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O
nascimento de Lucrécia
«(…) Portanto, agora rezava aos santos e à Virgem para que a
criança que estava para ter tivesse charme e beleza (porque Rodrigo, possuindo
tanto o primeiro, era muito susceptível à segunda) e que se ela, uma matrona de trinta e oito anos, não
conseguisse provocar o desejo sexual dele, pudesse continuar a desfrutar da sua
gratidão pelos filhos que lhe dera. Por quanto tempo os filhos seriam mantidos
sob o seu tecto? Não muito, imaginava ela. Eles iriam partir, como Pedro Luís
partira. Rodrigo tinha belos planos para os meninos; e Vannozza, por mais
adorada pelo cardeal que fosse, tinha uma posição social inferior em Roma. Mas
ele iria lembrar-se de que uma parte dela vivia naqueles filhos e ela
continuaria na sua encantadora casa, a casa que ele lhe dera. Era o tipo de
casa que os nobres de Roma tinham, e Vannozza encantava-se com ela. Gostava de
ficar sentada na sala, cujas paredes caiadas, ela decorara com tapeçarias e alguns
quadros; porque quisera fazer a sua casa tão luxuosa quanto as das grandes
famílias, os Orsini e os Colonna. O seu amante era generoso e lhe dera muitos
presentes; além das suas tapeçarias e quadros, ela possuía jóias, uma bela
mobília, ornamentos de pórfiro e mármore, e, o mais adorado de todos, sua credenza,
aquela enorme cómoda onde guardava sua majólica e suas taças e copos de ouro e
prata. A credenza era um sinal de posição social, e os olhos de Vannozza
brilhavam toda vez que ela olhava para a sua. Ela andava pela bela casa,
tocando os seus belos bens e dizendo para si mesma, na calma frieza de que
desfrutava por trás das grossas paredes, que tinha sido realmente uma mulher de
sorte quando Rodrigo Bórgia entrara na sua vida e a achara atraente. Vannozza
não era boba, e sabia que as preciosidades que Rodrigo lhe dera eram, segundo
ele, nada em comparação com as que ela dera a ele. Agora a dor a estava
apertando outra vez, mais insistente, quase que continuadamente. A criança
estava ansiosa por nascer.
Numa
outra ala do seu castelo de Subiaco, o grande cardeal também aguardava. Seus
aposentos ficavam longe dos da sua amante, porque ele não queria ficar triste
com o som dos gritos dela; não queria pensar no sofrimento de Vannozza; queria
pensar nela como ela sempre se esforçara muito para ser na sua presença, bela,
despreocupada e cheia de vitalidade, tal como ele também. No parto, Vannozza
poderia não ficar assim, e ele preferia lembrar-se dela daquela maneira, já que
era um homem que odiava ficar contrafeito; e Vannozza sofrendo iria fazer com
que ficasse. Portanto, era melhor isolar-se dela, esperar com paciência até que
recebesse a mensagem de que a criança
tinha nascido.
Afastara-se
do santuário diante do qual estivera ajoelhado. A lâmpada que ardia
constantemente diante das imagens e retratos dos santos tinha iluminado o rosto
sereno da Madona, e ele imaginara ter visto ali uma expressão de recriminação.
Será que ele, um dos mais poderosos cardeais, devia estar rezando pelo
nascimento seguro de um filho que ele não tinha o direito de ter gerado?
Poderia ele esperar que a Madona lhe desse um filho, um menino bonito e
saudável, quando, como filho da Igreja, jurara o celibato? Era um pensamento
incómodo, e, como Rodrigo sempre se afastava depressa desse tipo de pensamento,
ele permitiu-se esquecer o santuário e olhou, em vez disso, para o emblema do
touro pastando que adornava as paredes e que nunca deixava de inspirá-lo. Era o
emblema dos Bórgia e um dia, assim decidira Rodrigo, seria o símbolo mais
temido e respeitado da Itália. Ah, sim, era reconfortante contemplar o touro,
aquela criatura forte, pastando em paz e, no entanto, indicando tanta coisa que
era violenta e forte. Um dia, pensava o cardeal, o brasão dos Bórgia iria ser
exibido por toda a Itália, porque o sonho de Rodrigo era que um dia a Itália
inteira viesse a ser unida, e unida sob o governo
de um Bórgia. Um outro papa Bórgia! Por que não? O Vaticano era o centro do
mundo católico; era evidente que o Vaticano deveria unir um país dividido,
porque na unidade estava a força, e quem mais indicado para governar uma Itália
unida do que o papa? Mas ele ainda não era papa, e tinha os seus inimigos, que
iriam fazer todo o possível para impedir que ele chegasse àquela alta
eminência. Pouco importava. Ele realizaria a sua ambição, assim como seu tio
Alfonso realizara a dele quando se tornara o papa Calisto III.
Calisto
tinha sido inteligente; soubera que a força de uma família estava nos seus
membros jovens. Era por isso que Calisto adoptara Rodrigo e seu irmão Pedro
Luís (em homenagem a ele Rodrigo baptizara o filho mais velho de fonnozza), era
por isso que os tornara ricos e fizera deles homens poderosos no país». In Jean
Plaidy, Lucrécia Borgia, Edição Record, 1996, ISBN
978-850-104-410-5.
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