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de wikipedia e jdact
Com
a devida vénia a Vanda Lisa Lourenço Menino
«(…) Para além dos nobiliários
medievais e da hagiografia, as crónicas ocupam um lugar de destaque. No século
XIV, a crónica régia surge como uma narração de acontecimentos, através de um texto
lógico e temporal, normalmente cingido a uma unidade de tempo político, ou
seja, os seus limites são um reinado. A crónica régia aparece, assim, como um
género historiográfico oficial. Em todo o caso, gostaríamos de assinalar que
nenhuma das crónicas compulsadas oferece um capítulo independente dedicado à
rainha dona Beatriz. Todos os textos de narração histórica que se debruçam
sobre a centúria de Trezentos são, geralmente, tardios. A excepção é a Crónica Geral de Espanha de 1344,
redigida, também ela, por Pedro Afonso, conde de Barcelos, bastardo do rei Dinis
I e irmão de Afonso IV. Posterior à redacção do Livro de Linhagens, a Crónica Geral de 1344 constituiu um novo empreendimento
literário de Pedro Afonso. Neste caso, o conde surge também como um narrador
que dá testemunho de alguns factos e acontecimentos dos quais é contemporâneo
e, por vezes, espectador de muitos deles ou até mesmo interveniente activo em
variadas situações. Podemos afirmar que escrevia, muitas vezes, como testemunha
directa, sendo as suas lembranças a base de toda a narrativa.
Infelizmente, as informações
relativas à rainha dona Beatriz são muito escassas. No essencial, referem-se,
numa perspectiva de troca de mulheres, ao casamento dos dois filhos legítimos
de Dinis I, Afonso e Constança, com dois dos filhos legítimos de Sancho IV de
Castela, Beatriz e Fernando, respectivamente:
e, despois que hi forom ajutado,
casou el rey dom Fernando de Castella com a iffante dona Costança e levoua
cõsigo. E el rey dom Denis trouxe cõsigo a iffante dona Beatriz, irmãa del rey dom
Fernando, que era filha del rey dom Sancho e da reynha dona Marya, sua molher,
por esposa do iffante dom Affonso, seu filho primeyro.
A Crónica de Portugal de 1419 é de autor desconhecido, mas,
devido a informação textual, sabemos que começou a ser redigida em 1 de Julho
de 1419, por iniciativa do infante Duarte, filho de João I, ou seja, foi
iniciada seis décadas após a morte de dona Beatriz. Alguns autores defendem que
o infante teria entregue esta missão ao seu escrivão dos livros, Fernão Lopes,
que, na altura, acumulava este cargo com o de guarda-mor dos arquivos do reino,
a Torre do Tombo. Não nos debruçaremos sobre a polémica autoria desta crónica
porque é um assunto que ultrapassa os objectivos deste nosso trabalho. Esta
narrativa pretendia ser uma história geral de Portugal que inicia o seu relato
com o conde Henrique, pai de Afonso Henriques, e termina com Afonso IV. A
presença de dona Beatriz nesta crónica é, também, escassa, dispersa e
circunstancial. Vamos encontrar mais informação sobre esta infanta na parte
relativa ao governo de Dinis I, do que propriamente durante o reinado do seu
marido.
Naquele, a infanta surge como uma
mulher que o marido procurava proteger da guerra que iria travar contra Dinis I
e, por isso, a colocou em Alcanices, onde a deixou ao cuidado de Fernão Martins
Fonseca juntamente com escudeiros da sua confiança, antes de iniciar o confronto
armado contra seu pai:
partio se daly ho iffante pêra
Coinbra e levou dahy a molher e os filhos pêra hum lugar que chamom Alcanizes,
que he em Castela, que tinha Fernão Martinz Fonsequa, e leixou a hy com alguns
escudeiros e tornou se pêra Coinbra.
Uma parte muito significativa do reinado
de Afonso IV seria ainda narrada, já no século XVI, por Rui Pina, na Crónica dos Sete Primeiros Reis de Portugal.
Nomeado pelo rei Manuel I cronista-mor do reino e guarda-mor da Torre do Tombo,
Rui Pina vai exaltar os feitos dos monarcas, cujo relato se inicia com Afonso
Henriques e culmina com o governo de Afonso IV. Em relação à história dos reis
da primeira dinastia, Rui Pina teria utilizado os manuscritos anteriores, os
quais retocou e aperfeiçoou segundo o seu próprio estilo. Para este cronista o
rei é a figura dominante, sendo secundário tudo quanto não esteja ligado ao
monarca. Aqui, dona Beatriz aparece como irmã do rei Fernando IV de Castela,
como mulher de Afonso IV, como rainha de Portugal e como mãe. É, pois, sempre
nestas quatro perspectivas de irmã, de mulher, de rainha e de mãe, que vai
sendo mencionada ao longo da Crónica». In Vanda Lisa L. Menino, A Rainha
D. Beatriz e a sua Casa (1293-1359), Tese de Doutoramento em História,
Universidade Nova de Lisboa, FCSHumanas, 2012, Wikipedia.
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