quarta-feira, 6 de novembro de 2013

O Exílio, os Açores e o Cerco do Porto. Luís Sousa Coutinho nas Guerras Liberais. António Ventura. «Se exceptuarmos Miguel, sobre quem existe uma abundante bibliografia alimentada por um certo culto que se prolongou até ao presente século, são raros os estudos sobre os seus apoiantes mais destacados»

Cortesia de ricardomoita e jdact

(...) eu preferi abandonar pátria, família, empregos e bens; eu perdi bastante, mas não perdi tudo, porque, bem pouco perde quem conserva a honra.

«A primeira metade do século XIX foi um dos períodos mais agitados e turbulentos da nossa História, em que as intervenções estrangeiras e os confrontos ideológicos assumiram, por vezes, a forma de guerra efectiva. A implantação do liberalismo em Portugal revelou-se um processo conturbado e doloroso, gerador de cisões profundas na sociedade portuguesa que tiveram como momento decisivo e mais traumático a Guerra Civil que decorreu, de modo intermitente, desde 1822 e, de forma continuada, de 1832 a 1834. De um lado e de outro distinguiram-se figuras notáveis, coerentes e abnegadas que tudo sacrificaram em prol dos seus ideais e do modelo de sociedade que tinham como mais conveniente para o seu país. Naturalmente que a História é escrita pelos vencedores, cabendo aos vencidos um papel secundário de palhaço pobre, são outro que corporiza todos os vícios e todos os males e que, por isso mesmo, merece antecipadamente a derrota. Visão simplista esta que justifica a vitória de uns pela posse exclusiva da razão quando, afinal, existem várias razões, e o seu triunfo não se explica, necessariamente, pela justeza dos postulados.
Quando estudamos as Guerras Liberais, imediatamente emergem uns quantos nomes de protagonistas de primeiro plano no campo liberal, sobre os quais existe uma abundante bibliografia, Palmela, Sá da Bandeira, Terceira, Saldanha... - Ficando muitos outros na penumbra do desconhecimento. O mesmo já não sucede com o campo miguelista e com as suas figuras cimeiras. Se exceptuarmos Miguel, sobre quem existe uma abundante bibliografia alimentada por um certo culto que se prolongou até ao presente século, são raros os estudos sobre os seus apoiantes mais destacados. O caso do visconde de Santarém é uma excepção, centrando-se o interesse dos autores mais na sua obra como historiador. Outros destacados miguelistas foram estudados mais na vertente de teóricos da contra-revolução. Faltam estudos sobre os estadistas, os militares e os eclesiásticos miguelistas, excepção para José Agostinho Macedos e frei Fortunato de São Boaventura, tanto até 1834 como no período subsequente à derrota em que sobressai o incansável labor de António Ribeiro Saraiva. Centenas e centenas de liberais de todas as tendências partilharam as agruras do exílio e a glória da vitória, depois de tanto sofrimento, apenas constando de notas marginais nas obras clássicas sobre aquela época. O exílio liberal foi terrível, como todos os exílios políticos, agravado pela hostilidade de alguns governos europeus que toleravam de má vontade a presença desses portugueses expatriados, e, ainda mais, pelas divisões que lavraram entre eles, justificadas umas por razões do foro ideológico e outras por ódios e rivalidades pessoais. A maior parte da enorme produção literária dada à estampa na emigração está relacionada com disputas e querelas fratricidas...
Vitorino Nemésio escreveu uma obra notável sobre a vida dos emigrados liberais e do seu longo calvário até ao triunfo final; nessas páginas surgem, aqui e ali, nomes de personagens de segundo plano que carecem de um estudo mais aprofundado. Um deles é o 3.º conde de Alva, depois 1.º marquês de Santa Iria, um aristocrata e militar distinto, considerado e relacionado com algumas das melhores famílias do reino e que nos propomos estudar.. Ao mesmo tempo, publicamos um interessante conjunto de cartas suas escritas durante o exílio e a guerra civil, dirigidas a sua cunhada, D. Teresa Sousa Holstein, condessa de Vila Real, que são documentos pungentes onde se reflecte o drama pessoal do expatriado, profundamente marcado por dramas familiares, mas também o evoluir do conflito. Cremos que será mais um contributo valioso para a História de Guerra Civil e do exílio liberal.

O 3.º conde de Alva e 1º marquês de Santa Iria
A morte sem descendência dos primeiros condes de Alva, João Sousa Ataíde e D. Constança Luísa Monteiro Paim, 3.ª Senhora do morgado de Alva, fez com que o título passasse para a irmã da condessa, D. Maria Antónia de S. Boaventura Meneses Paim, a qual casou com Rodrigo Sousa Coutinho, filho segundo dos 11.os condes de Redondo. Deste consórcio nasceram sete filhos, mas só dois com descendência: Francisco Inocêncio Sousa Coutinho Meneses Monteiro Paim, progenitor dos condes de Linhares e dos marqueses do Funchal, e seu irmão gémeo, Vicente Roque José Sousa Monteiro Paim, senhor do morgado de Alva, capitão do regimento de Dragões de Chaves e diplomata nas cortes de Paris e Turin. Este último casou duas vezes. A primeira com D. Teresa Vital Câmara Coutinho, filha dos 9.os senhores das Ilhas Desertas, de quem teve uma filha, D. Isabel Juliana Bazeliza José Sousa Coutinho Paim, mãe do duque de Palmela». In António Ventura, O Exílio, os Açores e o Cerco do Porto, D. Luís Sousa Coutinho, primeiro marquês de Sta Iria, nas Guerras Liberais, Edições Colibri, Lisboa, 2000, ISBN 972-772-138-9.

Cortesia Colibri/JDACT