segunda-feira, 12 de agosto de 2019

O Conto Literário de Temática Açoriana. Mónica Maria S. Cabral. «… que, de acordo com João Melo, constitui o período inaugural por excelência de uma novelística que conhecerá sucessivas variações temáticas, até se fixar na reposição do viver insulano…»

Cortesia de wikipedia e jdact

Com a devida vénia a Mónica Maria Cabral

A Ilha. O Mar. A Emigração
«O conto literário de temática açoriana reflecte uma visão do mundo particular, resultante de condições geográficas, geológicas, climáticas, sociais, históricas e culturais. A análise dos textos permitiu-nos detectar recorrências temáticas inspiradas em impressões e experiências reiteradas relacionadas com a realidade circundante, as quais requisitam, constantemente, a expressão literária. A ilha, perspectivada eufórica e disforicamente, o mar e a emigração constituem elementos centrais no imaginário açoriano. O presente trabalho identifica e estuda as imagens e os temas mais importantes na trajectória deste conto, mostrando até que ponto se pode falar de uma tradição literária açoriana no contexto da literatura portuguesa». In Resumoo

A Ilha. O Mar. A Emigração
Os primeiros sinais de vitalidade temática
«A história literária dos Açores deverá começar com Gaspar Frutuoso (1522-1591), jesuíta doutorado em Salamanca, que, passado menos de um século do povoamento das ilhas, começa a escrever crónicas, poesia e até uma novela à maneira de Menina e Moça, de Bernardim Ribeiro, integrada nas suas Saudades da Terra, Livro Quinto. As condições de vida nos Açores até à era liberal são pouco favoráveis a manifestações de carácter literário, pelo que somente três séculos após Frutuoso é que se cria um ambiente propício ao desenvolvimento da literatura (entre o século XVI e meados do século XIX, à excepção de Frutuoso, tudo o resto se leva na conta dos recreios de oratória, formando um espesso enredemoinhado onde será pouco aconselhável penetrar; as parcas manifestações de criatividade aí existentes logo se enredam na tal convicção circular, em torno de instrumentos místicos, aí instituídos como dogma e mais não; quase três séculos para diante, e o panorama não é significativamente diverso: aí abunda ainda esse subproduto de talha fradesca e seus apêndices ideológicos, apostado numa marca emblemática de condicionante religiosa tão concentracionária quanto erudita). Por isso, podemos dizer que a ficção literária açoriana nasceu, verdadeiramente, no século XIX, que, de acordo com João Melo, constitui o período inaugural por excelência de uma novelística que conhecerá sucessivas variações temáticas, até se fixar na reposição do viver insulano, perscrutando-o dos seus sensíveis quadrantes. A cidade da Horta, com o seu ar cosmopolita, pólo de dinamismo cultural e de comunicação com o exterior, apresenta, na segunda metade desse século, condições (surge, nessa altura, como um centro de contactos com o exterior, promovendo uma grande abertura dinâmica a outros espaços físicos e culturais; Pedro Silveira explica como esta cidade se tornou num centro cultural de criação literária: a Horta, sobretudo, mercê dos seus antecedentes, a navegação que parava pelo seu porto, levando aos naturais as ideias da Revolução francesa e os produtos das Culturas europeias, principalmente anglo-saxónica e galesa, estava bem preparada para poder ser o berço da nova literatura açoriana; e foi aí, efectivamente, que surgiram os primeiros ficcionistas insulanos) que permitem o surgimento de periódicos, onde se começa a publicar contos e capítulos de romances. E é nessa pequena cidade que surgem os primeiros ficcionistas, como António Lacerda Bulcão, o mais antigo contista açoriano, representante da estética romântica, autor de uma vastíssima obra narrativa muito incompletamente reunida em Colleccao de Romances Originaes (1873), afinal mais contos que romances, ricos de temática insular. Outros contemporâneos de Bulcão, como Augusto Loureiro e José Torres, em São Miguel e na Terceira, escrevem trabalhos de ficção, inspirados pela estética romântica, mas não possuem qualidade artística notável.
A cultura açoriana sempre esteve ligada à fundação de órgãos de imprensa, que se afirmam como verdadeiros pólos aglutinadores de gentes e ideias, logo a partir da segunda metade do século XIX. De facto, nos Açores, inicialmente na cidade da Horta, desenvolve-se uma imprensa precoce, que viria a condicionar a escrita literária (os Açores tiveram mais de seiscentos jornais e revistas diferentes ao longo da sua História; actualmente, um dos jornais diários, o Açoriano Oriental, é o segundo mais antigo da Europa). O desenvolvimento da narrativa açoriana, neste período, deve-se, em especial, aos chamados contistas da Horta, que, neste ambiente de abertura a outros espaços e outras culturas, utilizam o jornal como meio de divulgação da sua escrita». In Mónica Maria S. Cabral, O Conto Literário de Temática Açoriana, A Ilha, O Mar, A Emigração, Universidade de Aveiro, Departamento de Línguas e Culturas, Tese de Doutoramento, POPH/FSE, FCT, 2010, Wikipedia.

Cortesia de POPH/FSE/FCT/JDACT