quarta-feira, 23 de maio de 2012

Poesia. Figuras e Costumes do Alentejo. Francisco Bugalho. «E a leiva sobe na aiveca e vai ficando tombada, ao seu feitio moldada, sobre outra leiva já seca»



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Ganhão
 Minha junta vai puxando
morosa, lenta, cansada;
que a leiva que vai virando,
vai ficando bem virada.

Passam dois corvos grasnando.
E à minha volta mais nada…

A relha que rasga a terra
rasga e beija docemente.
Breve se acaba esta guerra
só de sonhar a semente.

Nos vales de terra molhada
piam abibes em bando.

E a leiva sobe na aiveca
e vai ficando tombada,
ao seu feitio moldada,
sobre outra leiva já seca.

Minha junta vai puxando
pesada, lenta, cansada …

Ao fundo, no horizonte
só um sobreiro pasmado;
nem um ruído de fonte,
nem um chocalho de gado.

Nem algum cantar perdido
de certas horas felizes.
Só canta no meu ouvido
este estalar das raízes.

A leiva que vou virando
vai ficando bem virada …

Poema de Francisco Bugalho, in ‘Figuras e Costumes do Alentejo’

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