quinta-feira, 28 de novembro de 2019

Lucrécia Borgia. Jean Plaidy. «Pedro Luís tivera de abandonar as suas belas propriedades com toda a sua riqueza e fugir para não morrer. Morrera pouco depois. Rodrigo continuara calmo e digno, e não saíra de Roma»

Cortesia de wikipedia e jdact

O nascimento de Lucrécia
«(…) Aquilo foi o começo da sorte. O tio Alfonso Bórgia (papa Calisto III para o mundo) era espanhol e nascera perto de Valência. Fora para a Itália com o rei Alfonso de Aragão quando este monarca subira ao trono de Nápoles. A Espanha, potência muitíssimo ambiciosa que rapidamente estava dominando o mundo, ansiava por ver a influência espanhola por toda a Itália, e qual a melhor maneira de conseguir isso do que com a eleição de um papa espanhol? O tio Alfonso tinha o apoio da Espanha quando aspirara ao papado, e saiu vitorioso no ano de 1455. Todos os Bórgia estavam conscientes de um sentimento de família. Eram espanhóis, e os espanhóis não eram bem-vindos na Itália; portanto, era necessário que todos os espanhóis se unissem enquanto faziam o possível para conquistar os cargos mais importantes. Calisto tinha planos para os dois sobrinhos. Prontamente, nomeou Pedro Luís generalíssimo da Igreja e prefeito da cidade. Não satisfeito com isso, fê-lo duque de Spoleto e, a fim de que a sua renda aumentasse ainda mais, fez dele vigário de Terracina e Benevento. Pedro Luís estava muito confortavelmente instalado na vida; era não só um dos homens mais influentes de Roma, o que seria mesmo, devido ao seu parentesco com o papa, como o mais rico.
As honrarias que couberam a Rodrigo eram quase do mesmo nível. Um ano mais moço do que Pedro Luís, fora feito cardeal, embora só tivesse vinte e seis anos; mais tarde, foi acrescentado a isso o cargo de vice-chanceler da Igreja de Roma. Na verdade, os Lanzol não precisavam lamentar a adopção dos seus filhos pelo papa. Ficou claro, desde o início, que Calisto pretendia que Rodrigo o sucedesse no papado; e Rodrigo tomara a decisão, desde o momento de sua adopção, de que um dia iria sucedê-lo. Infelizmente, isso fora há muito tempo, e o papado estava longe como sempre estivera. Calisto era um homem velho quando fora eleito, e morreu três anos depois. Agora se percebia a sabedoria da sua acção rápida em conceder altos cargos aos sobrinhos, porque mesmo enquanto Calisto estava no seu leito de morte houvera um clamor contra os espanhóis que tinham recebido os melhores cargos; e os Colonna e os Orsini, as poderosas famílias que se tinham sentido menosprezadas, ergueram-se em fúria contra os estrangeiros; Pedro Luís tivera de abandonar as suas belas propriedades com toda a sua riqueza e fugir para não morrer. Morrera pouco depois.
Rodrigo continuara calmo e digno, e não saíra de Roma. Em vez disso, enquanto a cidade se agitava contra ele e os seus parentes, foi solenemente à catedral de São Pedro, a fim de que pudesse rezar pelo tio moribundo. Rodrigo possuía um grande charme. Não que fosse muito bonito; seus traços eram pesados demais para serem belos, mas a sua dignidade e sua presença eram impressionantes; o mesmo acontecia com a graça cortesã que raramente deixava de provocar a devoção de quase todos aqueles que entravam em contacto com ele. Por estranho que parecesse, as pessoas que implicavam contra ele afastavam-se para deixá-lo passar a caminho de São Pedro, enquanto ele sorria benignamente para elas e murmurava, delicado: Deus os abençoe, meus filhos. E elas se ajoelhavam e beijavam-lhe a mão e a barra da túnica.
Teria sido aquela uma das horas mais triunfantes de sua vida? Depois disso, houve triunfos; mas talvez naquela ocasião ele tenha-se conscientizado pela primeira vez daquele grande poder que tinha de cativar e dominar com o seu charme todos os que se opunham a ele. Por isso, rezara pelo tio e ficara com ele, ao lado de sua cama, enquanto todos os demais tinham fugido; e, embora o seu grandioso palácio tivesse sido saqueado, ele continuara indiferente e calmo, pronto para dar o voto decisório no Conclave que viria a seguir e que assegurara a Aeneas Sylvius Piccolomini a eleição para, como Pio II, suceder a Calisto. Pio devia ser grato a Rodrigo, e era mesmo. Assim, Rodrigo enfrentara com sucesso a primeira tempestade da sua vida e garantira a si mesmo que tinha capacidade para agir por conta própria, o que o pobre do Pedro Luís não conseguira fazer. Rodrigo recolheu os bens valiosos do irmão, lamentou amargamente a sua morte, mas apenas por um curto intervalo de tempo, pois não era de sua natureza chorar uma perda por muito tempo, e viu-se poderoso como sempre, e com a mesma esperança de aspirar ao trono papal». In Jean Plaidy, Lucrécia Borgia, Edição Record, 1996, ISBN 978-850-104-410-5.

Cortesia de ERecord/JDACT