho Sanches e Maurício Vasconcelos, que mereceu um prémio na bienal de S. Paulo, de 1960. Foi, ainda, distinguido, por este trabalho, com o Prémio Municipal de Arquitectura, em 1954.
Foi autor, juntamente com Alberto Pessoa e Pedro Cid, do Edifício Sede da Fundação Calouste Gulbenkian (1960-69), projecto cujo valor foi reconhecido em 1975, com a atribuição do Prémio Valmor ao conjunto do projecto arquitectónico (sede, museu, auditórios, salas de exposições e de conferências e enquadramento paisagístico).

Enquadramento Histórico
Durante o século XX realizaram-se em Lisboa inúmeras obras de arquitectura e urbanização, motivadas pela necessidade de crescimento e de modernização da cidade, em virtude do aumento populacional causado pelo desenvolvimento da indústria e do comércio. Esta célere renovação urbana e tecnológica do inicio do século dá origem à abertura de dois eixos viários essenciais para o desenvolvimento da cidade: a Av. António Augusto de Aguiar e a Av. Almirante Reis. É também nesta altura, sobretudo na década de trinta, que tem origem o crescimento de uma construção de gosto dúbio que na opinião de Ana Tostões, vai desde o palacete de luxo à moradia medíocre passando pelo prédio de rendimento mais incaracterístico o que, segundo a mesma autora conduziu a uma grande variedade volumétrica e de cérceas (...) imageticamente agravada pela profusão dos eclectismo decorativos. Era, pois, evidente a necessidade de construção de novos equipamentos arquitectónicos.
Estes anos 30 trinta são considerados a década de ouro das obras públicas, expressa na construção de escolas, teatros, bairros sociais, gares marítimas (Alcântara, Rocha do Conde de Óbidos), igrejas e na abertura de vias de comunicação modernas (o viaduto Duarte Pacheco e a ligação à Auto-Estrada do Estoril, a Avenida da Índia, a Avenida Infante D. Henrique, a Avenida do Aeroporto e as circulares de Lisboa), ultrapassando mesmo, nalguns casos, as necessidades da época e, perspectivando um desenvolvimento futuro da cidade. Esta necessidade de construir de forma sistemática dá origem, na expressão de Ana Tostões, ao advento da linguagem modernista portuguesa apoiada nas novas técnicas e materiais industrializados o que vai, claramente forçar a ruptura de linguagem com os padrões passados, acertando curiosamente com o projecto de modernização e eficácia produtiva que o estado novo quis viabilizar a partir de finais dos anos 20 (é a partir do Congresso Nacional de Arquitectura, em 1948, que se sente emergir, segundo os vectores que ensaiámos caracterizar, uma nova geração e, em paralelo, uma vontade colectiva de mudança, de recusa consciente e mais teoricamente alicerçada, da arquitectura do estado novo)». In Mónica Queiroz e Vitória Pinheiro, As Escolas de Ruy Jervis Athouguia no Bairro de Alvalade, Arquitectura Portuguesa do século XX, Cadernos do Arquivo Municipal de Lisboa, 1ª Série, nº 7.

Cortesia de Wikipedia/JDACT