sábado, 24 de agosto de 2019

Chaves e as suas Fortificações. Paulo Dordio. «Chamaram-se então povoas ou vilas novas mostrando no respectivo desenho o carácter planificado da sua origem. Centro urbano e território surgem indissoluvelmente relacionados»

Cortesia de wikipedia e jdact

Evolução urbana e arquitectónica
«Consideraram-se sucessivamente quatro momentos geradores da cidade: a Póvoa medieval, a Vila renascentista, a Praça de Guerra barroca, e finalmente a Cidade Moderna. A póvoa medieval surge no âmbito das reorganizações do território e do povoamento que a Monarquia Portuguesa empreende sobre os espaços das periferias do NE. Mais tardia do que a fundação de Bragança por Sancho I mas anterior à criação de Miranda do Douro por Dinis I, a Póvoa de Chaves surgirá por iniciativa do rei Afonso III ao mesmo tempo que este se dedicava à paralela fundação de Vila Real. A característica de vila de fronteira com objectivos bélicos mas, ao mesmo tempo, controlando importantes relações comerciais com o lado Leonês e Castelhano, constituirá desde a origem uma característica fundamental da identidade urbana de Chaves. A Vila renascentista surge na continuidade da póvoa medieval procurando actualizar-se ao sabor de novas tendências e exigências que percorriam a Europa do Renascimento. A característica de vila de periferia, fronteira e distante dos centros ordenadores, persistirá impondo limitações à actuação dos protagonistas da construção da sua história. Oscilando entre a expansão possível e a contenção, será terreno de intervenção das suas elites empenhadas num esforço de monumentalização do tecido urbano mas que não deixará de ser marcado pelo deficit de recursos ou de ambições.
A análise da Praça de Guerra na época barroca determina necessariamente uma atenção particular ao processo de construção das estruturas de fortificação abaluartadas bem como ao entendimento da lógica da máquina de guerra subjacente e as implicações urbanísticas decorrentes. Procurou analisar-se também os modos como Chaves organizou as suas periferias urbanas ou subúrbios nesta época, considerando que aquele tipo de fortificações, com as extensas obras exteriores que implicava, impunha normalmente um corte radical entre o espaço urbano e a periferia rural ou suburbana. O momento difícil que o desastre da campanha de 1762 representou para os núcleos urbanos em Trás-os-Montes inaugurou o que chamamos de morte lenta da praça de guerra. Mas a vila e as suas elites foram capazes de reagir a uma conjuntura desfavorável e relançar uma nova dinâmica de crescimento em Chaves que se reflectiu num original período de renovação urbana entre os fins do século XVIII e as três primeiras décadas do XIX, antecipando o que teria o seu pleno desenvolvimento no decorrer da 2ª metade do século XIX.
Analisaram-se em seguida as dificuldades do crescimento urbano que é geral ao longo de Oitocentos. Observou-se o fim da Praça de Guerra, a actualização da presença militar com novos projectos e realizações bem como a reabilitação das estruturas de fortificação em desuso com novos significados e utilizações. Situamo-nos então em pleno processo de criação da Cidade Moderna, identificando-se dois planos sucessivos ainda no interior das lógicas dos Planos de Melhoramentos Urbanos, o primeiro desenvolvendo-se ao longo das últimas décadas do século XIX e o segundo estruturando uma outra lógica para a cidade a partir da instauração do poder republicano e o fim da 1ª Guerra Mundial. A elaboração do Ante Plano de Urbanização nas décadas de 1940 e 1950 procura uma actualização do espaço urbano e respostas aos desafios de uma expansão urbana que se vê chegar mas que marcará passo depois com a crescente emigração para fora de Portugal. Porém, as últimas décadas do século XX trarão consigo uma explosão urbana e edificadora que os planos de urbanização da década de 1950 não terão capacidade de ordenar. Já nos nossos dias assistimos a uma nova atenção aos problemas urbanos e do crescimento que procura a criação de instrumentos eficazes de planeamento e controle cujo corolário é o Projecto Polis para o qual o presente trabalho de investigação histórica e arqueológica visou contribuir.

Cidade Portuguesa no Tempo
O estudo e conhecimento do urbanismo em Portugal conheceram grandes avanços, registados sobretudo nas duas últimas décadas. Os anos de formação da Monarquia Portuguesa (séculos XII – XIV) são coevos de uma nova dinâmica urbana que acompanha o momento da expansão medieval iniciada após o ano 1000. Grande parte dos núcleos urbanos actuais podem, com proveito metodológico, reconhecer as suas origens nessa época. A Monarquia Portuguesa afirmou o domínio sobre o território a partir da matriz urbana ordenando e reordenando com ela o espaço em função dos seus interesses centralizadores. Numa primeira fase, o limite que a muralha da cerca materializa parece ser sinónimo de urbano. Com efeito dizia-se, na altura, fazer vila como exprimindo construir uma muralha de cerca e com ela assim fundar um núcleo urbano. Muitos núcleos urbanos surgiram naquela época, sobremaneira durante os reinados de Afonso III e de Dinis I, como actos de vontade régia, fundações novas e ordenadas com o objectivo de criar centros a partir dos quais organizar, ou reorganizar, o território. Chamaram-se então povoas ou vilas novas mostrando no respectivo desenho o carácter planificado da sua origem. Centro urbano e território surgem indissoluvelmente relacionados pois um centro urbano exige sempre um termo no qual tem assento as aldeias, quintas e casais em que moram as populações rurais que daquele dependem. Um centro urbano é pois normalmente um município e um território concelhio. O crescimento das concentrações humanas e o desenvolvimento das actividades de relação trouxe a formação de rossios e de arrabaldes nos exteriores próximos das muralhas da cerca. Ao mesmo tempo esboça-se uma diferenciação entre a Alta e a Baixa urbanas, esta última muitas vezes designada por Ribeira. Iniciava-se então um movimento clássico das populações que se aproximam das áreas mais abertas à relação e à expansão, abandonando os altos e adensando-se sobre os baixos, junto aos caminhos e às margens dos rios navegáveis». In Paulo Dordio, Chaves e as suas Fortificações, Evolução urbana e arquitectónica, ARQUEOHOJE, Chaves. Levantamento Arquivístico e Bibliográfico. 2006, Chaves, Arquivo Municipal de Chaves, 2015, Wikipedia.

Cortesia doAMChaves/ ARQUEOHOJE/JDACT