Teresa
Henriques. Poderosa condessa da Flandres
«(…) Terminada essa guerra, ou,
antes, mesmo durante o seu período, a Cristandade reuniu-se para a chamada terceira
cruzada. Três famosos chefes do Ocidente, o rei da França, Filipe Augusto;
o imperador da Alemanha, Frederico Barbarroxa; e Ricardo Coração de Leão, da
Inglaterra, esquecendo dissídios que os dividiriam, coligaram-se com o auxílio
de outros Estados para defesa da Cruz. Saladino, o valente sultão do Egipto,
conquistara o reino de Jerusalém. O último rei da Terra Santa, Guy de Lusignan,
caiu prisioneiro na famosa batalha de Tiberíades. Nada menos de vinte mil
cristãos ali tombaram para sempre. Urgia repor o anterior estado de coisas.
Filipe de Alsácia, conde da Flandres, era soberano demasiado categorizado para que
não participasse da cruzada, chefiando as suas valorosas hostes. Ia estar ausente
a servir uma causa sagrada. Não sabia por quanto tempo. Os seus Estados, porém,
precisavam, durante esse período, de ter alguém à sua frente a governá-1os. Não
hesitou. Depositava a maior confiança no bom senso e na visão administrativa da
esposa. Entregou-lhe a regência do condado-ducado durante a sua ausência. Nunca
mais se viram com vida desde a partida dele. Desgraçadamente, na batalha de S.
João de Acre, após apertado cerco, no fim do qual essa fortaleza for tomada
finalmente, o marido de dona Teresa caiu como um bravo que era. Deixou de si
boa memória, não só pelo seu valor guerreiro como pela sua soberania na
Flandres. Dona Teresa, infanta de Portugal e condessa da Flandres, ficava viúva
ainda nova, sem dúvida, e mais rica do que chegara. Por morte do esposo
recebeu, como dote e em satisfação do contrato de casamento, além de Lille e de
Fournes, em Bourbony, algumas outras terras de pingues rendimentos.
Além do mais, e à parte a sua
notável beleza, tinha fama de muito sensata e ponderada. Não lhe faltariam
candidatos à sua mão. Na realidade, não demorou muito tempo no estado de viúva,
o que a credita como um bom partido matrimonial. Sem embargo do profundo afecto
que devotara ao falecido Filipe, tornou a casar em 1194, desta vez com Eudo,
3.º duque de Borgonha. Esta filha de Afonso Henriques parece não ter sido bem
fadada para destino venturoso, pois também desta feita não logrou a felicidade.
De facto, ainda mal havia gozado a sua segunda lua-de-mel quando o papa
Celestino III, alegando o próximo parentesco entre os cônjuges, determinou a
sua separação. Não havia decorrido um ano sobre a celebração deste seu
consórcio.
Voltou a princesa portuguesa aos
seus domínios recebidos do primeiro marido, aí vivendo como flor a estiolar-se,
a perder viço, formosura e perfume, sem que os anais se ocupem dela durante
esse período. Na verdade, e que o saibamos, só nova referência lhe é feita por
ocasião da sua trágica morte, em 1218. Viajava de coche, acompanhada de duas
damas de honor, pelas margens de uma lagoa, perto de Fournes, quando ocorreu
inesperadamente o dramático acidente. Por qualquer motivo, a carruagem caiu à
água, arrastando-a para o fundo. Horrorizadas, as pessoas que presenciaram o
sinistro tentaram imediatamente socorrê-la. Inutilmente, porém. Ao fim de
muitos esforços lograram retirá-la das águas, mas já cadáver. Conduziram o
corpo da infortunada infanta-condessa para a próxima abadia de Chairval,
por entre prantos e ais. Não deixou sucessores esta linda princesa portuguesa,
que foi a segunda, cronologicamente, a cingir uma coroa, a qual, por ser
condal, nem por isso deixava de ser soberana e muito poderosa, com alguma influência
na política europeia da época». In Américo Faria, Princesas Portuguesas
Rainhas no Estrangeiro, 1963, Edições Parsifal, 2013, ISBN 978-989-983-331-9.
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