quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

A Primeira Rainha de Portugal. Dona Teresa. Marsilio Cassotti. «… as infantas Elvira e Teresa nunca apareceram nos documentos da chancelaria régia. A primeira menção a Jimena Muñiz, num documento indirectamente relacionado com o rei…»

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«(…) Um descendente de Afonso VI e Jimena, o rei Afonso IX de Leão, anteriormente casado com a infanta Teresa de Portugal, neta de Afonso Henriques, da qual se tinha tido de separar por ordem do papa por estar aparentado com ela, solicitou ao pontífice uma dispensa para continuar a viver com a sua segunda mulher, Berenguela de Castela, cujo casamento o pontífice tinha considerado incestuoso e ilegítimo. Afonso pediu-lhe que lhe concedesse essa excepção até ter sucessão, isto é, um filho varão. A resposta de Roma não se conhece, mas o fruto dessa união acabaria por herdar a coroa de Leão e Castela, e posteriormente por ser elevado aos altares pela Igreja Católica como Fernando, o Santo. Na verdade, um rei que detinha o poder de Afonso VI não necessitava de toda a anterior casuística para tentar ter um filho varão de uma mulher que não fosse a sua, uma vez que para ele era uma obrigação política, e nenhuma instância da época teria podido desautorizá-lo e muito menos impedi-lo.

A criação de uma futura Rainha (1085-1095)

Embora alguns historiadores situem o início da relação do rei com Jimena em épocas anteriores ou posteriores, o mais provável é que isso acontecesse pouco depois de 1085, quando, segundo a idade fixada pelos documentos borguinhões, Constança tinha já entrado nos quarenta e talvez numa prematura menopausa ou talvez tivesse sofrido uma doença que a tinha deixado estéril. Além do mais, os cinco anos que na altura tinham de casados parecem ser um período de espera suficiente para que o rei constatasse que ela não podia dar-lhe o herdeiro varão de que necessitava. Tudo isso podia supor uma espécie de alegação moral a favor do rei, perante a rainha e perante os membros da sua corte. Sobretudo num momento em que Afonso VI se encontrava politicamente autorizado, e muito fortalecido, para concretizar esse passo. O rei acabava de reconquistar a jóia da coroa visigoda, Toledo. Como essa grande vitória seria o ponto de partida para uma nova estratégia de reconquista, precisava de continuar a contar com o apoio dos seus súbditos mais poderosos, e para isso tinha de continuar a oferecer-lhes a segurança de que os benefícios em troca do apoio nobiliário teriam uma continuidade no tempo, o que então só era garantido através da descendência masculina do rei. Até em Cluny entenderiam a sua situação, desejosos de que o monarca prosseguisse com a reconquista. Afonso VI chegaria a aumentar até duas mil moedas de ouro o já importante donativo anual que o seu pai entregava a essa Ordem. Pelo que talvez tenha sido nessa altura que o rei se propôs procurar uma solução para o problema sucessório. Quando, segundo escreveu o melhor conhecedor da biografia de Afonso, as necessidades da dinastia tornaram imperativo que o rei tomasse uma amante.
Na corte devem ter compreendido a relação do rei com Jimena, pois isso tinha como finalidade resolver um dos problemas cruciais de todas as monarquias, a necessidade de um herdeiro varão, e dado que em 1085 o rei tinha ultrapassado os quarenta e cinco anos, idade então considerável, e que a situação do reino aconselhava a encarar a questão sucessória. É possível que também a rainha Constança mostrasse uma atitude favorável, dado o carácter político do seu matrimónio com o rei, contudo, enquanto ela viveu, as infantas Elvira e Teresa nunca apareceram nos documentos da chancelaria régia. A primeira menção a Jimena Muñiz, num documento indirectamente relacionado com o rei, produzir-se-ia quando a rainha estava próxima da morte. Cinquenta anos depois do nascimento daquelas infantas, o cronista oficial de um neto de Afonso VI diria que Jirnena tinha sido mui amada pelo rei. O facto de uma vez nascida a primeira filha mulher, Elvira, Afonso continuar a ter relações com a mãe, tendo em conta as suas necessidades dinásticas, dá mais veracidade a essa afirmação». In Marsilio Cassotti, D. Teresa, A Primeira Rainha de Portugal, Prefácio de G. Oliveira Martins, Attilio Locatelli, A Esfera dos Livros, 2008, ISBN 978-989-626-119-1.

Cortesia da EdosLivros/JDACT