terça-feira, 20 de agosto de 2019

Os Arquivos Secretos do Vaticano. Sérgio P. Couto. «Os arquivos ganharam a alcunha de secretos não apenas pelo seu acesso restrito para a maioria das pessoas mas também pelo seu conteúdo proibido. Isso porque muitos livros, documentos, epístolas, entre outros…»

Cortesia de wikipedia e jdact

«Tudo o que é oculto, secreto, proibido parece chamar mais a nossa atenção. E, de facto, uma aura de mistério envolve os Arquivos Secretos do Vaticano. Localizados na Cidade de Vaticano, compreendem um local que reúne documentos relativos a todos os actos promulgados pela Santa Sé. São, na verdade, um imenso repositório central de informações, que abrange livros, documentos, correspondências, diários de papas, processos da Inquisição (maldita), papéis confidenciais, imagens, fac-símiles e milhares de outros registos que a Igreja Católica vem acumulando ao longo dos séculos. O seu tamanho e extensão impressionam. Estima-se que contenham 85 quilómetros de prateleiras e que existam 35 mil volumes apenas no catálogo selectivo. No total são cerca de 2 milhões de documentos que relatam cerca de 800 anos de história guardados hermeticamente.
Os arquivos foram criados para ser consultados principalmente pelo papa e pela cúria romana. Com o passar do tempo, os Arquivos Secretos do Vaticano se tornaram um verdadeiro depósito de documentos ligados aos mais variados processos que envolviam a participação da Igreja Católica na defesa da fé cristã. Ali há seis grupos de documentos: cúria, delegações papais singulares ou familiares, concílios, ordens religiosas, mosteiros e confrarias, e outros. O complexo está dividido em dois recintos, que possuem a capacidade de receber a visita de, até 1.500 pessoas. Há também um aposento com os arquivos de índices, uma biblioteca, uma sala de restauração, um laboratório de fotografias digitais e outro de informática, além do espaço administrativo. Mas o que há de secreto em tudo isso? Em latim, Arquivos Secretos do Vaticano são Archivum Secretum Vaticanum. Nesse idioma, secretum tem o significado de segredo, mas também de secretário, ou seja, a pessoa de confiança de alguém. Assim, os Arquivos Secretos poderiam ser traduzidos como arquivos de confiança. Isso porque, quando alguma dúvida surge em assuntos relacionados à Igreja, é a eles que os padres recorrem para esclarecimentos.
Entretanto, há sim um cunho de segredo por detrás deles. Na verdade, nada do que possa sair das suas paredes blindadas é passível de ser tomado apenas como um simples documento. Os conspirólogos (ou seja, os adeptos das teorias de conspiração) gostam de insinuar que o local é não um simples depósito de dados dos governos papais, mas uma espécie de área proibida, que guarda detalhes que mudariam a história não apenas do cristianismo mas também da humanidade como a conhecemos. É o que de facto acontece é que apenas uma parte do que há ali é hoje de acesso público, e por alguns motivos. Primeiro, porque os papéis que ali existem são muito antigos e, a exemplo de museus, que não permitem flashes das máquinas fotográficas para não danificar as obras, também os Arquivos Secretos protegem o seu acervo, de valor incalculável, já que o simples acto de respirar próximo a um pergaminho antigo poderia levar à sua irreparável perda. E isso acontece mesmo hoje em dia, com a tecnologia de que dispomos. Em segundo lugar, nem tudo está autorizado a ser divulgado. A publicação dos índices dos documentos, por exemplo, em parte ou como um todo, é proibida, de acordo com os regulamentos actuais estabelecidos em 2005. E, em geral, somente depois de pelo menos 75 anos da sua publicação é que uma parte do acervo se torna acessível. Essa abertura começou no papado de Leão XIII (1810-1903). Desde 1881, o papa que está na direcção da Igreja Católica tem tomado a iniciativa de abrir o acesso a papéis de seus antecessores. A partir de 1924, uma quantidade maior de textos foi aberta ao público, incluindo aqueles do período que vai até ao fim do apostolado do papa Gregório XVI (1765-1846). O facto de existir esse lapso de tempo para que determinados documentos dessa vasta colecção possam ser consultados deixa as pessoas desconfiadas. Os arquivos ganharam a alcunha de secretos não apenas pelo seu acesso restrito para a maioria das pessoas mas também pelo seu conteúdo proibido. Isso porque muitos livros, documentos, epístolas, entre outros, traziam ideias de várias das correntes consideradas heréticas. Nos Arquivos do Vaticano é possível encontrar, além dos citados documentos, livros confiscados e classificados como perigosos. Entre eles, há até mesmo antigas edições da Bíblia e cópias dos chamados Evangelhos Apócrifos, além de dados sobre o código da Bíblia e as suas versões mais antigas, denominadas gematria e teomática.
Segundo dizem alguns especialistas, a parte sobre o terceiro segredo de Fátima, que era somente de conhecimento dos papas (e que teria feito um deles desmaiar ao saber do seu teor), só foi revelada por iniciativa de João Paulo II. E, mesmo assim, os conspirólogos afirmam que as verdades divulgadas são falsas e que as legítimas ainda estariam guardadas sob as sete chaves atribuídas a Pedro. Os arquivos foram instituídos numa época em que a Igreja Católica era praticamente soberana no mundo e se tornou depositária do conhecimento humano desde a época da Inquisição (maldita), em torno de 1184. Os livros considerados perigosos por ameaçarem os dogmas estabelecidos pela Igreja eram recolhidos e destruídos, mas não antes de terem um exemplar lá colocado para consultas futuras, por parte daqueles que se lançavam na defesa da pureza eclesiástica». In Sérgio P. Couto, Os Arquivos Secretos do Vaticano, Da Inquisição à renúncia de Bento XVI, Editora Gutenberg, 2013, ISBN 978-856-538-385-1.

Cortesia de EGutenberg/JDACT