Sobre
a data de canonização
«(…) A presença do arcebispo de Braga nas cerimónias fúnebres
realizadas em Coimbra leva-nos a admitir que possa ter aproveitado a mesma
deslocação para Miguel Salomão lhe prestar obediência como seu metropolita. A
referência à presença do bispo de Viseu, Odório (1147-1166) parece resolver a dúvida deixada no ar por J.
Encarnação quanto ao ano da canonização, que seria assim o de 1163, pois que em 1167 já seria bispo Gonçalo (1166?-1169).
Registe-se ainda a confusão relativamente ao nome do bispo do Porto, sendo de
admitir que a fonte se referia apenas a Pedro, e que Nicolau Santa Maria tenha
deduzido erroneamente o apelido, pois não poderia ser Pedro Rabaldes (1138-1145) mas sim Pedro Senior (1154-1174). Em consonância com
esta interpretação, Timóteo Mártires, outro cronista dos Cónegos de Santo
Agostinho, refere apenas Pedro ao falar da presença do bispo do Porto na
canonização, acrescentando, todavia, mais alguns pormenores. Trata-se da
indicação da presença na canonização de outras individualidades para além das
referidas. São elas, o bispo de Orense, Pedro Seguino (1157-1169), o prior-mor do Mosteiro de São Vicente, Godinho
e o mestre-escola da Sé de Lisboa, Álvaro, também eles discípulos e
companheiros no habito do mesmo padre Santo Theotonio. Sublinhe-se a
participação do prior do Mosteiro de São Vicente de Fora, evidenciando a sua
ligação a Santa Cruz, a reter para o estudo da influência da Vita Theotonii nos
documentos do Mosteiro de São Vicente quanto à idade de Afonso I. A nova Ordem
dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, difundiu-se rapidamente, e após a
conquista de Lisboa, em 1147, logo
se pensou na fundação de S. Vicente de Fora. A presença de cónegos de Santa
Cruz no Mosteiro de São Vicente foi muito significativa no final do século XII.
O primeiro prior foi Godinho Afonso, que saiu para bispo de Lamego no ano de 1173. Outro cónego, Payo, foi prior
castreiro, saindo depois para segundo bispo de Évora em 1180. Foi também prior castreiro Nicolau Annes Taveira, nomeado,
posteriormente, bispo de Viseu pelo rei Sancho I, em 1193. Relativamente à data de canonização, aceitamos, pois, a data
de 1163, embora as informações nas
quais se baseia esta data se conheçam apenas por via indirecta.
A data de produção do
manuscrito da Vita Theotonii
Procurando fazer o historial da datação atribuída ao
manuscrito, o Prof. José Geraldes Freire, apesar de nos dar conta que Joaquim
Encarnação pensava ser um original autêntico
e que Alexandre Herculano o considera também ao que parece, autógrafo, admitiu tratar-se de uma cópia dos finais
do século XV, com base na data de 1476
inscrita no fl. 45rb. Não parece contudo ter razão, pois, de acordo com o Catálogo
dos Códices da Livraria de Mão do Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, a
mesma encadernação (séculos XVI-XVII) contém manuscritos de diferentes épocas,
o que o terá induzido em erro. Para além da Vita Theotonii, atribuída aos séculos XII-XIII, inclui a Regra
de Santo Agostinho e as Lendas dos Mártires de Marrocos, que se
atribuem aos séculos XV e XVI, sendo que é no último que figura a data de 1476.
O
Prof. José Antunes considera que o texto original da Vita Theotonii deve ter sido escrito depois de 1175, possivelmente por Domingos
Salomão (as duas hipóteses não são compatíveis, dado que Domingos Salomão
faleceu a 12 de Julho de 1169; sabemos pela Vita Tellonis que Domingos
e, mais tarde, o seu irmão Pedro Salomão obtiveram em São Rufo de Avinhão
cópias dos textos necessários à vida da canónica; pela forma impessoal como o
autor da Vita Theotonii se refere ao envio de emissários a Avinhão, não
nos permite supor que seja um deles). A data de 1175 justifica-a atendendo a que no texto se refere que os monges
de Santa Cruz foram chamados para orientar o Mosteiro de S. Vicente de Fora, o
que considera só se ter verificado depois do seu sexto prior, isto é, por volta
dessa data. No entanto, o estudo da informação do texto da Vita Theotonii de
que o presbítero Honório foi enviado a Lisboa com dinheiro para a construção da
igreja de São Vicente, permite inferir que os contactos se iniciaram numa data
anterior aquela, pois, as obras teriam começado no ano de 1148, tendo como superintendente o referido cónego, que faleceu
neste mosteiro em 1161». In Abel Estefânio, A Data de
Nascimento de Afonso I, Medievalista,
nº 8, 2010, Instituto de Estudos Medievais, direcção de José Mattoso, ISSN 1646-740X.
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