segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Um Problema Religioso. Cátaros. Um Pretexto Político. Jesus Mestre Godes. «… no Languedoc da época havia um espíriro de tolerância, um sentimento muito claro da liberdade individual, um governo de tendência democrática nas cidades...»

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«O catarismo é um fenómeno histórico que pode ser observado segundo dois pontos de vista: para uns, é uma religião evangélica, para outros, trata-se de uma clara heresia…»

Lenguadoc. Século XIII. A originalidade Occitânica
«(…) Para conhecermos bem o que são os trovadores e a poesia trovadoresca, nada melhor que entregarmo-nos nas mãos do melhor estudioso, Martin de Riquer: os poetas que integram a lírica provençal dos séculos XII e XIII denominarn-se trovadores, e a sua actividade literária designa-se com o termo trovar, paralelo do latim invenire que significa encontrar (uma coisa) e criar literariamente; o nome de trovador estendeu-se aos autores de poesias cultas em língua corrente. O trovador compunha o texto poético, e também a música, e era, portanto, simultaneamente músico e poeta. O trovador era um profissional da literatura, quer dizer alguém que vivia da protecção e recompensa que recebia nas diferentes cortes de nobres, ou casas de burgueses que o acolhiam. Mas, junto a estes profissionais da trova, surgem os grandes senhores que cultivavam também a poesia lírica. A longa lista que, como sempre, é liderada por Guilherme Poitiers, está repleta de nomes ilustres: Ricardo, Coração de Leão, bisneto do duque de Aquitânia, uma vez que era filho da nossa conhecida Leonor de Aquitânia, neta de Guilherme; Raimbaut d’Auveng, conde de Orange, o mesmo Folquet de Marselha que começou como rrovador e acabou como arcebispo de Toulouse, para desgraça de Raimundo VI. A Catalunha é o país onde existem mais senhores-trovadores, a começar por Afonso, o Casto, outro rei, Pedro, o Grande, e nobres como Berenguer Palol, Guillelm Berguedà, Huguet Mataplana, exemplos de grandes e pequenos senhores apaixonados pela arte da trova.
Voltando aos profissionais, quando o trovador reunia certos méritos artísticos e ganhava prestígio, adquiria categoria social e ombreava com toda a classe de nobres de ascendência. Não se deve confundir o trovador com um outro profissional: o jogral. Aqui apenas nos interessam os trovadores, porque são uma manifestação original e única desta sociedade occitânica, que com a sua dedicação propiciou, além do mais, o nascimento de qualquer coisa muito especial, viva e também original: o amor cortês. O cavaleiro cortês e a dama cortês são exemplos de pessoas em que se concentram várias qualidades que a sociedade occitânica medieval considera indispensáveis e dignas de serem imitadas: nobreza, galhardia, generosidade, lealdade e elegância. Todos estes atributos se resumem numa palavra, a cortesia. E quando a cortesia se identifica com o amor, nasce o fin d’amor, quer dizer, o amor leal. Este fin d’amor é um jogo galante de tributo à beleza e à nobreza da dama. Criam-se, nesta sociedade meridional, conceitos novos de trato social, de conduta refinada, que são levados à prática e que foram tão originais, tão próprios, que desapareceram completamente com a derrota posterior à Cruzada. A exaltação cortês da dama permanecerá, apesar de tudo, para lá dos tempos e dos círculos literários, até ao ponto dos cistercienses chamarem à virgem Maria Notre Dame, numa excelsa versão do fin d’amor que se conservou até aos nossos dias.
Ainda que influenciada pelo mundo medieval, a canção trovadoresca supera-o, e com a ajuda que proporciona ao nascimento desta nova sociedade distancia-se desta esrritâ hierarquia feudal. Quando Afonso, o Casto, competia poeticamente com o trovador limusino Girault Bornelh, de linhagem humilde, abre uma fissura por onde entra uma nova convivência e antecipa o que pode haver de verdade na transformação desta sociedade occitânica, em que acreditam muitos estudiosos actuais: um certo conceito democrático. Fernand Niet comenta: … no Languedoc da época havia um espíriro de tolerância, um sentimento muito claro da liberdade individual, um governo de tendência democrática nas cidades...» In Jesus Mestre Godes, Els Cátars, Problema religiós, pretext politic, Cathari, Ediciones Península, 1995, ISBN 84-8507-710-8., Origens, Desenvolvimento, Perseguição, Extinção, Editora Pergaminho, 2001, Cascais, ISBN 972-711-297-8.

Cortesia de Pergaminho/JDACT