Mar
I
«De todos os cantos do mundo
amo com um amor mais forte e mais
profundo
aquela praia extasiada e nua.
Onde me uni ao mar, ao vento e à lua.
II
Cheiro a terra as árvores e o vento
que a Primavera enche de perfumes
mas neles só quero e só procuro
a selvagem exalação das ondas
subindo
para os astros como um grito puro».
O jardim e a noite
«Atravessei o jardim solitário e sem
lua,
correndo ao vento pelos caminhos fora,
para tentar como outrora
unir a minha alma à tua,
ó grande noite solitária e sonhadora.
Entre os canteiros cercados de buxo,
sorri à sombra tremendo de medo.
De joelhos na terra abri o repuxo,
e os meus gestos foram gestos de bruxedo.
Foram os gestos dessa encantação,
que devia acordar do seu inquieto
sono
a terra negra dos canteiros
e os meus sonhos sepultados
vivos e inteiros.
Mas sob o peso dos narcisos floridos
calou-se a terra,
e sob o peso dos frutos ressequidos
do presente,
calaram-se os meus sonhos
perdidos.
Entre os canteiros cercados de
buxo,
enquanto subia e caía a água do repuxo,
murmurei as palavras em que outrora
para mim sempre existia
o gesto
dum impulso.
Palavras que eu despi da sua literatura,
para lhes dar a sua forma primitiva
e pura,
de formulas de magia.
Docemente a sonhar entre a folhagem
a noite solitária e pura
continuou distante e inatingível
sem me deixar penetrar no seu
segredo.
E eu senti quebrar-se, cair desfeita,
a minha ânsia carregada de
impossível,
contra a sua harmonia perfeita.
Tomei nas minhas mãos a sombra escura
e embalei o silêncio nos meus
ombros.
Tudo em minha volta estava vivo
mas nada pôde acordar dos seus escombros
o meu grande êxtase perdido.
Só o vento passou pesado e quente
e à sua volta todo o jardim cantou
e a água do tanque tremendo
se maravilhou
em
círculos, longamente».
Poemas de Sophia Breyner Andresen, in ‘Cem Poemas de Sophia’
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